O secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e delegado da Polícia Federal, Anderson Gustavo Torres, é o mais cotado para assumir o cargo de diretor-geral da PF. A confirmação do nome foi feita pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, que deseja trocar o comando da PF, atualmente ocupado pelo delegado Maurício Valeixo. Torres seria uma indicação do ex-deputado federal Fernando Francischini (PSL-PR), que também é delegado da PF e aliado de Bolsonaro.
Homem de confiança do ministro da Justiça, Sergio Moro, Valeixo assumiu o cargo em janeiro desse ano e agora, oito meses depois, corre o risco de ser substituído por Torres. “Essa turma [que dirige a PF] está lá há muito tempo, tem que dar uma arejada”, disse Bolsonaro, na quarta-feira (4). A fala foi interpretada como mais uma tentativa de intervenção do presidente na Polícia Federal – há algumas semanas ele anunciou a saída do superintendente da PF no Rio por "produtividade".
Ironia do destino, Torres já foi contra pressões política na PF. Ex-diretor de Assuntos Parlamentares e Institucionais da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), ele se mobilizou em 2016 para coletar assinaturas em favor da PEC 412/2009, que prevê maior autonomia funcional e administrativa, inclusive orçamentária, da Polícia Federal. O abaixo-assinado da ADPF coletou meio milhão de assinaturas e foi entregue, em outubro de 2017, formalmente à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados.
Na época, Torres defendeu que o atual modelo deixa brechas para interferências políticas ao garantir ao Executivo a palavra final sobre as nomeações de diretores e superintendentes da corporação, e a liberação de diárias para operações mais longas, além da possibilidade de alterar a proposta orçamentária definida pela PF. “É um superpoder eu nomear os meus auxiliares, ou indicar o meu orçamento”, questionou o delegado, em abril de 2016, segundo a Agência de Jornalismo Investigativo Pública.
O abaixo-assinado vinha acompanhado de uma “Carta aberta do povo brasileiro ao Congresso Nacional” alertando sobre interferências políticas na cúpula da PF. “A constante ameaça de substituição do Diretor-Geral da Polícia Federal também torna evidente a necessidade de previsão constitucional de um mandato. Uma mudança fundamental para evitar que o dirigente da instituição de maior credibilidade do país atue sem nenhuma garantia legal, podendo ser destituído a qualquer momento”, diz o texto.
“Não podemos confiar que a autonomia da Polícia Federal esteja nas mãos do Ministro da Justiça, qualquer que seja ele”, afirma outro trecho da carta. A PEC, apresentada em 2009 pelo deputado mineiro Alexandre Silveira (na época do PPS, hoje do PSD), foi ressuscitada no final de agosto passado na CCJ da Câmara, por ocasião da polêmica sobre a troca do diretor da PF no Rio de Janeiro.
“A PEC 412 facilita, melhora o trabalho da polícia. Ela não representa a independência da Polícia Federal, que continuará vinculada ao Poder Executivo, seguindo as mesmas regras, trabalhando da mesma forma”, afirmou Torres em 2016.
PEC abriu racha na PF
O apoio dos delegados à PEC abriu uma racha na corporação. Agentes e demais cargos da PF – peritos, papiloscopistas e escrivães – alertaram sobre o risco à democracia por conceder superpoderes ao comando da Polícia Federal. Contra a proposta se posicionou também a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), ligada ao Ministério Público Federal.
“Essa pauta tem certo carisma, especialmente em época de Lava Jato, mas a verdadeira autonomia, a de investigar, nós já temos”, afirmou em 2016 o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Luís Boudens.
Em maio de 2016, a Fenapef e Associação Nacional dos Escrivães de Polícia Federal emitiram nota de repúdio contra Torres, depois que numa entrevista o delegado ironizou o trabalho dos escrivães. “E vão botar quem de diretor-geral da PF, o escrivão?”, disse na época.