As manifestações que ocorrem desde o último fim de semana, que têm colocado manifestantes pró e contra o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas ruas ao mesmo tempo, acendem um alerta em relação a atos de confronto e vandalismo e trazem de volta a tática dos black blocs para o cenário brasileiro. As manifestações pró-governo já vêm acontecendo desde março em várias cidades do país. Desde domingo (31), várias cidades do país também têm registrado atos contra o governo e a agenda deve se intensificar nos próximos dias.
Segundo o jornal Valor Econômico, as forças de segurança federal e dos estados estão preocupadas com o ressurgimento dos black blocs em manifestações no Brasil. No próximo fim de semana, há manifestações pró e contra o presidente agendadas em Brasília e há um receio das forças de segurança de que ocorra violência nos atos.
O site O Antagonista afirma que a avaliação na cúpula do Exército é que manifestações com atos de vandalismo e confronto devem ser contidos pelas forças de segurança dos estados. Mas o Exército não descarta intervir caso a situação fuja do controle.
A manifestação que terminou em quebra-quebra
A manifestação em Curitiba, chamada pelas redes sociais, começou nesta segunda-feira (1) por volta das 18 horas no centro da cidade. O grupo “antifa”, que utiliza símbolos anarquistas (bandeira preta) e socialistas (bandeira vermelha), ambos de características não democráticas, carregava faixas com frases de combate ao racismo e ao fascismo.
O ato remete aos protestos que já duram uma semana nos Estados Unidos contra a morte de George Floyd, um homem negro de 46 anos, por um policial branco na cidade de Minneapolis. Por lá, os protestos também têm descambado para a violência e confronto entre policiais e manifestantes em várias cidades.
Durante o ato em Curitiba, os manifestantes queimaram uma bandeira do Brasil em frente ao Palácio Iguaçu, sede do governo estadual do Paraná, o que é classificado como crime. Vídeos nas redes sociais mostram duas faces do protesto: movimentos pacíficos de manifestantes, que gritavam palavras de ordem contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido); e momentos de depredação. Também há vídeos que mostram a ação da Polícia Militar (PM) contra manifestantes.
Durante uma caminhada, uma parte dos manifestantes depredou prédios públicos e particulares, incluindo um prédio do Tribunal de Justiça do estado. Em nota, a prefeitura de Curitiba informou que, em equipamentos públicos do município, houve registro de danos em algumas estações-tubo na região do Centro Cívico e pontos de mobiliário urbano na Praça Tiradentes e na Travessa Nestor de Castro.
Em coletiva de imprensa realizada na noite de segunda-feira (2), o subcomandante geral da polícia Militar do Paraná, coronel Antônio Carlos de Morais, disse que a corporação agiu “com a firmeza necessária” diante de uma ação violenta por parte dos manifestantes.
Por meio de nota, a organização do ato afirma que os manifestantes se comportaram de maneira ordeira “em defesa da democracia e contra o racismo”. “Infelizmente, no final do ato, em uma dispersão de alguns poucos, houve vandalismo contra o patrimônio público. O que, ao nosso ver, é muito estranho e suspeito e representa a presença organizada de infiltrados que desejam a criminalização do movimento”, diz a nota.
Tática de depredação é usada por black blocs
A depredação de prédios e o confronto com a polícia em manifestações de rua é uma tática recorrente de guerrilha urbana utilizada por black blocs. O termo foi usado pela primeira vez na Alemanha, na década de 1980, para se referir a grupos de pessoas que se organizavam para enfrentar a repressão policial.
Desde a década de 1980, a ação de black blocs foi registrada em vários países. Nos Estados Unidos, a tática black bloc começou a ser usada de forma significativa em 1991, em manifestações contra a Guerra do Golfo, em Washington. No final da década de 1990, os black blocs ganharam mais notoriedade e passaram a adotar símbolos capitalistas como os maiores alvos.
Manifestações com a presença de black blocs foram registradas nos anos seguintes em diversas partes do mundo, como em 2000, nos EUA; em 2001, em Gotemburgo, na Suécia, e em Gênova, na Itália; em 2007, na Alemanha; em 2009, em Estrasburgo, na França; em 2010, em Toronto, no Canadá, e por aí vai.
No Brasil, as primeiras ações próximas à tática black bloc foram identificadas em 2000 e 2001, nos Dias de Ação Global, organizadas pela Ação Global dos Povos. Mas a estratégia ganhou notoriedade no país a partir das manifestações de junho de 2013.
Black blocs são vistos com preocupação
Parte dos apoiadores do presidente Bolsonaro cita o artigo 142 da Constituição Federal para criar um argumento de que não seria ilegal um decreto de "intervenção militar" para conter o que consideram excessos do Supremo Tribunal Federal (STF). Recentes decisões do STF têm elevado o clima de tensão entre o Planalto e o Supremo e os militares têm sido observados com atenção nesse cenário.
A violência em manifestações contra o governo também pode aumentar a tensão e se tornar combustível para a tentativa de aplicação da versão bolsonarista do artigo 142. O texto do artigo estabelece que as Forças Armadas, além de atuarem na defesa da Pátria, podem ser chamadas, por iniciativa dos Poderes da República, para garantia "da lei e da ordem".
No entanto, na avaliação de juristas, o texto constitucional é claro sobre as atribuições de Executivo, do Congresso e do STF, de modo que não cabe ao presidente a palavra final sobre o que é lei e ordem.
Para especialistas, o esforço em disseminar esta interpretação do artigo é uma tentativa de dar um "verniz jurídico" a uma pretensão golpista. "No fundo, é para dizer que o presidente faz o que quer. Isso é absolutamente contrário à Constituição", disse Diego Werneck, professor de Direito do Insper.
Nem toda confusão é causada por black blocs
Nem toda confusão nos atos, porém, pode ser atribuída a grupos black blocs. Nos atos realizados desde o fim de semana em diversas cidades do país, foram registrados confrontos entre manifestantes pró e contra o governo, que terminaram em confusão e intervenção da polícia.
Em São Paulo, membros de torcidas organizadas de Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos protestavam na Avenida Paulista contra Bolsonaro. Enquanto isso, apoiadores do presidente se manifestavam em outro ponto da Paulista.
Houve confusão em dois momentos – em ambos, manifestantes de um grupo tentavam furar o bloqueio para provocar os integrantes do outro grupo. A PM atuou para dispersar os atos. Os manifestantes contra o governo deixaram o local. Apoiadores de Bolsonaro continuaram na Paulista.
Na internet, circula um vídeo que mostra a PM escoltando uma manifestante pró-Bolsonaro que estava com um taco de beisebol durante o ato e provocava manifestantes contra o governo.
O secretário de Segurança Pública de São Paulo, João Camilo Pires de Campos, elogiou a ação do policial. "A atitude do policial merece, inicialmente, um elogio. Ele fez o que se prevê no emprego progressivo da força. Ele a retirou de uma discussão somente com diálogo e conseguiu isso. Primeiro se conversa, depois o emprego mediano e depois a força. Contudo, como você bem disse, o taco, dependendo das circunstâncias é uma arma, como uma panela. Deveria ter sido retirado, vamos orientar novamente", disse em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes.
Por outro lado, uma foto que rodou as redes sociais mostra diversos agressores de preto chutando um manifestante caído que usava uma camisa verde e amarela.
No Rio, também houve manifestações pró e contra Bolsonaro em Copacabana. O deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), que acompanhava a manifestação pró-governo, transmitiu nas redes sociais um vídeo pregando repressão a movimentos contra Bolsonaro.
“Vocês vão pegar um ‘polícia’ zangado no meio da multidão, levar um [tiro] no meio da caixa do peito e chamar a gente de truculento. Eu estou torcendo pra isso. Quem sabe não seja eu o sortudo. Não adianta nem falar que foi homicídio. Vai ser legítima defesa”, ameaçou o deputado.
Também há um vídeo de uma conversa com um policial que prometeu queimar a faixa de manifestantes contra Bolsonaro com os dizeres “Democracia Rubro-Negra”. Daniel Silveira diz ao policial que “queria ir lá pegar um”, em referência ao grupo de opositores do governo. O PM responde: “Não, meus amigos estão ali. Já mandei eles irem lá queimar aquela bandeira”.
Em nota, a PM do Rio de Janeiro informou a atitude do policial “não reflete a postura da corporação, que se mantém imparcial, sempre zelando pela democracia”.
Em Porto Alegre também houve princípio de confusão entre manifestantes dos dois lados. As manifestações pró e contra Bolsonaro ocorreram nos arredores do Comando Militar do Sul (CMS), no Centro Histórico da cidade. Os dois grupos trocaram provocações, cercados por um aparato da PM que fazia a segurança no local.
Mais protestos marcados para o próximo fim de semana
O próximo fim de semana deve ser marcado por mais atos a favor e contra o governo. Em Brasília, há uma manifestação contra Bolsonaro agendada para o domingo (7) na Esplanada dos Ministérios. O local é onde tem ocorrido manifestações pró-governo que pedem o fechamento do Congresso e do STF. O presidente participa dos atos.
Nesta segunda-feira (1), o presidente orientou seus apoiadores a não realizarem manifestações no mesmo dia dos movimentos contrários ao governo. "Olha, estão marcando domingo um movimento, né? Deixa eles sozinhos domingo. Eu não coordeno nada, não sou dono de grupo. Não participo de nada. Só vou prestigiar vocês, que estão me apoiando, fazem um movimento limpo, decente, pela democracia, pela lei e pela ordem. Eu apenas compareço", disse, em frente ao Palácio Alvorada.
"Não conheço praticamente ninguém destes grupos. Eu acho que já que eles marcaram para domingo, deixa eles domingo lá", completou Bolsonaro. Também há atos previstos em Porto Alegre, Rio de Janeiro e Manaus.
Protestos nos EUA impulsionam manifestações no Brasil
Os protestos no Brasil se intensificam. Além das pautas pró e contra o governo, um lado se inspiram nas manifestações anti racistas realizadas há uma semana nos Estados Unidos, que também tem participação de "antifa", movimento com pautas de esquerda. Os atos nos EUA começaram com a morte de George Floyd, negro, que foi morto na semana passada sob custódia da polícia depois que um policial o asfixiou por mais de oito minutos durante uma abordagem.
O policial responsável pela abordagem já foi preso, mas as manifestações continuam a se espalhar pelos Estados Unidos e já chegaram a outros países, como Brasil, Canadá e países da Europa.
Agentes do serviço secreto dos Estados Unidos levaram o presidente americano, Donald Trump, a um bunker na Casa Branca na noite de sexta-feira (29), enquanto centenas de manifestantes se reuniam no lado de fora do prédio, com alguns atirando pedras e enfrentando policiais. A decisão dos agentes ressaltou o clima dentro da Casa Branca, onde os gritos de manifestantes puderam ser ouvidos durante todo o fim de semana e agentes tiveram dificuldade para conter as multidões. As manifestações causaram um dos alertas mais altos no complexo da Casa Branca desde os ataques de 11 de setembro de 2001.
Trump afirmou que está tomando ação presidencial imediata para encerrar a violência e que vai mobilizar recursos federais para colocar um fim nos saques e tumultos registrados nas manifestações. Em pronunciamento nesta segunda-feira (1), Trump ainda disse que "recomendou fortemente" que os governadores dos estados americanos mobilizassem a Guarda Nacional "em números suficientes para dominar as ruas".
O presidente americano alertou que se as cidades e estados se recusarem a tomar medidas para conter os tumultos, irá mobilizar os militares.
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