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O convite feito por Jair Bolsonaro para o ex-presidente Michel Temer (MDB) chefiar a missão brasileira de ajuda ao Líbano foi visto por auxiliares do presidente como uma nova investida do Palácio do Planalto para trazer o MDB para a base governista e, de quebra, embaralhar ainda mais a disputa pela presidência da Câmara, no início do ano que vem.
Neste domingo (9), Bolsonaro anunciou em videoconferência internacional com a participação de outros chefes de Estado, como os presidentes do Líbano, Michel Aoun; da França, Emmanuel Macron; e dos EUA, Donald Trump, que convidou o emedebista para a missão. Em nota divulgada horas depois, o ex-presidente disse estar honrado com a lembrança. “Quando o ato for publicado no Diário Oficial serão tomadas as medidas necessárias para viabilizar a tarefa”, disse Temer. Apesar disso, o ex-presidente ainda depende de uma autorização judicial para fazer parte da missão.
Desde o final de março, o presidente tem feito acenos ao MDB ao receber em reuniões no Planalto líderes do partido, como o presidente nacional da sigla, Baleia Rossi (SP), e o ex-deputado e membro do Conselho de Administração da Itaipu Binacional Carlos Marun (MS), este último considerado da tropa de choque de Temer.
Desde abril, conforme interlocutores do Planalto, Temer virou conselheiro informal de Bolsonaro, após o Palácio do Planalto começar a articular uma nova base de sustentação de apoio ao governo na Câmara com a ajuda dos partidos do chamado Centrão, como o Progressistas (antigo PP) do deputado Arthur Lira (AL) e o PL, por exemplo.
Ao fazer o convite para Temer, Bolsonaro faz novo aceno aos emedebistas da Câmara e busca minimizar os impactos da recente saída do MDB e do DEM do chamado "blocão", cujo líder é Lira. Se por um lado, o partido diz publicamente que não fará parte da base governista e não aceitará cargos ou indicações; do outro, a aproximação entre Bolsonaro e Temer mostra que o MDB pode ter maior influência no processo de tomada de decisões do Palácio do Planalto. Principalmente por meio da chamada “ala militar”, que é mais sensível aos pedidos dos parlamentares emedebistas.
Aliança com MDB pode definir resultado das eleições no Congresso
A tática de aproximação com o MDB é vista por integrantes do Palácio do Planalto como uma espécie de salvaguarda para duas eleições importantes que acontecerão no ano que vem: das presidências da Câmara e do Senado. Na Câmara, uma possível vinda do MDB para a base do governo pode anular as investidas do atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de fazer seu sucessor.
Assim, o Planalto teria duas opções de nomes mais alinhados ao governo. O de Arthur Lira, que tenta se capitanear como o nome mais forte na disputa e o do presidente do MDB, Baleia Rossi, que oficialmente não é candidato, mas colegas do partido tentam convencê-lo de que ele seria um nome de consenso dentro da Câmara.
No Senado, o governo tenta a qualquer custo manter um aliado na presidência da Casa. Existem dois planos em curso. O primeiro é apoiar o projeto de reeleição de Davi Alcolumbre (DEM-AP), embora ela dependa da boa vontade dos próprios senadores ou do Supremo Tribunal Federal (STF), já que não há previsão regimental e legal de reeleição de presidente de casa legislativa federal dentro de um mesmo mandato.
O segundo plano é apoiar um nome do MDB de Temer. Apesar da rixa histórica entre emedebistas de Câmara e Senado, uma aproximação do governo com o partido é bem-vista tanto por deputados quanto por senadores. O plano B a Alcolumbre já começa a ser costurado e algo que está em discussão nos bastidores do Senado é que o sucessor do senador do Amapá seja um emedebista com algum alinhamento com o governo, fortalecendo ainda mais os elos entre o Planalto e o partido de Temer.
Por fim, ao chamar Temer para essa missão diplomática, o governo também faz uma sinalização favorável à chamada “ala conservadora” dentro do MDB, tentando obter apoio de parlamentares que coadunam com algumas pautas de costumes, como a proibição do aborto por exemplo.