Bolsonaro e seus aliados lotaram a Avenida Paulista em 25 de fevereiro.| Foto: Sebastião Moreira/EPA/EFE
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A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de intimar o bilionário sul-africano Elon Musk a nomear, em 24 horas, um novo representante legal no Brasil para o X (antigo Twitter), sob a ameaça de suspender as atividades da rede social no país, deve intensificar a campanha nacional pelo impeachment do magistrado. A medida anunciada na noite desta quarta-feira (28) provocou reforço imediato à convocação de políticos de direita e de movimentos sociais conservadores para o ato na Avenida Paulista, em São Paulo, na tarde de 7 de setembro.

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Com a presença de parlamentares, de candidatos a prefeito de São Paulo e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a manifestação organizada pelo pastor Silas Malafaia será dedicada à denúncia de abusos inconstitucionais cometidos por Moraes e à defesa de sua destituição. A eventual derrubada do X no Brasil é vista pelos organizadores como a prova definitiva de que o país já não é mais uma democracia, se juntando à lista de países onde a rede foi banida, como Irã, Coreia do Norte e, recentemente, Venezuela.

“Todos na Paulista no Sete de Setembro” foi o mote das postagens de líderes conservadores, que visam mobilizar uma multidão comparável ou superior à registrada em 25 de fevereiro último, quando dezenas de milhares de manifestantes se reuniram no mesmo local. Em vídeo divulgado nas redes sociais nesta quarta-feira (28), Bolsonaro convocou a sociedade a participar do ato, enfatizando a necessidade de sensibilizar tanto o público interno quanto a opinião pública internacional para o cerceamento de direitos. A decisão de Moraes foi noticiada pela imprensa ocidental por servir como um "teste" para Elon Musk de como ele vai reagir a eventuais ataques de censura contra o X.

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Bolsonaro destacou que “de nada adianta comemorar a independência se não temos liberdade” e afirmou que o protesto é uma defesa da democracia frente aos riscos atuais, além de um apelo pela anistia de presos políticos, em referência aos condenados nos inquéritos acerca dos protestos do 8 de Janeiro, presidido por Moraes. Apesar disso, o ex-presidente não mencionou o nome do ministro do STF em sua convocação.

O pastor Silas Malafaia, organizador do ato, promete fazer um discurso duro e pedir não só o afastamento mas a prisão de Alexandre de Moraes.

Palanque terá Marçal e Nunes, rivais na disputa pela prefeitura de São Paulo

Na mensagem de nova convocação para o ato, o ex-presidente sinalizou abertura para que até o candidato à Prefeitura da capital paulista Pablo Marçal (PRTB) participasse, ressalvando que não poderia haver discursos por se tratar de um “evento patriótico para o resgate da nossa democracia” e de um “movimento suprapartidário”, incluindo a presença de outros candidatos, como o próprio prefeito Ricardo Nunes (MDB), a quem apoia formalmente. O candidato à reeleição solicitou estar presente.  

“Como um candidato a prefeito da capital queria comparecer, nós autorizamos. Assim como qualquer outro candidato a prefeito da capital está autorizado a subir no carro de som também”, justificou Bolsonaro. Na semana passada, ele trocou farpas com Pablo Marçal nas redes sociais e chegou a afirmar que “falta caráter” ao candidato do PRTB. Mas o vídeo do ex-presidente e a reconciliação de Marçal com o vereador Carlos Bolsonaro após recente briga pública indicam uma recomposição da direita.

Intimação judicial do X por meio da própria rede social é apontada por parlamentar como surreal

A intimação de Moraes ordena que Musk seja intimado por meio eletrônicos para que indique o representante legal de sua empresa “sob pena de imediata suspensão das atividades da rede social X até que as ordens judiciais sejam efetivamente cumpridas e as multas diárias quitadas”. Para o deputado Gustavo Gayer (PL-GO), um dos oradores esperados para o ato, juntamente com seu colega de bancada Nicolas Ferreira (PL-MG), “o caso de Moraes já não é mais uma questão de impeachment, mas de manicômio”, ao intimar o dono do X por postagem na própria plataforma.

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Em uma reunião realizada em Goiânia, ao lado do ex-procurador da Lava Jato e ex-deputado Deltan Dallagnol (Novo), Gayer destacou novas ilegalidades associadas à ameaça contra o X, que já vinha sofrendo pressões por meio de multas e advertências de prisões iminentes de funcionários. “Não é preciso mais nada para o cidadão comum entender que o Brasil já não é mais uma democracia. Moraes quer realizar algo surreal, planejando derrubar uma das redes sociais mais importantes do mundo, onde se dá grande parte do debate político no país, seguindo os passos do ditador venezuelano Nicolás Maduro, que tomou medida semelhante dias antes”.

Dallagnol afirmou que a intimação sem as formalidades exigidas já é, por si só, um absurdo. “O banimento do X no Brasil nos colocará no seleto clube das ditaduras que baniram a rede”, completou.

Diante desse cenário, Gayer ressaltou a importância de convocar parlamentares a assinarem o pedido de impeachment elaborado pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) e de incentivar a assinatura por cidadãos da petição pública online que também solicita o afastamento de Moraes. “Não podemos mais temer o ditador, pois essa questão ultrapassou há muito a divisão entre esquerda e direita, ameaçando a todos”, concluiu.

Deputada vê Nelson Jobim, ex-STF, coagido a recuar de fala contra Moraes

A deputada Bia Kicis (PL-DF), líder da minoria na Câmara, considerou “extremamente preocupante” a ameaça de Moraes a Elon Musk de retirar o X (antigo Twitter) do ar, classificando a situação como mais um episódio absurdo da democracia relativa”. Em discurso na tribuna, ela destacou que essa medida coloca o Brasil ao lado de ditaduras que bloquearam o funcionamento do X em seus territórios, como Cuba e China. “Não queremos fazer parte desse grupo”, protestou.

A parlamentar também condenou outras ações paralelas do ministro, como a suspensão de redes sociais de investigados em seus inquéritos, que são abertos de ofício e sem previsão de conclusão. Segundo Bia Kicis, os parlamentares têm o dever de utilizar sua imunidade para expressar indignação e inconformismo diante da perseguição judicial. “Não podemos nos calar quando a população cobra do Congresso uma reação contra a tirania e a favor da liberdade, enquanto 11 ministros do STF continuam a legislar. Nem a esquerda está mais a salvo”, declarou.

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Para reforçar sua preocupação, a deputada afirmou que o ex-presidente do STF, Nelson Jobim, foi coagido a se retratar publicamente em nota após fazer "sérias e corretas" críticas à postura abusiva de Moraes, durante entrevista à CNN Brasil.

Ameaça ao X se soma a retaliações de Moraes após vazamentos de mensagens

A decisão de Alexandre de Moraes de ameaçar a operação de uma das maiores plataformas digitais do mundo ocorreu na mesma semana em que o ministro intensificou as suas ações para combater as revelações da Folha de São Paulo sobre irregularidades em inquéritos do STF a partir de mensagens vazadas. Suas atitudes seguem sendo respaldadas pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso.

Entre as retaliações de Moraes está a derrubada das redes sociais e a apreensão do passaporte da advogada Paola Silva, esposa do ex-deputado Daniel Silveira, condenado a nove anos de prisão pela divulgação de um vídeo na internet. A decisão foi anunciada na quarta-feira (28) e noticiada inicialmente pela revista Oeste. Em outra reação, a defesa de três acusados de hostilizar Moraes em Roma teve negado o seu pedido feito ao ministro Dias Toffoli para que fossem exibidas as imagens completas do incidente para provar omissões dos peritos da Polícia Federal.

Supostamente para tentar esconder um erro judiciário dele próprio, indicando que um investigado estava no exterior quando sequer tinha deixado o país, Moraes impediu a Folha de São Paulo de entrevistar um investigado. A censura prévia para impedir a manifestação do ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL), Filipe Martins, não tem amparo na lei.

Senador convida ex-auxiliar de Moraes a participar de ato público na Paulista

Moraes também continua empenhado em investigar seu ex-auxiliar no TSE, Eduardo Tagliaferro, por suposto envolvimento no vazamento de informações para a imprensa sobre procedimentos de Moraes considerados irregulares por juristas independentes e normais pelo STF. Barroso negou o pedido feito pela defesa do servidor de afastamento de Moraes do inquérito sobre o vazamento de mensagens entre seus assessores.

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O senador Magno Malta (PL-ES) fez um apelo ao Senado para agir contra a “ditadura do Judiciário” e convidou Eduardo Tagliaferro para comparecer à manifestação em Sete de Setembro contra as decisões de Moraes. Ele também quer que o ex-coordenador do órgão de “combate à desinformação” do TSE fale sobre o caso nas comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Segurança Pública (CSP) do Senado.