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A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) afirmou que as indicações feitas pelo Ministério dos Povos Indígenas (MPI) para compor a Câmara de Conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o marco temporal não representam o movimento indígena. Em nota divulgada na segunda-feira (14), a entidade reiterou que não irá participar do grupo instituído no Supremo.
Na segunda, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) havia indicado cinco representantes indígenas - um de cada região do país - para integrar o grupo por determinação do ministro Gilmar Mendes, já que a Apib decidiu se retirar da Câmara de Concilicação no STF.
Sobre as escolhas dos nomes pela pasta, a entidade indígena disse que os indicados integram os quadros de servidores de órgãos governamentais e por isso "deve ficar claro que não estarão lá em nome do movimento indígena".
Questinado sobre o posicionamento da Apib, o Ministério dos Povos Indígenas salientou que "todos os indicados são especialistas e conhecem amplamente suas regiões". Já com relação à Câmara de Conciliação no STF, a pasta disse que tem "a confiança de que, como guardiã máxima da Constituição, a Corte não permitirá retrocessos em relação aos direitos originários dos povos em relação aos seus territórios". Confira a nota enviada pelo ministério no fim da reportagem.
Matéria da Gazeta do Povo já havia destacado, em agosto, que representantes dos povos indígenas que participavam da Câmara de Conciliação sobre o marco temporal tentavam travar as discussões. A Apib chegou a afirmar que só seria possível continuar com a tentativa de conciliação se houver suspensão da lei do marco temporal (Lei 14.701/2023) até o fim das discussões. O STF, no entanto, não atendeu ao pedido da entidade.
Embora não dependa da participação direta deles, a pressão indígena tem surtido efeitos e o marco temporal está parado, mesmo após ter sido aprovado pelo Congresso.
Marco temporal
A tese do marco temporal estabelece que os povos indígenas teriam direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam na data de promulgação da Constituição de 1988. Em setembro de 2023, o STF decidiu que a data não pode ser utilizada para definir a ocupação tradicional da terra pelas comunidades indígenas.
Em dezembro, antes de a decisão do STF ser publicada, o Congresso Nacional editou a Lei 14.701/2023 e restabeleceu o marco temporal. Desde então, foram apresentadas ações questionando a validade da lei e outras para que o STF declare sua constitucionalidade.
Em mais uma crítica ao marco temporal, a Apib afirmou também se tratar de “desconstitucionalização” dos direitos garantidos pela Constituição, sobretudo o direito sobre as terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, estabelecido no artigo 231.
Por outro lado, lideranças do agronegócio, como o deputado Pedro Lupion (PP-PR) e a senadora Tereza Cristina (PP-MS) têm defendido a necessidade de pacificação, a segurança jurídica e o direito à propriedade.
"A Lei do Marco Temporal é uma norma válida e vigente, que estabelece claramente o direito de propriedade com base em ocupações de 1988, conforme garantido pela nossa Constituição. Desrespeitá-la significa ignorar o trabalho e a representação legítima de 513 deputados e 81 senadores, comprometendo a vontade e os anseios do povo brasileiro. É imperativo que a Lei 14.701/2023 seja cumprida, assegurando justiça e segurança jurídica para todos os envolvidos", afirmou Lupion em sua coluna na Gazeta do Povo.
Nota do Ministério dos Povos Indígenas
Ao ser questionado sobre as críticas da Apib em relação às indicações para a Câmara de Conciliação do STF, o Ministério dos Povos Indígenas informou que "respeita e trabalha junto com o movimento indígena para ampliar suas conquistas e evitar retrocessos. Como órgão do Governo Federal, o MPI tem o papel institucional de participar de instâncias de diálogo com a atribuição de defesa dos direitos coletivos".
A pasta reforçou ainda que, "atendendo à determinação do Supremo Tribunal Federal e após diálogo com a APIB, o MPI indicou cinco especialistas indígenas para compor a Comissão Especial, que não substituem a representatividade do movimento. Todos os indicados são especialistas e conhecem amplamente suas regiões".
"Acreditando na importância do diálogo institucional entre os três Poderes da República representados na Comissão Especial, temos a confiança de que, como guardiã máxima da Constituição, a Corte não permitirá retrocessos em relação aos direitos originários dos povos em relação aos seus territórios", disse o ministério na nota.