O Brasil tem um dos sistemas tributários mais complexos do mundo: são quilos de normas, legislação e falta de entendimento entre várias partes. Um exemplo é o impasse na cobrança de ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins. Apesar da indefinição sobre a questão, a arrecadação dessas contribuições da União aumentou nos últimos anos. É o que mostra um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) e o escritório Amaral, Yazbek Advogados.
Após anos de discussão na Justiça, o Supremo Tribunal Federal (STF) avaliou o caso em 2017 e julgou inconstitucional a cobrança do imposto estadual da base de cálculo das contribuições federais. A União recorreu, temendo perder arrecadação, mas o Supremo não voltou a avaliar a questão. A estimativa é de que a mudança na cobrança pudesse causar um impacto de R$ 484,5 bilhões, no período entre 2013 e 2018, segundo os cálculos do estudo.
Enquanto isso, foi a vez de a Receita Federal publicar uma solução de consulta interna, com um novo entendimento sobre o assunto no fim do ano passado. “Esse é mais um exemplo nítido de como o nosso sistema tributário é complexo. A própria legislação é complexa e gera diferenças de interpretação que fazem com que os contribuintes tenham de ir ao Judiciário”, aponta Letícia Mary Fernandes do Amaral, advogada tributarista e uma das coordenadoras do estudo.
Apesar de todo esse vai e vem – e indefinição jurídica sobre que norma seguir –, a arrecadação no país não caiu. Pelo contrário: mesmo com essa exclusão, ela aumentou nos últimos três anos. O estudo do IBPT e Amaral, Yazbek mostra que a arrecadação de tributos federais em 2018 foi de R$ 1,48 trilhão, o que representou um crescimento real – já descontada a inflação – de 4,8% em relação ao resultado de 2017, ano em que o STF excluiu a cobrança do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins.
A arrecadação de PIS/Cofins, nominalmente, também cresceu no período. “O mais interessante a ser notado é que comparando-se os anos de 2016/ 2017 e 2017/2018, o crescimento percentual da arrecadação do PIS e da Cofins foi superior ao crescimento percentual do total da arrecadação federal. Pode-se observar, também, que a participação do PIS e da COFINS na arrecadação total, em 2018, foi superior aos dos últimos três anos”, aponta o estudo.
A pendenga
A inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins é alvo de questionamento judicial há anos. Em março de 2017, o STF julgou uma reclamação e determinou que a cobrança era inconstitucional. A União recorreu, mas até o momento os embargos de declaração não foram julgados, tampouco estão na pauta do Supremo. E é nesse recurso que começa parte dessa confusão.
A alegação é de que a decisão do STF não deixa claro qual ICMS deve ser excluído da base de cálculo do PIS/Cofins: o ICMS a Recolher (efetivamente pago) ou o ICMS sobre vendas (destacado na Nota Fiscal). Segundo a advogada Letícia Mary Fernandes do Amaral, a situação não é bem assim. “Quando o Supremo julgou ocaso em 2017, ele manteve uma sentença dada na origem, na primeira instância, de um caso do Paraná. E essa sentença era muito clara falando que o ICMS a ser destacado era o ICMS da nota fiscal”, aponta.
Sem qualquer decisão da Corte sobre esses embargos, a Receita Federal, por meio da Coordenação Geral de Tributação (Cosit), acabou entrando no assunto para orientar como os fiscais devem proceder para o cumprimento de decisões judiciais que já transitaram em julgado. “Esse tipo de ato vincula todos os julgadores administrativos [a seguirem a recomendação]. Mas, na Justiça, é totalmente questionável”, explica Letícia. E a interpretação da receita é que o ICMS a ser excluído é o tributo a recolher (pago) e não o destacado na nota.
“Cabe salientar que a base de cálculo para o recolhimento do PIS e da COFINS é a receita bruta, incidindo, portanto, sobre o ICMS destacado na nota. O que foi declarado inconstitucional pelo STF foi a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Na verdade, o que pretende a Receita Federal 2018 não é dar uma ‘orientação’ aos fiscais para atuarem nos processos que já transitaram em julgado, mas sim, ‘dar uma nova interpretação’ à decisão do STF e, com isso, restringir os direitos dos contribuintes”, pondera o estudo.
E o contribuinte?
Letícia explica que é o contribuinte que está na posição mais frágil, porque há dúvidas até na hora de calcular o imposto em relação a que regra seguir. “Como a Receita precisa seguir a solução Cosit, o contribuinte lesado acaba indo ao Judiciário, tem de entrar com mandado de segurança ou alguma ação para reverter esse entendimento, que criou uma insegurança jurídica de algo que já estava mais ou menos consolidado”, diz.
Apesar de o STF ter se manifestado em 2017, essa pendência é anterior e a União já havia calculado o impacto financeiro dessa decisão para embasar um projeto de lei de diretrizes orçamentárias, em 2014. Na época, estimou que esse impacto seria de R$ 250,3 bilhões, mas não há explicações de como se chegou a esse número.
O IBPT e o escritório Amaral, Yazbek Advogados atualizaram esse número, seguindo os mesmos parâmetros disponíveis. A conclusão é de que o impacto financeiro da decisão do STF, atualizado até o fim de 2018, poderia ser de R$ 484,5 bilhões. Mas, seguindo a orientação da Cosit, esse valor cai para cerca de R$ 130 bilhões.
“Permanecendo o entendimento da Cosit 13/2018, apenas os contribuintes serão prejudicados, pois, a depender de seus percentuais de compras e acúmulo de créditos de ICMS, podem não conseguir nada a título de recuperação de créditos pela exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS. Em contrapartida, a arrecadação tributária aos cofres públicos tende a continuar em crescimento”, conclui o estudo.
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