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O ataque à produtora responsável pelo canal de humor Porta dos Fundos, na véspera de natal, pode virar uma caçada internacional a um dos suspeitos de realizar a ação, o empresário Eduardo Fauzi. Único a ser reconhecido pelas câmeras de vigilância, ele fugiu para a Rússia no domingo (29), segundo apurou a Polícia Civil do Rio de Janeiro. A polícia pediu a inclusão do nome de Fauzi na lista de procurados pela Interpol.
O Porta dos Fundos virou alvo de críticas após o lançamento do especial de Natal “A Primeira Tentação de Cristo”, veiculado na Netflix, cerca de um mês atrás. A produção mostra um Jesus gay, interpretado por Gregório Duvivier. A reprovação ao roteiro do especial evoluiu para um atentado com coquetéis molotov na sede da produtora, na madrugada do dia 24 de dezembro, no Rio de janeiro. Conheça mais detalhes e entenda toda a polêmica sobre o caso em sete pontos.
As primeiras críticas ao especial de Natal
No dia 3 de dezembro, o especial de Natal "Porta dos Fundos: a primeira tentação de Cristo" estreou para assinantes na plataforma de streaming Netflix. No programa, Jesus é surpreendido por uma festa em que é revelado que ele é filho de Deus e fora adotado por José e Maria. Dentre os conteúdos que geraram críticas está Deus retratado como mentiroso e envolvido em um triângulo amoroso com José e Maria, retratada como adúltera, além de sugerir que Jesus teria tido um relacionamento gay.
Deputados da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) começaram, no dia 16 de dezembro, a reunir assinaturas para pedir a abertura de uma CPI. A intenção é apurar suposto crime contra o sentimento religioso cometido pelo grupo Porta dos Fundos. Em vídeo postado no Twitter, os deputados Frederico D'Avila (PSL), Altair Moraes (Republicanos) e Tenente Nascimento (PSL) afirmam que o grupo desdenha da trajetória de Jesus. "E se não respeitam a fé, vão respeitar o peso da lei", completou Moraes.
O requerimento para a instauração da CPI, no entanto, deve ser protocolado só em fevereiro do ano que vem, quando a Alesp volta às atividades depois do recesso parlamentar.
MP do Rio aponta abuso de liberdade de expressão
A promotora Barbara Salomão Spier, do Ministério Público do Rio de Janeiro, deu parecer favorável à suspensão da exibição do especial, após ser consultada em processo que tramita na 16ª Vara Cível do Rio, no dia 18 de dezembro. O programa humorístico está sendo questionado na Justiça por ferir valores cristãos.
Em ação civil pública, a Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura pede, além da retirada do programa, uma indenização de R$ 2 milhões, por danos morais coletivos, "R$ 0,02 por brasileiro que professa a fé católica". Os réus da ação são o Porta dos Fundos Produtora e a Netflix.
Justiça nega pedido de suspensão de especial do Porta dos Fundos
A juíza Adriana Sucena Monteiro Jara Moura, da 16ª Vara Cível do Rio de Janeiro, indeferiu no dia 20 de dezembro o pedido de suspensão da exibição do programa humorístico, assim como a requisição de indenização por danos morais coletivos aos cristão de R$ 2 milhões, feito Associação Centro Dom Bosco de Fé. Cabe recurso da decisão.
Ao avaliar o caso, a juíza entendeu que somente poderia haver a proibição da exibição do programa se houvesse "a prática de ilícito, incitação à violência, discriminação e violação de direitos humanos nos chamados discursos de ódio".
No documento, apesar de o processo ser de âmbito cível, a juíza também opinou sobre a área penal. Para ela, o especial do Porta dos Fundos também não pode ser enquadrado no artigo 208 do Código Penal que proíbe "escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa", sobe pena de detenção e multa.
Atentado à produtora do Porta dos Fundos na véspera do Natal
Na madrugada do dia 24, véspera do Natal, o caso ganhou contornos de crime policial. A produtora do Porta dos Fundos foi alvo de um ataque com bombas incendiárias. Localizado no Humaitá, bairro da zona sul do Rio, o local teve a fachada atingida por coquetéis molotov, por volta de 4 horas. O caso é investigado pela 10ª Delagacia de Polícia (Botafogo), onde foi registrado como crime de explosão e tentativa de homicídio. Um vigilante que estava no imóvel no momento do ataque conseguiu controlar o princípio de incêndio e não houve feridos.
Segundo a Polícia Civil do Rio, pelo menos três pessoas participaram da ação contra o Porta dos Fundos. O atentado não é tratado como terrorismo. "Nos parece que foi um ataque direcionado a uma vítima determinada", explicou o delegado, ao dizer que o caso não é enquadrado na lei antiterror porque ela prevê uma conduta lesiva à organização da sociedade e ao Estado.
Grupo "integralista" assume autoria de ataque
Um vídeo com imagens do ataque foi divulgado no YouTube. Nele, integrantes do grupo que se autodenomina Comando de Insurgência Popular Nacionalista da Grande Família Integralista Brasileira aparecem mascarados e leem um manifesto enquanto imagens do ataque com coquetéis molotov à produtora são exibidas.
No dia 26 de dezembro, a Frente Integralista Brasileira negou qualquer ligação com o atentado. E em nota, diz que desconhece o grupo responsável pelo crime, e ressalta que o estatuto da frente proíbe o uso de máscaras para fins de militância e não descarta a possibilidade de ter sido um "material forjado" com o fim de incriminar os integralistas.
Polícia realiza operação para prender suspeito
A Polícia Civil identificou pelo menos um dos suspeitos do ataque como Eduardo Fauzi Richard Cerquise, de 41 anos. Na terça-feira (31), agentes foram às ruas do Rio tentando cumprir um mandado de prisão contra ele. Fauzi passou a ser considerado foragido desde então.
"O autor identificado sai de um dos veículos durante a fuga e pega um táxi. Foi expedido um mandado de prisão temporária de 30 dias contra ele, que, no decorrer das investigações, pode ser renovado", disse em coletiva de imprensa, o delegado titular da 10ª DP, Marco Aurélio de Paula Ribeiro.
Além de verificar imagens de diversas câmeras de segurança da região, os investigadores chegaram ao acusado a partir de escutas telefônicas autorizadas pela Justiça. Os policiais apreenderam em um dos endereços uma quantia em dinheiro, um simulacro de arma, munição, camisa de entidade filosófico-política e computadores.
Suspeito foge do país um dia antes do mandado de prisão ser expedido
O empresário Eduardo Fauzi fugiu do país e estaria em Moscou, na Rússia, segundo apurou a polícia. De acordo com a GloboNews, ele viajou na tarde de domingo (29) para Paris, um dia antes da expedição do mandado de prisão. Imagens obtidas pela tevê mostram que ele chegou de táxi ao Aeroporto Internacional Tom Jobim, na Zona Norte do Rio. O empresário tem uma namorada que mora em Moscou.
Eduardo Fauzi divulgou na internet, na tarde de quarta-feira (1º), um vídeo em que faz críticas ao grupo Porta dos Fundos. Após classificar os humoristas como "intolerantes", afirma que "quem fala mal do nome de Cristo prega contra o povo brasileiro. Esse é um crime de lesa-pátria. Eles são criminosos, são marginais, são bandidos".
Em meio às investigações, veio à tona a informação de que Fauzi é filiado ao PSL, ex-partido do presidente Jair Bolsonaro. Na quinta-feira (2), o presidente nacional da legenda, Luciano Bivar, informou ao site O Antagonista que o empresário é filiado ao PSL há quase 20 anos ao PSL e que ele será alvo de um processo de expulsão porque o partido não compactua com "nenhum sentimento radical".