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O ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal, Anderson Torres, declarou nesta terça-feira (8), durante audiência na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro, que o documento encontrado em sua casa e chamado de "minuta do golpe" é apócrifo e imprestável para qualquer finalidade.
"Basta uma breve leitura para que se perceba ser imprestável para qualquer fim, uma verdadeira aberração jurídica. Este papel não foi para o lixo, por mero descuido", disse.
Torres também rebateu a acusação de que tinha usado a Polícia Rodoviária Federal para dificultar as votações no segundo turno das eleições de 2022. E lembrou que, mantendo a autonomia da PRF, foram apreendidos valores a serem usados na compra de voto. Acrescentou ainda que jamais contestou os resultados das urnas e que, inclusive, foi o primeiro ministro a cooperar na transição de governos.
Torres também fez esclarecimentos sobre vandalismo, tentativas de atentado e acampamentos em frente ao quartel-general do Exército, com efetividade para manter a ordem. Segundo ele, uma de suas primeiras ações como secretário de Segurança do DF foi tratar do desmonte dos acampamentos em frente ao QG do Exército em Brasília, que estava sendo planejado para o dia 10 de janeiro.
Por fim, ele destacou o plano para proteger os prédios públicos definido no Protocolo de Ação Integrado (PAI), acordado por diversos órgãos de segurança do DF e federais, não foi cumprido. "Importante ainda relembrar que o Protocolo de Ações Integradas previa o fechamento da Esplanada em alguns casos. O que posso afirmar com toda segurança é que houve falha grave na execução do PAI. Se tivessem cumprido à risca o Plano os atos de vandalismo do dia 8 de janeiro não teriam sido consumados", afirmou Torres, acrescentando que até o dia 6 à noite ele não teve qualquer informação oficial indicando que haveria ações radicais em 8 de janeiro.
"O Protocolo de Ações Integradas (PAI) é tão completo que não possibilitaria os ocorridos do 8 de janeiro. Por isso viajei tranquilo para os EUA, sem indícios de ameaças graves. Caso contrário nem teria viajado. Já disse que a Praça ficaria isolada e somente a queda de uma bomba poderia ameaçar os prédios", disse.
O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) questionou Torres sobre o eventual extravio de dezenas de alertas de invasões no Ministério da Justiça, comandado por Flávio Dino. Torres disse que a estrutura funcional da pasta até a sua gestão não criaria dificuldades para circular as informações. Ele estranhou também a resistência de Dino em compartilhar as imagens de sua sede no dia, contudo, não quis responsabilizar o governo diretamente pelo não acionamento da Força Nacional. “Isso precisa ser apurado”, disse.
Já o deputado Delegado Ramagem (PL-RJ) perguntou ao ex-ministro se houve omissão da secretaria de segurança do Distrito Federal e se ele tinha comando direto para acionar soldados. Torres, que ficou preso por quatro meses acusado de omissão, confirmou que não poderia receber as imputações. O parlamentar lembrou que dos 800 homens disponíveis da guarda presidencial e força nacional, foram alocados apenas 30 para proteger prédios da jurisdição federal e tarde demais.
"Se tivesse recebido alerta sobre vandalismo, não teria viajado", diz Torres
Torres contou também que sua passagem para os Estados Unidos, onde estava no dia 8 de janeiro com a família, havia sido comprada em novembro. Afirmou ainda que se surpreendeu com os "fatos repugnantes" de depredação das sedes dos Três Poderes. "Se eu tivesse recebido qualquer alerta ou informe de inteligência indicando o risco eminente de violência e vandalismo eu não teria viajado", afirmou.
O delegado da Polícia Federal relatou sua experiência profissional e disse que sempre atuou de forma técnica, profissional e dentro da lei e que coopera com a elucidação dos fatos relacionados ao 8 de janeiro. Ele destacou suas ações contra o tráfico de drogas e crimes que afetam as populações mais carentes e indivíduos mais indefesos. Aproveitou para criticar operações policiais marcadas por espetacularização e vazamentos seletivos.
O ex-ministro da Justiça também foi questionado sobre o atentado a bomba nos arredores do aeroporto de Brasília em 24 de dezembro e os tumultos em frente à sede da Polícia Federal após a prisão do cacique Serere Xavante, em 12 de dezembro do ano passado.
Torres afirmou que a tentativa de invasão da Polícia Federal em 12 de dezembro foi impedida e os responsáveis presos dias depois. Sobre a tentativa de atentado a bomba em 24 de dezembro, informou que chegou a colocar a aparato do ministério à disposição, mas a polícia civil do Distrito Federal solucionou sozinha a questão.
O presidente da comissão, deputado Arthur Maia (União Brasil-BA), decidiu que Torres poderia ser inquirido pelos senadores Flávio Bolsonaro e Marcos do Val, apesar das restrições de contato determinadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Torres nega operações da PRF para inibir votações no Nordeste em outubro de 2022
Em resposta à relatora da CPMI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), Torres descartou ter conhecimento da abertura de empresas suspeitas de financiar atos de vandalismo ou golpistas. Ele também negou que tratou de operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para inibir votações em Lula no Nordeste.
Sua presença em Salvador cinco dias antes do segundo turno se devia, segundo ele, à entrega de novas instalações da Polícia Federal. Ele disse ainda que não teve contato com comando local da PRF e destacou que a PF e a PRF cumpriram o seu papel institucional nas eleições. O ex-ministro negou ter sofrido ingerência do ex-presidente Jair Bolsonaro durante seus 20 meses de gestão no ministério da Justiça.
A CPMI já tratou deste assunto no primeiro semestre, quando ouviu o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques. Na ocasião, Vasques disse aos parlamentares que há uma “falsa narrativa” da esquerda sobre blitze realizadas nas rodovias no Nordeste durante o segundo turno das eleições de 2022.