Ainda em campanha, Jair Bolsonaro prometeu que pagaria um 13.º salário para os beneficiários do Bolsa Família. O compromisso foi reforçado quando o governo completou 100 dias, mas, com o bloqueio de verbas do Orçamento, ainda não se sabe de onde sairá o dinheiro para arcar com a despesa extra neste ano. Para 2020, a situação não é mais animadora. O programa terá à disposição a mesma verba que tem hoje, sem correção da inflação, com duas diferenças: atenderá a menos famílias e terá um “salário” a mais para bancar.
O teto de gastos baixou mais a régua orçamentária, que sofre com o engessamento provocado pela expansão das despesas obrigatórias, o que afeta várias áreas. Não foi diferente com o Bolsa Família. O projeto de lei orçamentária (PLOA) para 2020 prevê que o custo total do programa será de R$ 30,04 bilhões. O governo já garante de saída R$ 21,04 bilhões para a execução do programa. Mas, da mesma forma que a gestão de Michel Temer (MDB) fez para não descumprir a regra de ouro, no ano que vem será preciso pedir um crédito suplementar de R$ 9 bilhões ao Congresso para garantir a execução do programa. A regra de ouro impede que o governo contraia dívidas para pagar despesas correntes, como salários e benefícios sociais.
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O orçamento total para o Bolsa Família em 2019 era de R$ 30,08 bilhões, em valores não corrigidos pela inflação. Inicialmente, o governo Temer – que elaborou o orçamento deste ano – chegou a condicionar R$ 15 bilhões da verba do programa à aprovação de crédito suplementar pelo Congresso, mas emendas parlamentares reduziram esse valor para R$ 6,5 bilhões. O valor, aprovado em junho, garante a execução dos pagamentos regulares do programa em 2019, mas não inclui o montante necessário para instituir um 13.º salário, estimado em ao menos R$ 2,5 bilhões.
Menos dinheiro, menos famílias
Na mensagem presidencial que acompanha o PLOA, o governo estima que em 2020 o programa atenda a 13,2 milhões de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza. Hoje estão aptas a receber o benefício as famílias com renda mensal per capita inferior a R$ 89 (extrema pobreza) ou de até R$ 178 (pobreza). Há pagamento complementar para crianças, adolescentes e gestantes.
A quantidade de famílias que – pela estimativa do governo – receberá o Bolsa Família em 2020 é inferior à deste ano. Nos oito primeiros meses de 2019, a média mensal de famílias atendidas pelo programa era de 13,9 milhões, segundo dados do Ministério da Cidadania. Em janeiro, o programa passou por um ajuste e houve o cancelamento de milhares de benefícios – ainda assim, o número de famílias beneficiárias chegou a 13,8 milhões naquela ocasião, maior que a previsão para o próximo ano.
Se as previsões do PLOA se confirmarem, a situação dos beneficiários do Bolsa Família no ano que vem será curiosa. Como o orçamento total do programa é parecido, mas há menos famílias beneficiadas, em termos nominais (sem contar a inflação), cada família teoricamente ganhará um pouco a mais. Mas, em termos reais (considerando a inflação), o poder de compra vai diminuir, pois o suposto aumento do benefício não será suficiente para repor o aumento dos preços.
Em 2019, a média está na casa de R$ 187,40. Esse valor médio pode subir para R$ 189,68 mensais em 2020, a julgar pelos números do PLOA. Em ambos os casos, considera-se apenas 12 meses de pagamento, isto é, sem computar um eventual 13.º, que ainda não está garantido (por previsão legal ou orçamentária) para 2019 e 2020.
No acumulado de 12 meses, esses valores mensais correspondem ao pagamento de R$ 2.248,80 por família neste ano e R$ 2.276,17 no ano que vem.
Nesse cenário, a variação no valor médio do Bolsa Família de 2019 para 2020 que se pode deduzir dos números do PLOA será de somente 1,22%, bem abaixo da inflação (IPCA) acumulada em 12 meses até agosto (3,43%) e também da expectativa do mercado para 2019 (3,54%).
Quando anunciou o pagamento de um 13.º para o Bolsa Família, o ministro da Cidadania, Osmar Terra, estimou que o pagamento extra representaria um ganho de 8,5% no valor anual recebido por família. No entanto, nem o valor formalmente assegurado para 2019 nem o previsto para 2020 dão conta de pagar os 13 benefícios anuais prometidos.
Governo não explica como número de beneficiários vai diminuir
Procurado, o Ministério da Cidadania não esclareceu como estimou em 13,2 milhões o número de beneficiários do Bolsa Família para 2020, mas ponderou, por meio de nota, que suas despesas discricionárias (não obrigatórias, de livre escolha) foram reduzidas.
"O Ministério da Cidadania esclarece que o principal objetivo da pasta é fortalecer e integrar as políticas públicas nas áreas de Cultura, Esporte e Desenvolvimento Social. Para isso, o ministro Osmar Terra fará o esforço necessário para manter os programas e os serviços que estão sob sua responsabilidade", diz a nota.
Em relação ao Bolsa Família, a pasta ressalta que "a folha de pagamentos do programa flutua mensalmente em virtude dos processos de inclusão, exclusão e manutenção de famílias beneficiárias". Sobre o pagamento do 13.º, o ministério diz que o pagamento está garantido para este ano, mas não informou de onde sairá o dinheiro para isso nem se o orçamento de 2020 já contempla esse valor extra, uma vez que a MP que vai criá-lo ainda não foi editada.
Crise pressiona pobreza
Em meio à estagnação do orçamento do Bolsa Família, a combinação de fatores como o baixo crescimento do PIB e a elevada taxa de desemprego resulta na manutenção e até mesmo aumento da pobreza.
Os dados de pagamento do Bolsa Família neste ano já mostram isso: durante quatro meses, entre março e junho, o número de famílias beneficiárias extrapolou os 14 milhões. O pico de pagamentos foi registrado em maio, quando 14,3 milhões de famílias precisaram de ajuda.
Antes mesmo de o governo Bolsonaro começar, essa tendência de aumento de pobreza já se delineava. No ano passado, o IBGE divulgou a Síntese de Indicadores Sociais, que mostrou que ao menos 54,8 milhões de brasileiros viviam com menos de R$ 406 por mês, o equivalente a 26,5% da população enquadrada no critério de pobreza do Banco Mundial – um número maior que o registrado na versão anterior da pesquisa.
Esse mesmo estudo analisou os indicadores de pobreza e o investimento que seria necessário para erradicar a pobreza no país. Segundo o IBGE, para fazer com que as 54,8 milhões de pessoas pobres ultrapassem essa linha, é preciso de um investimento de R$ 10,2 bilhões mensais – e isso está muito além das possibilidades do governo atualmente.
Para piorar, o rendimento médio do brasileiro está patinando e a desigualdade parou de diminuir. A crise econômica brasileira afetou não só o país, mas todo o combate à pobreza na América Latina.
Um cenário que só reforça a importância do Bolsa Família. O Bolsa Família considerado muito bem focalizado e direcionado, o que faz com que traga resultados. Estudo do Ipea mostrou que, nos últimos 15 anos, o programa conseguiu reduzir a extrema pobreza em 25% e a pobreza em 15%, custando apenas o equivalente a 0,5% do PIB.
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