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O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) teve de virar a chave para ajudar a socorrer grandes empresas que estão sendo afetadas pela crise causada pela pandemia do coronavírus. O banco deixou momentaneamente de lado sua estratégia de vender bilhões de reais em participações acionárias e voltou a desenhar programas de socorros para companhias em dificuldades.
O programa que está sendo elaborado pelo BNDES vai beneficiar empresas aéreas e dos setores de energia elétrica, automotivo, sucroalcooleiro e varejo não alimentício e não farmacêutico, os mais afetados pela queda de demanda. O socorro deverá ser feito na forma de empréstimo, em modelo ainda sendo desenhado, e em consórcio com bancos privados. Não deverá haver subsídio público, e sim garantia da União aos empréstimos.
O presidente do BNDES, Gustavo Montezano, chegou a afirmar em coletiva de imprensa virtual em março que a linha de crédito estaria disponível para as empresas em abril. Até o momento, o programa ainda está em desenvolvimento e com previsão de lançamento para maio.
Banco quer reforçar seu caixa...
Para conseguir colocar o plano em pé e também para poder emprestar dinheiro a pequenas, médias e grande empresas, o BNDES quer adotar algumas medidas para reforçar seu caixa em 2020 e 2021. O banco quer reduzir o pagamento de dividendos ao Tesouro Nacional, não efetivar o pré-pagamento de dívidas contraídas com a União e tomar empréstimo no valor de US$ 5 bilhões junto a agências multilaterais.
As informações constam de ofício obtido pela Gazeta do Povo. O documento foi encaminhado por Gustavo Montezano e Marcelo Serfaty, presidente do conselho do banco, ao ministro da Economia, Paulo Guedes. No ofício, eles pedem a anuência da pasta para realizar as ações.
- Reduzindo pagamento de dividendos ao Tesouro
A intenção é ao longo de 2020 e 2021 repassar ao Tesouro Nacional somente a porcentagem mínima de dividendos (parcela do lucro que é distribuída ao acionista) exigida pela legislação. Essa parcela é de 25%. No ano passado, por exemplo, o banco repassou imediatamente 45% do lucro ao Tesouro, ou seja, R$ 7,9 bilhões, e ainda criou uma reserva de 2,2 bilhões que podem ser transferidos a qualquer momento por decisão do conselho de administração.
Esse valor recebido pelo governo foi fundamental no ano passado para que a União fechasse o ano com um déficit menor do que o previsto. O BNDES foi a estatal que mais pagou dividendos à União em 2019. Para este ano, o banco esperava antes da epidemia aumentar os seus repasses para 60% do lucro.
- 2. Suspendendo devolução de recursos ao Tesouro
O BNDES também vinha adotando a estratégia de pagar antecipadamente as dívidas que possui junto ao Tesouro Nacional. O ministro Paulo Guedes cobrava a devolução desses recursos, no que ele chama de “despedalar os bancos públicos”, já que os recursos foram emprestados durante os governos petistas para que o banco financiasse empresas chamadas de “campeãs nacionais”.
No ano passado, o banco pagou antecipadamente R$ 100 bilhões ao Tesouro, totalizando R$ 123 bilhões em devoluções. O dinheiro vai para abater a dívida pública, um dos objetivos da equipe econômica.
Só que, diante da necessidade de ter dinheiro para o programa de socorro as empresas afetadas pela crise do coronavírus, o banco quer suspender o pagamento antecipado das suas dívidas com a União durante os anos de 2020 e 2021.
- 3. Tomando empréstimo bilionário
Além de suspender o pagamento antecipado das dívidas e reduzir os repasses de dividendos, o BNDES estima que vai precisar fazer um empréstimo de US$ 5 bilhões junto a organismos multilaterais para reforçar seu caixa.
Para isso, no ofício, Montezano e Serfaty pedem a anuência de Guedes para fazer o empréstimo com garantia da União. Créditos tomados com a União de garantidora são mais baratos. Caso o BNDES não pague o empréstimo, a União ficará responsável por quitar a dívida.
Motivos
Montezano e Serfay alegam que os três pedidos são necessários porque o banco, para fazer frente às necessidades da economia em razão da pandemia do novo coronavírus, teve seu fluxo de caixa prejudicado.
Eles lembram que o BNDES suspendeu o pagamento de dívidas que pessoas jurídicas contraíram com o banco e transferiu R$ 21,5 bilhões do antigo Fundo PIS/Pasep para o FGTS.
Ressaltam, ainda, incertezas sobre o comportamento do saldo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o que que pode requerer devoluções extraordinárias por parte do BNDES, e dificuldade na execução da política de desinvestimento da carteira de renda variável que vinha sendo operacionalizada pelo braço de investimentos do banco, o BNDEPar.
“Dadas as vigentes perspectivas econômicas, (...) reputa-se premente modificar o planejamento financeiro que vinha sendo elaborado pelo BNDES até então, no sentido de antecipar o pagamento de empréstimos contraídos junto ao Tesouro Nacional, assim como de distribuir dividendos complementares (em caso de resultado financeiro positivo) além do mínimo previsto no Estatuto Social, até dezembro de 2021”, escrevem os executivos.
Eles explicam, também, que o banco precisa captar recursos para conseguir fazer as ações necessárias, mas que as agências multilaterais têm exigido a apresentação de garantia soberana para liberar o empréstimo.
Os pedidos do BNDES estão em análise pelo Ministério da Economia.
Em 2019, banco liderou venda de ativos
No ano passado, o primeiro sob a gestão Bolsonaro, o BNDES adotou a política de se desfazer da maior parte das ações que possui em empresas diversas. A diretriz é que não faz sentido o banco ser sócio de diversas empresas, enquanto falta dinheiro para saneamento e outros projetos sociais. Em 2019, o banco arrecadou R$ 16,5 bilhões com a venda de participações.
A venda de ações seria muito maior em 2020, se não fosse o coronavírus. Só no primeiro trimestre deste ano, o banco arrecadou R$ 25 bilhões com as ações que tinha na Petrobras, Marfrig e Light. Somente com a venda das ações da Petrobras, o banco movimentou R$ 23 bilhões, a maior oferta de ações na bolsa brasileira dos últimos dez anos.