Presidente da Câmara, Arthur Lira e o presidente Jair Bolsonaro| Foto: Will Shutter/Câmara dos Deputados
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No comando da Câmara dos Deputados há pouco mais de cem dias, Arthur Lira (PP-AL) tem aproveitado sua influência com o Centrão para avançar com pautas elencadas por ele e por seu grupo como prioritárias. Na contramão do Senado, que tem levado o protagonismo com a CPI da Covid, Lira conseguiu aprovar, até o momento, 34 matérias, sendo 23 projetos de lei, enquanto a oposição não conseguiu maioria para rejeitar nenhuma proposta.

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Dias depois de derrotar o grupo do ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ) na disputa pelo comando da Casa, Arthur Lira teve como primeiro feito da sua gestão a aprovação do projeto de autonomia do Banco Central. A discussão se arrastava no Congresso desde 2019 e votação foi comemorada pelo governo federal.

Após idas e vindas na discussão do Orçamento para 2021, o grupo de Lira conseguiu avançar com a peça orçamentária que trouxe a previsão de R$ 26,5 bilhões em emendas parlamentares. O montante gerou um conflito com a equipe econômica do governo, e um acordo acabou reduzindo o valor para R$ 16 bilhões que serão distribuídos, principalmente, entre as bancadas do Centrão.

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“Houve um barulho danado no Orçamento. Mas pela primeira vez o governo faz o orçamento com sua base parlamentar; há excessos, claro. Há ministérios que querem gastar mais. Mas o resultado é que foi feito acordo, não furou teto e voltamos às reformas”, argumentou o ministro da Economia, Paulo Guedes, nesta semana durante evento do BTG Pactual.

Ainda com o apoio dos partidos do Centrão, Lira conseguiu aprovar mudanças no regimento interno e com isso dificultou o trabalho da oposição através do chamado “kit obstrução”. Com a aprovação de um requerimento de urgência, a maioria da Câmara votou o pacote que, entre outras medidas, revoga dispositivos que tratam da prorrogação de sessões e reduz o tempo de fala de deputados na discussão de projetos.

Segundo o presidente da Câmara, o regimento anterior, criado em 1989, "possuía dispositivos da época do regime militar, de 1972, quando havia o bipartidarismo". "A modernização do regimento interno vai qualificar o debate e aumentar - ao invés de diminuir - o tempo de discussão das matérias. Mas simultaneamente irá impedir a banalização da obstrução, um legítimo direito das minorias", afirmou.

Na esteira da redução do kit obstrução, Lira pautou no dia seguinte o projeto que estabeleceu novas regras para o licenciamento ambiental. A matéria enfrentava resistências por parte dos partidos de oposição. O chamado marco do licenciamento ambiental teve o apoio de 300 deputados contra 122 votos contrários.

Nesta semana, Arthur Lira aproveitou para comemorar os avanços de matérias dentro da Câmara nesses primeiros meses da sua gestão na presidência. “Nunca tivemos um alinhamento de astros tão perfeito com um governo liberal e um Congresso reformador”, argumentou.

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Arthur Lira buscou manter aliança com Bolsonaro

Se, por um lado, Arthur Lira conseguiu frear a atuação dos partidos de esquerda na Câmara, por outro promoveu afagos ao governo do presidente Jair Bolsonaro. Durante esse período, Lira destravou matérias de interesse do Executivo, como o projeto que trata do homeschooling, e conseguiu adiar discussões como a do projeto que autoriza o cultivo da cannabis para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais.

Defendida por Bolsonaro e aliados como o ministro da Educação, Milton Santos, e a ministra da Mulher e dos Direitos Humanos, Damares Alves, o projeto do homeschooling foi acelerado nas últimas semanas e agora a expectativa é votar a matéria ainda na primeira quinzena de junho. A ideia é aprovar um requerimento de urgência para o relatório apresentado pela deputada Luísa Canziani (PTB-PR) e com isso aprovar o texto que descriminaliza a educação domiciliar no país.

Na contramão, Lira atuou nos últimos dias para que a base governista protelasse o avanço da matéria que pretende liberar o cultivo da cannabis para fins medicinais no Brasil. O presidente da comissão que analisa o projeto, deputado Paulo Teixeira (PT-SP) pretendia votar o relatório ainda neste mês, mas acabou adiando as previsões devido a uma audiência pública marcada por Lira para debater o tema em plenário.

Contrário ao texto, o presidente Jair Bolsonaro já informou que pretende vetar o projeto caso ele venha ser aprovado pelo Congresso. Após a votação na Câmara, o texto ainda dependeria de analise do Senado.

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Também defendido pelo governo Bolsonaro, Lira passou a trabalhar pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto auditável. Segundo ele, se a proposta for aprovada, será feita uma amostragem em alguns equipamentos para que algum mecanismo seja incorporado à urna eletrônica e que o voto seja impresso e verificado.

“Hoje temos uma parte da sociedade e parte do Congresso que querem auditar o voto, e temos uma Justiça Eleitoral para dirimir essas dúvidas”, argumentou Lira. O tema está em discussão na Comissão Especial, e se houver acordo será levado ao plenário da Casa ainda neste semestre.

Na contramão da CPI, Lira busca protagonismo para reformas

Crítico da instalação da CPI da Covid pelo Senado, Arthur Lira tem aproveitado a aliança com o governo para avançar com reformas e privatizações. Para o presidente da Câmara, a outra Casa do Legislativo escolheu um momento “inoportuno” para a criação do colegiado.

“Todas as pessoas que cometeram erros neste momento vão pagar, vão ser responsabilizadas eleitoralmente, penalmente, civilmente, mas não podemos permitir que o Ministério da Saúde perca o foco do combate à pandemia. Assistimos um debate polarizado, os senadores fazendo mais discursos do que interrogando pessoas”, criticou Lira nesta semana.

Com discurso de que o ano de 2021 não poderia ser pedido, Lira prometeu avançar, ao menos na Câmara, com as reformas administrativa e tributária além das privatizações do Correios e da Eletrobras. “Seria lamentável que percamos essa janela de 2021 e açodando uma janela de 2022, não é possível que vamos perder esse ano. Não podemos perder tempo de votar projetos estruturantes para que na saída tenhamos um novo horizonte”, disse o presidente durante debate promovido pelo BTG Pactual.

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Com essa articulação, a admissibilidade da reforma administrativa passou pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa na última semana e seguiu para a Comissão Especial. O projeto é encampado principalmente pelo ministro Paulo Guedes, que vê nos gastos com servidores uma das principais causas do desequilíbrio nas contas públicas.

Apesar disso, Lira tem afirmado que a discussão da matéria não será acelerada e abrirá espaço para que a tramitação tenha participação de todos os membros do Congresso. “Não podemos nos açodar", argumentou o presidente da Câmara.

Dependendo de uma negociação maior dentro da Câmara para a aprovação de reformas, Lira fechou um acordo com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para dividir a reforma tributária. Na divisão, senadores analisarão as mudanças na Constituição sobre o tema, quanto a Câmara ficará com pontos que podem ser votados por meio de projetos de lei.

"A Câmara dos Deputados ficará incumbida de uma série de projetos de iniciativa do Poder Executivo, que discutam a base de Imposto de Renda, de IPI, de PIS e Cofins", disse Rodrigo Pacheco nesta semana após encontro com Lira.

A proposta de fatiamento da reforma tributária é defendida pelo ministro Paulo Guedes desde o ano passado. O chefe da equipe econômica considera mais simples aprovar projetos separados que uma grande proposta de emenda à Constituição que faça todas as mudanças de uma só vez.

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Privatizações voltam ao debate

Ainda nesses primeiros três meses à frente da Câmara, Lira articulou para que a Medida Provisória que viabilizava a desestatização da Eletrobras fosse aprovada por ampla maioria entre os deputados. O modelo de desestatização prevê a emissão de novas ações da Eletrobras, a serem vendidas no mercado sem a participação do governo, resultando na perda do controle acionário mantido atualmente pela União.

Ainda no campo das privatizações, Arthur Lira prometeu votar, entre julho e agosto, o projeto que prevê a privatização dos Correios. “Este é o prazo que acertamos para que se pudesse dar tempo de fazer audiências públicas, discutir e acertar os detalhes. Haverá todo o tempo necessário”, afirmou Lira em entrevista à revista Exame.

Segundo o presidente da Câmara, a projeção para as votações só passou a ser possível com as mudanças no regimento interno da Casa. “A alteração do regimento interno, que muita gente condenou, na prática, tornou o plenário mais democrático e mais proativo. Em vez de ficar discutindo requerimentos protelatórios, há agora mais tempo para discutir o mérito das matérias, com o mesmo direito de obstrução”, completou Lira.

As mudanças também foram comemoradas pelo vice-líder do governo na Câmara, deputado José Medeiros (Podemos-MT), que não sua avaliação deram mais celeridade para a Casa. “O Lira tem se mostrado muito hábil e ao mesmo tempo, a mudança do regimento propiciou uma celeridade na aprovação das matérias, o que aproximou a Câmara do Senado. Eu me senti no Senado, pois estamos acostumados com a celeridade deles, e na Câmara eu ficava agoniado com a prolixidade e exagero de medidas protelatórias”, defendeu.

Já o vice-líder da oposição, deputado Tadeu Alencar (PSB-PE) alegou que mudanças no regimento eram necessárias, no entanto, as que foram aprovadas tiveram como objetivo apenas acabar com a participação das minorias.

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“A gente tem clareza que é importante discutir o aprimoramento da Câmara, o Brasil tem pedido por celeridade e essa era uma discussão que estávamos disposto a fazer. Acreditamos que feito o debate de qualidade, vence quem tem voto, mas não poder discutir acaba com o equilíbrio das forças. Ficou parecendo que só temos o ano de 2021 para aprovar tudo, só porque ano que vem tem eleição”, avaliou Alencar.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]