A relação do presidente eleito da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com o Palácio do Planalto tende a ser harmoniosa. Lira, afinal, era o candidato do governo. E ele já assume o comando da Casa com três grandes missões: barrar iniciativas parlamentares para investigar o governo e o presidente; dar andamento à agenda de reformas econômicas; e "destravar" a agenda de costumes na Câmara.
Dessas missões, provavelmente Arthur Lira conseguirá dar cabo às duas primeiras. Ele tende a esfriar na Câmara o ímpeto de investigação contra Bolsonaro e deverá dar andamento às reformas econômicas. Mas provavelmente colocará a pauta de costumes na rabeira de prioridades em relação às demais.
Barrar impeachment é missão de Arthur Lira
Uma das preocupações do Planalto é frear as movimentações que aumentem a pressão pela abertura de um processo de impeachment do presidente Jair Bolsonaro.
O presidente da Câmara tem a prerrogativa de arquivar ou abrir qualquer processo de impeachment contra um presidente. Teoricamente, com Lira no comando da Casa, Bolsonaro estaria seguro. Mas o Planalto sabe que, se houver uma pressão das ruas sobre os deputados, o próprio Lira será pressionado pelos colegas a abrir o processo. Então, o plano é evitar que a situação chegue a esse ponto.
Por esse motivo o governo quer barrar Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) que possam causa desgaste para o Planalto. É caso da CPI da Saúde, para apurar as responsabilidades do governo federal durante a pandemia do coronavírus; e a CPI do Leite Condensado (para apurar supostos gastos excessivos da União com alimentos).
Durante a campanha, Lira deixou absolutamente claro que é contra o seguimento de qualquer investigação por crime de responsabilidade contra o presidente da República – que poderia levar ao impeachment.
Atualmente, existem 62 representações contra Bolsonaro por diversos motivos, que vão desde acusações de pedaladas fiscais, supostos atos de interferência na Polícia Federal (PF), falta de decoro ao publicar o vídeo pornográfico do 'golden shower' em suas redes sociais, má gestão do Fundo Amazônia e atitudes omissas quanto à distribuição da vacina contra a Covid-19 ou na crise sanitária de Manaus, Amazonas.
Sobre impeachment, Lira esclareceu. “Nesse assunto da pandemia temos que ter muito cuidado e muita serenidade. Esse assunto não pode ser motivo de embates políticos para trazer traumas de interrupções bruscas democráticas".
Sobre a possibilidade de CPIs, Lira disse em público que só vai discutir a autorização de abertura de uma investigação que afete o governo federal caso a oposição obtenha número de assinaturas necessárias – conforme preveem as regras internas da Câmara. "Qualquer CPI que seja preconizada pelos pré-requisitos básicos, fato determinado claro, tenha as assinaturas, lógico que vai para discussão", afirmou o então candidato na semana passada.
Apesar disso, aliados de Lira dizem nos bastidores que o novo presidente da Câmara está disposto a trabalhar para que a oposição não consiga o número mínimo de 171 assinaturas para instalar qualquer investigação contra o governo federal.
Agenda econômica do governo deve avançar com Arthur Lira
Arthur Lira é visto pelo Ministério da Economia como mais favorável às reformas do que o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (DEM-RJ). Portanto, a tendência é que Lira consiga conduzir a tramitação e aprovação das reformas tributária e administrativa.
Mas a reforma tributária que tende a avançar com Lira é a proposta pelo deputado federal Luiz Miranda (DEM-DF), que fez campanha aberta pelo líder do Centrão. O projeto de reforma de autoria de Baleia Rossi (MDB-SP) – a Proposta de Emenda Constitucional n.º 45 (PEC 45) –, tende a ser descartada. Baleia Rossi foi derrotado por Lira na disputa pela presidência da Câmara.
O projeto de Luiz Miranda propõe, por exemplo, a criação de um IVA (Imposto de Valor Agregado) dual, um imposto unificado de dois núcleos (um federal e um subnacional) e de um imposto sobre transações digitais (mais conhecido como a "nova CPMF"). Esta última ideia, porém, não é bem vista pelo próprio presidente Bolsonaro.
Já em relação à reforma administrativa, Lira já deixou claro que é a favor da PEC encaminhada pelo governo federal, mas com algumas alterações. Nesse caso, a expectativa é que PEC, com Lira, seja votada ainda no primeiro trimestre de 2021. “A primeira pauta que vamos fazer é a da reforma administrativa. O Brasil precisa dar sinais claros de respeito ao teto [de gastos]”, defendeu Lira em encontro com deputados da Frente Parlamentar Ética Contra a Corrupção.
Voto impresso tende a ser prioridade
Lira se comprometeu ainda a colocar em votação a PEC do Voto Impresso, proposta para reintroduzir a votação em papel nas eleições como forma de auditar os resultados das urnas eletrônicas. A PEC é defendida abertamente pelo presidente Jair Bolsonaro, que rotineiramente levanta suspeitas (sem provar) sobre a segurança da votação eletrônica.
Lira tem dito a aliados que irá colocar o tema em discussão, mas que cabe aos deputados aliados reduzir a resistência ao tema na Câmara. "Eu confio no processo eleitoral. E, por ser um processo confiável, não vejo por que não acabar com o que tem de pior na política, que são as versões”, disse Lira em entrevista à rádio CBN em dezembro. Ou seja, para acabar com a versão de que há fraude nas urnas eletrônicas, o novo presidente da Câmara diz não ver problema em adotar o voto impresso para auditar a eleição eletrônica.
Mas a Câmara tem de correr contra o tempo para que o voto impresso valha já para as eleições de 2022. Isso porque, pela legislação, qualquer mudança nas eleições tem de ser aprovada um ano antes – ou seja, até outubro deste ano. E, como a proposta é uma PEC, além de ser votada em dois turnos com maioria qualificada na Câmara, precisa passar pela mesma tramitação no Senado.
E a agenda de costumes, como fica?
Por causa da prioridade que Artur Lira deve dar à agenda econômica, é provável que pautas da agenda de costumes fique em segundo plano na gestão dele como presidente da Câmara. Além disso, projetos como a liberação de armas, escola sem partido ou homeschooling (educação domiciliar) não são consensuais no bloco de alianças que Lira montou para se eleger.
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