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Entrevista exclusiva

Mudança no Bolsa Família e pente-fino do BPC: Osmar Terra fala sobre prioridades da Cidadania

Bolsa Família, BPC e Criança Feliz: ministro Osmar Terra fala sobre os principais programas da pasta
Bolsa Família, BPC e Criança Feliz: ministro Osmar Terra fala sobre os principais programas da pasta (Foto: Mauro Vieira/Ministério da Cidadania)

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Insatisfeito com a modelagem do Bolsa Família, carro-chefe dos programas de assistência social do governo federal, o Ministério da Cidadania vai remodelá-lo ao longo de 2020. “Nós queremos que o Bolsa Família, pouco a pouco, se transforme em um programa de geração de emprego e renda, num programa que ajuda a população de sair da pobreza e não só transferência de renda. É aquela história de ensinar a pescar e não ficar só dando peixe, né”, disse o ministro Osmar Terra em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.

Com ampla área de atuação e orçamento enxuto, de R$ 97 bilhões para o ano todo, a pasta vive o desafio de executar os programas-chave da área social do governo federal – o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC) – em tempos de formação de fila e sem margem para gastar mais. Só esses dois programas custam R$ 90 bilhões anuais, e há tempos não recebem recursos adicionais. Por isso, a aposta do ministro para fazer mais com menos é a realização de pentes-finos no Bolsa Família e BPC, para que a eventual sobra de dinheiro permita implementar mudanças.

Apesar disso, Terra é otimista para as novas ações da pasta neste ano e não sente a pressão por uma marca social da gestão Bolsonaro. “O maior programa social que podemos ter é o emprego”, disse. Para 2020, o ministro conta que vão investir em uma nova estratégia, que é o Município Mais Cidadão.

A iniciativa vai premiar os municípios que mais avancem na área social e que ampliem, proporcionalmente, a quantidade de jovens do Bolsa Família com curso técnico, crianças no contraturno escolar, população atendida para tratamento de dependência química e outros.

“Em junho, teremos a entrega de prêmio no Palácio [do Planalto], com a presença do presidente, para os municípios que mais se destacarem. A lógica disso é pegar os principais programas e fazer eles acontecerem no número maior possível de municípios e, com isso, melhorar a qualidade de vida da população lá nesses municípios”, declarou.

Terra, que conversou com a Gazeta do Povo por telefone na quinta-feira (6), falou sobre Bolsa Família, pente-fino nos programas sociais e o Criança Feliz, que prioriza as ações voltadas à primeira infância.

A transformação do Bolsa Família

“Nós queremos que o Bolsa Família, pouco a pouco, se transforme em um programa de geração de emprego e renda, num programa que ajuda a população de sair da pobreza e não só transferência de renda. É aquela história de ensinar a pescar e não ficar só dando peixe, né. A gente vai trabalhar muito com cursos técnicos para jovens do Bolsa Família e tem uma parceria com o Sistema S, mas vamos também tem uma parceria direta com as empresas.

Tem um estudo que depende também de fontes de recurso para avançar. O que nós estamos agora é vendo uma maneira gradual de avançar nessa direção de ter programas robustos e estímulos para as pessoas terem emprego e renda, microcrédito. Vai ter um pacotão que já está começando a ser utilizado. E que eu acredito que vai reduzir bastante.

Outra coisa importante é trabalhar a questão da primeira infância, que é outra forma de dentro do Bolsa Família para reduzir desigualdades. Damos um apoio maior ao desenvolvimento infantil nos primeiros três anos de vida, com apoio e acompanhamento em casa dessas crianças. O programa Criança Feliz tem um milhão de crianças sendo acompanhadas em casa toda semana e esperamos chegar a dois milhões esse ano, é a meta.”

Combate às fraudes no Bolsa Família e BPC

“Precisamos cortar fraude. Como [o Bolsa Família] é um programa muito descentralizado, na base municipal, é difícil daqui controlar o detalhe. 90% dos municípios agem corretamente, mas sempre tem uns 10% tentando burlar alguma coisa, não tem renda que se enquadre.

Estamos desenvolvendo um programa muito forte, cada vez com mais tecnologia, de controle, de batimento das informações. E só vamos liberar aquela família para entrar no Bolsa Família depois que tiver batido todas as informações em nível local, estadual e federal. Isso a gente, com a tecnologia de hoje, faz isso em menos de um mês.

Antes a pessoa entrava, declarava uma renda e já começava a receber, e a pessoa ficava recebendo um ano de Bolsa Família sem ter necessidade nenhuma dele. Agora a gente vai adiantar o cruzamento de dados e informações, responsabilizar mais as pessoas que fazem o cadastro para prevenir e inibir esse tipo de relação, que às vezes tem até conteúdo eleitoral político. É uma ação que estamos aperfeiçoando.

Estamos criando um comitê, que vai ter vários órgãos do governo, inclusive ministério da Justiça e Polícia Federal, para agir. Vamos ter uma expectativa do tamanho que deve ser o Bolsa Família em cada município com dados do IBGE. Se esse município superar, ultrapassar muito essa expectativa, nós vamos fazer uma investigação e vamos responsabilizar se tiver alguém agindo errado.

A partir dessas medidas, acredito que teremos recursos para ir gradualmente melhorando o programa na questão de premiar, estimular o protagonismo das pessoas em ter sua própria renda, para poderem sair do programa pelas próprias pernas.”

Novos estímulos para beneficiários do Bolsa Família

“Outra medida é estimular também as crianças. Hoje, a família ganha se a criança tiver frequência na escola, mas isso não significa uma melhor aprendizagem. Ter presença é básico, mas para criança pode ter a presença de 80% de frequência e estar há cinco anos na mesma série. Nós vamos procurar estimular, dar prêmios para as crianças que passam de ano com a nota boa, acima de sete, prêmio em dinheiro para família, estimular de várias formas.

A primeira infância é um programa de longo prazo. Mas o programa para gerar emprego e renda agora, ele é um programa em parceria com o Sistema S. Nós estamos fechando uma grande parceria para dois milhões de jovens do Bolsa Família, entre 18 e 29 anos, focalizar. Temos quatro milhões de jovens que não trabalham nem estudam dentro do Bolsa Família, o que é uma tragédia por si só. Esses quatro milhões são jovens que, se não trabalham, não estudam e vivem em uma família extremamente pobre, qual é o futuro deles? São exército de reserva do crime organizado. Nós temos que tirar esses jovens dessa sina, desse destino. Aí são cursos em grande escala, oferta de curso para microcrédito, também com assessoria do Sistema S e Sebrae. A gente tem dinheiro para microcrédito já no Banco Central, R$ 4,7 bilhões. Vai ser um mutirão, já estamos começando, mas vamos intensificar.”

Orçamento enxuto para os programas sociais

“No nosso orçamento, temos R$ 90 bilhões que são Bolsa Família e BPC. O BPC é o dobro do Bolsa Família, um é R$ 60 bilhões, outro é R$ 30 – e com o 13.º vai a R$ 32,5 bilhões, mais ou menos. Nunca se teve um pente-fino nesses registros. Do Bolsa Família nós estamos fazendo e agora vamos começar a fazer do BPC.

O BPC se dá quando a pessoa é incapaz de trabalhar, de ter seu próprio sustento, pode ser uma deficiência física ou mental. Mas quantas pessoas podem estar ganhando o BPC sem ter uma incapacidade? Às vezes a pessoa perdeu um dedo, está de cadeira de rodas, o que não significa que não possa trabalhar. Vamos ter um grande mutirão de perícia e acredito que desse mutirão, só nessas duas áreas, eu acredito que já se pode ter um recurso, sem mexer no orçamento, para começar a implementar as mudanças. Nós não vamos fazer todas, mas dá para começar a implementar gradualmente as mudanças no Bolsa Família.”

A fila de espera do Bolsa Família

“Eu fui o ministro que zerou a fila. Sempre teve a fila. Quando fui ministro no governo anterior [gestão de Michel Temer], no ano de 2017 eu zerei a fila. Ficou o ano de 2018 zerada. Ficou zerada no começo do governo Bolsonaro e depois aumentou um pouco porque aumentou uma demanda. Essa demanda não quer dizer que essas pessoas fiquem privadas do Bolsa Família, elas levam um pouco mais de tempo para entrar. Em vez de entrar em 40 dias, elas podem entrar em dois meses, coisa assim. Então não é uma fila, não é uma coisa que reflita a incapacidade dessas pessoas entrarem e saírem.

Nós não temos orçamento infinito. Temos que ver o que está gerando, as causas de aumentar sazonalmente, porque aumenta e porque não aumenta. Pode ser por causa da crise? Pode. Mas, no período do PT, a economia até 2014, porque daí começou a afundar no governo Dilma, mas até ali a economia estava indo bem, gerando emprego, renda. E mesmo assim tinha uma fila muito maior do que a fila que tem hoje. Isso ninguém fala. Chegamos a ter meses com dois milhões de pessoas na fila de espera no governo Dilma na fase de crescimento econômico ou pelo menos que não tinha essa recessão que tem hoje.

Então, tem um ajuste que precisa ser feito. O pente-fino tem que funcionar mais. Tem que ficar no Bolsa Família quem realmente precisa do Bolsa Família, não pode ser um programa eleitoral, de botar gente para dentro para ganhar voto. Ele tem que ser um programa que atenda à necessidade da sociedade.”

O 13.º do Bolsa Família

“Não havia previsão [para o pagamento do 13.º do Bolsa Família] no orçamento de 2019, que é feito em 2018, para o pagamento do 13.º. Então a medida provisória resolveu uma questão legal. A partir de agora, essa questão vai se sistematizar, talvez seja até por uma nova medida provisória, mas vai se sistematizar. O pagamento do 13.º está garantido, não vai faltar. Vai ter todo ano.”

A agenda social da Câmara

“Se a Câmara quiser contribuir, pode contribuir, não tem problema nenhum. O que eu vejo é que a Câmara está propondo um programa que aumenta em R$ 15 bilhões o custo do Bolsa Família. Aí é difícil. Enquanto o país não estiver recuperado dessa recessão, dessa crise econômica, é difícil você implantar um programa assim. Por isso estamos tentando ver com o pente fino, e ações que estamos tentando fazer, sem aumentar praticamente o orçamento, uma maneira de otimizar quem realmente precisa do programa.

Toda essa parceria com o Sistema S, é tudo gratuito para nós, não vai ter custo. Isso aí é em função de um acordo feito com o Sistema S de não ter cortes. O ministro Paulo Guedes estava pensando em fazer um corte grande, de 50% nos valores que são recolhidos para o Sistema S, e nós estamos negociando quem em vez de fazer esse corte, uma parte do que seria o corte será utilizada como contribuição do Sistema S para melhorar a qualidade do Bolsa Família. Então isso não tem custo.”

Ampliação do Criança Feliz

“Temos orçamento para dobrar o tamanho do Criança Feliz esse ano e aí preparar o orçamento para continuar aumentando. Nós queremos chegar ao total das crianças de 0 a 3 anos do Bolsa Família, que são 3,2 milhões de crianças estimadas. Nós estamos com praticamente um milhão de crianças sendo acompanhadas em casa toda semana. É o maior programa do mundo, por isso ganhamos o prêmio mundial da cúpula de educação e inovação, em Doha no Catar.

A partir daí o programa tem vida própria: ele tem apoio, tem respaldo institucional, ele é prioridade do governo nos projetos de longo prazo. A prioridade desse governo é a primeira infância. Não vai faltar dinheiro e não é muito dinheiro, é um recurso bem menor que uma parcela mensal do Bolsa Família para fazer isso andar.”

Pressão pela marca social da gestão Bolsonaro

“O maior programa social que podemos ter é o emprego, é aumentar o número de empregos. Isso não depende do nosso ministério, depende do Ministério da Economia, que está avançando, diminuindo o desemprego, melhorando o desenvolvimento do país. Esse legado o presidente Bolsonaro vai deixar ao natural, o país estará em outro patamar de desenvolvimento, com muito maior número de empregos, oferta de emprego, geração de renda e desenvolvimento tecnológico. O Brasil vai entrar numa nova era, está entrando em uma nova era. Não há essa preocupação, uma obsessão do governo, de deixar essa marca. A marca dele vai ser diminuir o número de pobres. No governo do PT só aumentou o número de pobres, nunca diminuiu. Em 2005, tinha 5 milhões de famílias na pobreza extrema e em 2015, quando era governo Dilma ainda, tinha 15 milhões de famílias na pobreza extrema. Saiu de 5 para 15 milhões de famílias. Nós temos que reduzir isso, mas não tirando as famílias do programa à força, mas é fazendo com que eles tenham chance de emprego, de ter o protagonismo para sair da pobreza, não ficar só passivamente recebendo transferência de recursos.”

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