A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) está articulando a obstrução de pautas no Congresso para fazer frente à derrubada do marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O movimento deve contar com o apoio parcial de outras bancadas e da oposição. Além de pautas de interesse do setor agropecuário, a FPA também deve encampar uma proposta de emenda que, se aprovada, permitirá ao Congresso rever decisões do STF.
Os parlamentares acreditam que a Corte tem excedido suas funções constitucionais ao decidir sobre assuntos que estão em debate na Câmara e no Senado, passando por cima do Poder Legislativo não apenas no tema da demarcação de terras indígenas, mas em outros, como a descriminalização do aborto e do consumo de drogas – cujos julgamentos já foram iniciados.
Neste cenário de insatisfação com o STF, deputados de outros três segmentos do Congresso já demonstraram apoio ao movimento iniciado pela FPA: a bancada da segurança pública, deputados evangélicos e católicos. O interesse destas duas últimas bancadas é, principalmente, fazer pressão contra o julgamento da ADPF 442, que tenta descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação.
As estratégias de obstrução estão sendo discutidas nesta terça-feira (26), mas a ideia dos parlamentares do agro é fazer pressão para aprovar pautas que deem mais segurança jurídica aos produtores rurais, seja com a aprovação de uma PEC que garante indenização por terras que venham a ser demarcadas ou de um projeto que quer fixar o marco temporal na legislação brasileira.
O presidente da Frente Parlamentar da Segurança Pública, deputado Alberto Fraga (PL-DF), disse à Gazeta do Povo que a bancada vai encampar o movimento do agro.
Membros da Frente Parlamentar Evangélica também devem aderir à pressão contra o Supremo, segundo relatou o deputado Marco Feliciano (PL-SP). “Diferente do STF, nós [deputados] falamos pelo povo. Nós somos os legítimos representantes do povo”, diz o integrante da bancada evangélica. Sobre a possibilidade de que uma eventual obstrução de parlamentares à pauta do Congresso dificulte as votações incluídas pelo Governo e os líderes, o deputado diz que “nós vamos incomodar”.
"Nós não concordamos com a continuidade desse ativismo judicial por parte do STF", disse Diego Garcia (Republicanos-PR), da Frente Parlamentar Católica, que também deve aderir ao movimento.
A oposição ao governo também decidiu, nesta terça-feira (26), que vai entrar "em obstrução com o objetivo de restabelecer as prerrogativas parlamentares e impedir as usurpações de competências sobre temas inegociáveis".
"Contamos com o apoio de todos para que consigamos enfrentar esse momento e esperamos que outros partidos participem conosco", escreveu o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), líder da oposição no Congresso.
Os projetos prioritários para a bancada do agro
Apesar da FPA ainda estar discutindo os detalhes de como atuar para impedir o avanço de temas importantes para o governo na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, uma coisa já é certa: os deputados e senadores que integram a FPA – mais de 350 parlamentares – farão pressão para avançar na tramitação de três propostas que abordam demarcações de terras e outra que pretende conter o anseio do STF por debater temas que são de competência do Legislativo.
De acordo com o segundo vice-presidente da Frente Parlamentar de Agropecuária na Câmara, deputado Evair de Melo (PP-ES), uma das prioridades será a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 48/2023, apresentada pelo senador Dr. Hiran (PP-RR) na semana passada, com apoio de outros 26 senadores, e que busca consolidar o marco temporal no país, com base na Constituição Federal de 1988. A proposta tem como meta evitar conflitos e incertezas que prejudiquem tanto as comunidades indígenas quanto os produtores rurais, segundo justificou o autor.
Outra proposta a ser encampada pela FPA é a PEC 132/2015, relatada pelo deputado Alceu Moreira (MDB/RS), que tramita na Câmara dos Deputados. Ela trata da indenização de terras destinadas à demarcação.
Por fim, a bancada também promete pressão para aprovar no Senado o projeto de lei (PL) 2903/23, que já passou pela Câmara. Nesta quarta (27), ele deve ser votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
Em paralelo, a bancada do agro e a oposição buscarão apoio e assinaturas para uma PEC de autoria do deputado Domingos Sávio (PL-MG), que possibilita ao Congresso Nacional sustar decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), caso três quintos do Plenário da Câmara e do Senado concordem com a medida. O autor da proposta justifica que há hoje um desequilíbrio entre os Três Poderes devido a decisões do STF que extrapolam os limites constitucionais.
STF não esperou Congresso para decidir sobre marco temporal
Na semana passada o plenário do STF derrubou a tese do marco temporal aprovado pela Câmara dos Deputados em maio deste ano, e que estabelecia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, como critério para demarcação de terra indígenas no país.
O Projeto de Lei 2903/2023, que define o marco temporal foi aprovado pela Câmara dos Deputados e está em análise na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal. Apesar disso, a Suprema Corte resolveu decidir sobre o tema.
Logo após o resultado do julgamento, o presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR), concedeu entrevista coletiva à imprensa e afirmou que o Supremo extrapolou o seu papel. "O STF tem se colocado como legislador, usurpando funções do Congresso Nacional. Nós, deputados e senadores, somos os legítimos legisladores. Eu não consigo entender que isso seja acaso. O Congresso precisa ter o direito de exercer o seu papel de legislar", afirmou Lupion.
Estratégia de obstrução pode falhar, mas tem potencial de incomodar governo
O cientista político Elton Gomes, da Universidade Federal do Piauí, avalia que o processo de ativismo judicial no Brasil vem ganhando corpo nos últimos anos e isso incomoda os parlamentares, já que magistrados não são eleitos por voto, e sim indicados politicamente.
Sobre a possibilidade de obstrução da pauta do Congresso, ele pondera, porém, que a prática não costuma ser muito bem sucedida. "Os partidos políticos não gostam de muita disciplina e também não têm muita unidade programática e conteúdo ideológico", alerta.
Elton lembra que outro fator que pode dificultar a obstrução é a recente distribuição de cargos, emendas e benefícios políticos pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o governo conseguiu, com o apoio dos partidos do Centrão, viabilizar uma maioria para Lula de até 350 deputados. O cientista político, porém, avalia que essa maioria é frágil. "Ela tem que ser renegociada votação a votação”.
Por outro lado, o professor Adriano Cerqueira, da Universidade Federal de Ouro Preto, afirma que as queixas dos parlamentares contra o STF podem acabar reunindo a ala mais conservadora de parlamentares, causando problemas para o governo.
“Tem potencial para causar problemas em torno de uma certa normalização das relações que o governo está buscando”, resume.
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF