Grupo cada vez mais influente na política nacional e de tradicional atuação na Câmara dos Deputados, os evangélicos alcançaram neste ano uma expressividade inédita no Senado. Impulsionados pelas últimas eleições, os senadores eleitos por partidos variados estão agora em número maior e as suas bandeiras conservadoras trazem para o seu entorno parlamentares de outras religiões por razões de afinidade temática.
Uma das primeiras conquistas foi a instalação no Senado da Frente Parlamentar Evangélica, em 15 de março, presidida por Carlos Viana (Podemos-MG), e com a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) como vice-presidente. Com 17 integrantes, dos quais somente oito são de fato pertencentes a confissões cristãs protestantes, a frente tem o propósito comum de preservar a liberdade religiosa no Brasil e promover políticas públicas de alcance social.
A luta contra a ideologia de gênero, o aborto e a legalização das drogas e dos jogos de azar são algumas das questões da chamada "agenda de costumes" que atraem para a bancada senadores de outras religiões, como o espírita Eduardo Girão (Novo-CE) e os católicos Soraya Thronicke (União Brasil-MS) e Jorge Kajuru (PSB-GO). O grupo também promete fiscalizar as ações do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), principalmente no que diz respeito às portarias ministeriais sobre os temas já citados.
“A frente parlamentar evangélica não é partidária. Seu objetivo principal não é fazer oposição a Lula, mas, sim, lutar pelas causas que acredita e defender seus interesses e valores”, disse Viana, que preside a bancada, à Gazeta do Povo.
Segundo observadores da política no Congresso, o movimento evangélico no Senado é um fator novo que trará consequências nas decisões da Casa. Levantamento da Genial/Quaest divulgado no começo do mês mostrou que os parlamentares conservadores são os que têm maior influência nas redes sociais. E dos 10 senadores mais influentes, seis são da frente evangélica: Cleitinho, Flávio Bolsonaro, Magno Malta, Damares, Marcos do Val e Rogério Marinho.
Mas o peso do grupo no Senado ainda está longe de alcançar o nível de consolidação verificado há muito tempo na Câmara, onde a frente parlamentar evangélica existe desde 2003 e ocorrem até cultos semanais nas suas dependências. Naquela época eram apenas 20 deputados e hoje passam de 200.
Conforme diz o seu manifesto de instalação, a frente evangélica no Senado tem compromisso com o respeito a todas as crenças, dentro do princípio do Estado laico, e um dos seus objetivos é atuar nas medidas assistencialistas para garantir dignidade social a pessoas em situações de vulnerabilidade. Para a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), aliada de Lula, a frente parlamentar deve ter o foco nas minorias sociais.
Já Viana afirma que a maioria dos públicos evangélico e de direita têm resistência ao PT. Ainda assim, ele aposta na abertura de canais de diálogo com o governo.
“Nosso trabalho vai muito além dos nossos mandatos, da elaboração de leis e das votações importantes. Estamos aqui representando a maior parte dos brasileiros que têm crenças e princípios e que querem ver a harmonia e o respeito cada vez maiores entre todas as classes sociais e regiões”, destaca Viana.
Frente promete fiscalizar portarias de ministérios
A expectativa de Viana e parlamentares da frente é conseguir completar um ciclo congressual de modo que projetos de interesse dos evangélicos não mais fiquem parados no Senado. Além disso, eles prometem fiscalizar ações de governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que interfiram em questões como liberação de drogas e aborto, quase sempre por meio de portarias de ministérios. “Vamos acompanhar tudo isso com lupa, inclusive nas comissões da Câmara e do Senado”, avisa o presidente da frente.
Segundo ele, a ascensão política dos evangélicos nos últimos 10 anos foi justamente resultado da reação desse público contra iniciativas legislativas e de governo que afrontavam posturas das igrejas, a exemplo da defesa de taxação de templos no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e a criminalização de pastores que se recusassem celebrar casamentos homoafetivos.
Além da pauta de costumes, outra conexão do colegiado evangélico do Senado com outros movimentos no Congresso está ligada às relações do Brasil com Israel. Nesse sentido, foi instalada em 28 de fevereiro, com atuação de senadores evangélicos, a frente parlamentar mista Brasil-Israel, dedicada ao desenvolvimento das relações bilaterais com aquele país. O grupo parlamentar conta com 50 parlamentares e também é presidido por Carlos Viana. Entre os assuntos que tratam está o intercâmbio de tecnologias nas áreas de agricultura, segurança e saúde.
Governo tenta aproximação estratégica com igrejas
No evento evangélico da Convenção Nacional das Assembleias de Deus Madureira (Conamad), que ocorreu em Brasília de 19 a 22 de abril, o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e os ministros Wellington Dias (Desenvolvimento Social) e Alexandre Padilha (Relações Institucionais) marcaram presença, em busca de maior aproximação com as igrejas pentecostais. Eles participaram de uma reunião na sexta-feira (21) juntamente com a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), apoiadora e ex-ministra do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil).
Alckmin postou fotos do evento e mencionou Damares em seu perfil no Instagram, o que foi considerado um aceno ao público evangélico.
Analistas ouvidos pela Gazeta do Povo também apontam interesse do governo em buscar o apoio do Republicanos, partido da senadora e ligado ao bispo Edir Macedo, da Igreja Universal. Segundo pesquisa do instituto PoderData, divulgada em 5 de abril, a comunidade evangélica não mostra apoio expressivo a Lula, com apenas 31% de aprovação, enquanto a aprovação entre católicos é de 58% – a margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.
No dia anterior, André Mendonça, ministro indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao Supremo Tribunal Federal (STF), falou aos presentes. O evento reuniu 8 mil pastores-presidentes, que representam 36 mil igrejas em todo o país. O organizador do Conamad, Samuel Ferreira, foi um apoiador de Bolsonaro durante a corrida eleitoral.
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