Os episódios da invasão e depredação das sedes dos Poderes no 8 de janeiro marcaram uma mudança na postura do procurador-geral da República, Augusto Aras. Desde o ataque, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e autoridades do Executivo passaram, nos bastidores, a criticá-lo por considerarem que teria sido omisso diante de ameaças de violência contra as instituições, muito em razão do alinhamento com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Por isso, nos últimos três meses, Aras tem buscado enfatizar a defesa da democracia, da pacificação social e, com isso, também tenta se aproximar do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que sempre cita o episódio como uma tentativa de golpe contra sua eleição.
Aras está no final de seu segundo mandato à frente da PGR, que termina em setembro. Nos bastidores, integrantes do Ministério Público Federal (MPF) consideram que ele ainda pode buscar uma recondução junto a Lula, para mais dois anos no comando do órgão; indicar um sucessor próximo; ou, ao menos, encerrar sua gestão com uma imagem mais positiva.
Cabe ao presidente da República indicar o procurador-geral, e Lula já disse que não pretende, desta vez, seguir a lista tríplice, composta pelos três nomes mais votados pela categoria. Aras foi escolhido por Bolsonaro fora da lista, quebrando uma tradição seguida desde 2003.
Em 2021, quando foi reconduzido para um segundo biênio à frente da PGR, Aras teve amplo apoio no Senado, inclusive do PT, especialmente por conta da atuação para desmontar a Operação Lava Jato. Mas, até o momento, não há sinais de que Lula queira mantê-lo no cargo.
Desde 8 de janeiro, Aras tem se empenhado em mostrar que a PGR está agindo. Criou um grupo e designou um subprocurador, Carlos Frederico Santos, que já denunciou ao STF aproximadamente 1,4 mil acusados de envolvimento nos atos. As primeiras cem denúncias foram analisadas pelos ministros da Corte, os quais tornaram os manifestantes réus em processos criminais. Outras 200 denúncias devem ser apreciadas pelos ministros a partir da madrugada desta terça-feira (25).
Em 12 de abril, quando a presidente do STF, Rosa Weber, anunciou o primeiro julgamento, usando palavras duras (“ataque desprezível” no “dia da infâmia”), Aras, presente na sessão, pediu a palavra para marcar posição pela punição dos manifestantes, eleitores de Bolsonaro e opositores de Lula. “Não poderia deixar de registrar a associação a toda a manifestação de Vossa Excelência sobre os atentados à nossa democracia”, disse o procurador-geral.
Outros sinais foram emitidos. O mais recente foi uma manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) para manter no STF uma notícia-crime contra o senador Sergio Moro (União-PR) por supostos atos praticados quando era juiz da Lava Jato.
Desde que assumiu a Presidência, Lula não esconde o rancor que guarda contra Moro, o primeiro a condená-lo na operação – em entrevista recente, disse que só pensava em se vingar do ex-juiz quando estava na cadeia e disse que era “armação” uma investigação para frustrar um atentado do PCC contra sua vida e de sua família.
A notícia-crime contra Moro, porém, não deveria, a rigor, tramitar no STF, por dois motivos. Ela contém uma acusação do advogado Rodrigo Tacla Duran por suposta extorsão em 2016, quando Moro era magistrado em Curitiba. O STF já estabeleceu que casos ocorridos antes do mandato parlamentar e sem ligação com o cargo eletivo devem tramitar na primeira instância. Além disso, a acusação contra Moro já foi descartada pela própria PGR no ano passado.
Mesmo assim, o órgão considerou que Moro teria tentado interferir em processos contra Tacla Duran – acusado de lavar dinheiro para a Odebrecht – como ministro da Justiça e como senador, o que justificaria sua investigação no STF. O caso deverá ser analisado pelo sucessor do ministro Ricardo Lewandowski, que se aposentou em 11 de abril. O mais cotado para a vaga é Cristiano Zanin, advogado pessoal de Lula e maior inimigo de Moro na Lava Jato.
Aras mudou de opinião sobre Lei das Estatais em poucos dias
Outro sinal pró-Lula foi dado no início de março, quando, de uma semana para outra, Aras mudou seu entendimento sobre a Lei das Estatais numa ação no Supremo.
Aprovada em 2016, a lei impede que políticos assumam a direção de empresas públicas sem antes passar por uma quarentena de três anos fora de cargos no Executivo ou no comando de campanhas eleitorais. O objetivo é impedir corrupção, como desvendado na Lava Jato, em que recursos das estatais eram desviados para partidos que controlavam diretorias da Petrobras.
No final de fevereiro, Aras enviou ao STF parecer defendendo a lei, dizendo que ela buscou dar maior efetividade na gestão das estatais, garantia probidade e integridade por evitar conflitos de interesse, com escolhas de dirigentes “orientadas por critérios de profissionalismo e qualificação técnica, objetivando combater a ingerência indevidas de fatores externos às finalidades e funções empresariais”.
Na semana seguinte, porém, Aras mudou de opinião. Em 5 de março, enviou novo parecer, desta vez favorável ao fim das restrições. Argumentou que as restrições feriam os “direitos fundamentais de participação na vida político-partidária e de cidadania ativa na gestão da coisa pública”. “Consubstancia espécie de punição pela participação político-partidária, com privação de direito em face de convicção política”, afirmou na nova manifestação.
Com base nisso, Lewandowski, que era relator da ação contra a quarentena, votou e depois concedeu uma liminar autorizando que políticos assumissem as estatais. A decisão agradou Lula, que busca recompensar partidos que apoiam o governo com cargos nas estatais, e partidos de esquerda e do Centrão, que querem controlar orçamentos bilionários das empresas públicas.
Acenos aos STF
O procurador-geral também tem buscado simpatia maior entre os ministros do STF usando as palavras. Na solenidade de abertura do ano judiciário, em 1º de fevereiro, Rosa Weber reinaugurou o plenário da Corte reconstruído após os atos de vandalismo de 8 de janeiro. A ocasião foi marcada por forte simbolismo, com a ministra repetindo que, apesar da depredação, a democracia seguia “inabalada”.
Aras chamou a atenção ao afirmar: “cidadãos do Estado Democrático de Direito precisamos dizer todos os dias: 'democracia, eu te amo, eu te amo, eu te amo'”.
Em 12 de abril, ele acentuou o tom sentimental durante uma sustentação no plenário da Corte sobre a possibilidade ou não de hospitais realizarem exames de DNA de recém-nascidos para evitar a troca de bebês. A PGR defendeu a inconstitucionalidade da medida, por violar a intimidade. Em certo momento, passou a conjecturar sobre os riscos da inteligência artificial.
Dirigindo-se ao ministro Luís Roberto Barroso, disse: “Talvez haja um tempo em breve que tenhamos que ter aulas de empatia nas escolas. Empatia, solidariedade, fraternidade, e outros sentimentos que fazem parte de uma geração, que creio que aqui nesta Corte está bem representada, que é o sentimento de fazermos parte de uma única humanidade, de um processo civilizatório rico pela sua diversidade, pelo seu pluralismo, pelo seu multiculturalismo”, afirmou.
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