O presidente Jair Bolsonaro ganhou o empurrão que faltava para tomar sua decisão sobre parâmetros para a adoção da tecnologia 5G no Brasil. Ao receber o conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, Robert O’Brien, e sua comitiva, no Palácio do Planalto, o governo deu um importante pontapé para escantear a gigante chinesa Huawei no leilão de licenças do padrão da 5ª geração de internet móvel, em 2021, ao passo em que tenta mitigar os riscos de se elevar o custo da tecnologia no Brasil.
A reunião no Planalto foi classificada pelo governo como um sucesso. O acordo entre o Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos (EximBank) e o Ministério da Economia para ofertar até US$ 1 bilhão em crédito norte-americano para financiar projetos de telecomunicação no Brasil era o que o Executivo precisava para se sentir mais confortável em tomar a decisão de limitar a Huawei no Brasil. No frigir dos ovos, o encontro, que tinha como pano de fundo a assinatura de acordos comerciais, se transformou em uma vitória para a política externa brasileira.
Sob o comando do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o Brasil se propõe a buscar alinhamento a países com uma política ligada ao espectro da direita política. As relações comerciais adotadas junto a governos de esquerda são pragmáticas, mas nunca terão a mesma afinidade. É assim que o Planalto trata a China e, na “guerra do 5G”, a Huawei. Por isso, ter os Estados Unidos como um importante parceiro é visto pelo Executivo como imprescindível para tomar partido.
O 5G é um tema muito sensível dentro do governo. Por isso, a decisão final sobre um banimento ou não da Huawei não foi tomada. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, e o vice-presidente, Hamilton Mourão, são defensores de um pragmatismo maior na relação externa e, por isso, defendem uma participação igual dos chineses nesse mercado. O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, Araújo e Bolsonaro, têm o pensamento oposto. E é para esse caminho que a decisão final tende a seguir.
A ideia de limitar o alcance dos chineses no 5G já estava tomada por Bolsonaro. É o que apontam interlocutores do Planalto à Gazeta do Povo. Restava decidir a forma de se viabilizar o escanteamento da China. Basicamente, o que se discutia é como irritar menos os chineses. “Irritar vai irritar. A decisão política [de limitar a participação chinesa] já existe. A questão é fazer com que essa irritação não atrapalhe as questões do agronegócio, mas, obviamente, o Brasil é um país grande demais para ficar refém da vontade de um outro país. Se tiver que tomar a decisão estratégica, será tomada independentemente de um abalo no comércio”, diz um auxiliar.
O que Bolsonaro mais desejava era ter os Estados Unidos como fiador dessa cruzada. Afinal, não é nada simples restringir a China na disputa pelo 5G. Por isso, o entendimento no governo é que os acordos firmados com os Estados Unidos possam evitar o encarecimento da tecnologia, como aposta o presidente da Huawei. “Agora, pode mudar? Pode, até o martelo ser batido pelo presidente. Mas, se o Brasil tivesse condições econômicas melhores, isso já teria sido comunicado”, destaca um assessor palaciano.
Por que o temor em relação à China na disputa pelo 5G?
A decisão do governo em tomar lado na disputa pelo 5G é atribuída à segurança nacional. Bolsonaro recebeu relatórios de que duas leis na China obrigam empresas chinesas a passar dados solicitados ao Partido Comunista. Ou seja, o entendimento é de que a Huawei tem participação direta na cúpula do governo chinês.
“Nós temos plena convicção do risco da China para a segurança nacional. Acreditamos no pragmatismo econômico, mas temos plena convicção de que questões estratégicas não podem ser tratadas com eles. Entre crescimento econômico e soberania nacional, não vamos entregar a soberania nacional”, alerta um técnico da Presidência da República.
A ideia, portanto, é limitar ao máximo a participação chinesa no leilão de licenças do padrão da 5ª geração de internet móvel, mas não eliminar. O objetivo do Planalto é diversificar a infraestrutura das redes com limite de provedores para evitar que a Huawei tenha uma vasta penetração no mercado. A gigante chinesa já detém uma significativa parcela e, justamente por isso, alega que impedi-los de prover a tecnologia aumentaria o custo. O que se discute dentro da Presidência é estabelecer que, no mínimo, duas fabricantes explorem elementos de rede das operadoras.
Além dos apontados aspectos acerca da soberania e segurança nacional, o isolamento à tecnologia chinesa representa a Bolsonaro o cumprimento de uma das bandeiras desde as eleições. Interlocutores do presidente defendem que o alinhamento aos Estados Unidos é importante para marcar posicionamento em sua política externa e cumprir com um “compromisso eleitoral”.
“Queremos manter laços comerciais com a China e outros países. Fazemos negócio com todos, mas não vamos ter aliança estratégica com todos”, diz um auxiliar. “A China é um país comunista e, por isso, há o interesse de se manter um bom relacionamento, mas não uma aliança estratégica”, acrescenta a fonte palaciana.
Pontos políticos para Bolsonaro e Trump
A China, evidentemente, não vai ficar calada. Pouco a pouco, se posicionará e levantará a narrativa de contrariedade a uma exclusão da tecnologia da Huawei. A eliminação chinesa no leilão, no entanto, não é previsto pelo analista político Luan Madeira, consultor da BMJ Consultores Associados. “O governo brasileiro não deve tender para um banimento total, mas deve pensar em algumas maneiras de reforçar medidas de cibersegurança e de segurança de redes para meio que agradar os Estados Unidos”, aposta.
O governo brasileiro não é o único que tem motivos para celebrar na reunião de terça-feira (20). O governo norte-americano, também. A leitura de Madeira é que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, irá capitalizar em cima da visita de O’Brien. “Qualquer coisa que questione a presença chinesa e o avanço da ‘China comunista' pelo mundo, como diz a Casa Branca, é cara ao eleitorado de Trump e gera certa influência na política internacional dos EUA”, justifica. O especialista em relações internacionais pondera que a relação com a América Latina não chega a ter uma prioridade máxima na campanha eleitoral, mas reconhece que, quanto mais aliados para o republicano, melhor.
O mesmo vale para a defesa da democracia defendida pelo governo norte-americano, em uma pauta que conta pontos políticos para Brasil e Estados Unidos. O’Brien, inclusive, chegou a citar um compromisso com a democracia de lutar por eleições livres na Venezuela, algo esperado por Madeira. “Ambos são países que falam e se opõem abertamente a [Nicolás] Maduro [ditador venezuelano], e não poderiam deixar de falar, agora, após as eleições da Bolívia [que culminaram com a vitória de Luis Arce, candidato do Movimento para o Socialismo (MAS)]”, analisa.
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