Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária nesta terça-feira (2).| Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado
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O Senado adiou, por mais uma vez, a votação do projeto de lei que reduz o prazo de inelegibilidade definido pela Lei da Ficha Limpa em meio às divergências sobre manter ou ajustar trechos da lei. A votação estava prevista para essa terça-feira (2).

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Houve pedido de retirada de pauta após alguns senadores da oposição defenderem alterações, enquanto que o PT criticou as possíveis mudanças.

”É inoportuna e inadequada qualquer proposta de alteração do texto da Lei da Ficha Limpa”, disse o líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (PT-AP).

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O relator da proposta, senador Weverton Rocha (PDT), apresentou parecer favorável e manteve o texto aprovado pela Câmara. Porém, diante do impasse sobre projeto, ele concordou em adiar a votação para depois das eleições municipais.

O projeto reduz a pena de inelegibilidade de políticos por crimes comuns ou cassados por pares durante o mandato, de oito anos mais o período eletivo em vigor para apenas oito anos. Isso porque, em alguns casos, a condenação pode ser maior do que apenas o prazo determinado, chegando a até 15 anos dependendo do período do mandato de acordo com critérios da Lei da Ficha Limpa.

O líder do Podemos no Senado, Rodrigo Cunha (AL), manifestou o seu posicionamento contrário “a qualquer tipo de flexibilização, diminuição ou alteração neste momento da forma como está sendo proposta essa alteração na Lei da Ficha Limpa”. “Se nós formos fazer qualquer tipo de alteração tem que ser para endurecer ou no mínimo deixar muito claro o que está sendo tratado e aqui não há essa clareza de que é algo que venha para endurecer a quem pisa fora da linha ou a quem não cumpre as leis”, disse Cunha.

Para o senador Oriovisto Guimarães (Podemos/PR), a proposta é “inoportuna” e vai contra o apelo popular que garantiu a criação da Lei da Ficha Limpa. “Mudar a Lei da Ficha Limpa numa hora dessa? É um momento muito inoportuno, com tudo o que acontece no Brasil, com todas as disputas que estamos tendo com outros poderes, das quais o senhor bem sabe. Nós vamos estar passando um atestado de que estamos votando a favor daqueles que cometem delitos, de que estamos amaciando a Lei da Ficha Limpa”, declarou Oriovisto.

Ao rebater as críticas ao projeto, o relator disse que o texto visa “aperfeiçoar e melhorar a lei que está em vigor”. “Não se trata aqui de letras frias, trata-se de ex-Prefeitos, ex-secretários, ex-Parlamentares que, muitas das vezes, por qualquer que seja a sua culpabilidade, qual seja a pena que ele esteja cumprindo, só precisam saber qual é o tempo dessa pena que vão cumprir. Se é para aumentar aqui para 20 anos, que se escreva "20", mas ele precisa saber quanto tempo é essa pena. Não dá para ficar ad aeternum do jeito que está.”, explicou Weverton.

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Já o senador Sérgio Moro (União/PR) defendeu que talvez seja necessário uma mudança na lei contra as “injustiças” que são cometidas, mas rebateu o posicionamento do PT ao “falar em moralidade pública contra o projeto“. Ele citou como exemplo as infrações administrativas menores, o descumprimento cabuloso da legislação eleitoral, inovações e criações jurisprudenciais.

Porém, o ex-juiz da Lava Jato reforçou a necessidade de “retomar uma discussão séria da agenda anticorrupção, que passa, inclusive, por dar autonomia à Polícia Federal, por termos a execução da condenação criminal em segunda instância“. “Podemos até discutir eventuais mudanças na Lei da Ficha Limpa para corrigir injustiças, mas não em relação a quem foi condenado criminalmente por corrupção”, declarou.

Na avaliação do senador Humberto Costa (PT-PE), a proposta é “flagrantemente inconstitucional” e tem o objetivo de beneficiar pessoas específicas. “Já se sabe qual era o objetivo lá atrás de quem apresentou essa proposta: criar as condições para que pessoas condenadas por crimes julgados pela Justiça, em última instância, possam readquirir o direito da elegibilidade”, disse.

O que prevê o projeto

A proposta estabelece que, para a caracterização de inelegibilidade por improbidade administrativa, é necessária a comprovação de dolo, ou seja, a intenção deliberada de alcançar um resultado ilícito.

Na prática, a proposta determina que, para que alguém seja declarado inelegível por atos de improbidade, não basta que o ato tenha sido irregular ou causador de dano; é necessário provar que a pessoa teve a intenção clara e deliberada de cometer o ilícito.

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Além de políticos condenados à inelegibilidade, o projeto também estabelece que servidores públicos licenciados para concorrer a cargos eletivos devem retornar imediatamente às suas funções caso suas candidaturas não sejam registradas, indeferidas ou cassadas.

Já o período de desincompatibilização dos cargos – ou seja, de afastamento das funções públicas – variará de três a seis meses antes da eleição dependendo do cargo pretendido.

Retrocesso

A proposta vem sendo criticada por vários setores, inclusive pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e o Movimento de Combate à Corrupção (MCCE).

Em nota, divulgada nesta segunda-feira (2), a CNBB e o MCCE apontaram que o projeto de lei ameaça desfigurar os principais mecanismos de proteção da Lei da Ficha Limpa, beneficiando especialmente aqueles condenados por crimes graves, cuja inelegibilidade poderá ser reduzida ou mesmo anulada antes do cumprimento total das penas.

A CNBB e o MCCE afirmam não ser “possível que uma das únicas leis de iniciativa popular de nosso país seja alterada sem um diálogo com todos os setores da sociedade brasileira” e exige um amplo debate com participação de todos sobre o PLP.

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Por fim, as organizações convidam os senadores a refletirem cuidadosamente sobre as consequências dessa proposta, que será debatida no plenário do Senado Federal em vista do “compromisso com a ética e a justiça, valores fundamentais para a construção de um Brasil mais justo, democrático e solidário.”

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]