O deputado federal Arthur Lira (PP-PE) terá 10% de seu salário mensal na Câmara bloqueado pela Justiça, a pedido da Lava Jato. A decisão é motivada por denúncias de corrupção que envolvem o parlamentar, e foi anunciada nesta quinta-feira (23). Três dias antes disso, na segunda-feira (20), Lira esteve com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Palácio do Planalto. Ele gravou um vídeo ao lado do chefe do Executivo, que mandou abraços à esposa e ao filho do deputado.
O encontro com Lira foi mais um de uma série de reuniões que tem marcado a agenda recente do presidente. Bolsonaro tem dialogado com líderes de partidos do chamado Centrão, grupo com força no Congresso Nacional. O PP de Lira é uma das siglas mais fortes do segmento. Outros partidos que formam o Centrão são MDB, PL, PSD e Republicanos – todos com representantes que se encontraram recentemente com Bolsonaro.
O DEM também faz parte do grupo. O presidente da sigla, o prefeito de Salvador, ACM Neto, se encontrou com Bolsonaro na quinta-feira (23). A reunião foi reservada, com a presença apenas de Bolsonaro e ACM, e nenhum dos dois fez declarações públicas sobre o diálogo.
Também é do DEM o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), que nas últimas semanas se tornou um dos principais adversários de Bolsonaro. E que pode ser uma das maiores "motivações" para os atos do presidente da República.
Base é essencial para Bolsonaro
A popularidade do presidente apresentou queda desde o início da pandemia de coronavírus. Levantamento feito pela XP Investimentos verificou que a porcentagem de brasileiros que considera o desempenho de Bolsonaro ruim ou péssimo cresceu de 36% para 42%, na comparação entre o início de março e o dia 3 de abril.
A mesma pesquisa verificou diminuição na faixa da população que avalia como ótimo ou bom o governo do presidente. Outros institutos também obtiveram conclusões semelhantes, em especial durante a crise que culminou com a demissão de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde.
A reprovação popular é um dos ingredientes que pode motivar um processo de impeachment. A queda da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) passou a se tornar mais viável quando manifestações de rua estimularam políticos que apoiavam a petista a mudar de lado. Bolsonaro já tem pedidos de afastamento contra ele protocolados na Câmara dos Deputados.
Um deles, de autoria dos advogados José Rossini Campos e Thiago Santos de Pádua, deve ter um desfecho em breve: o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quinta que Rodrigo Maia se manifeste sobre a requisição. A decisão de abrir ou não um processo de impeachment compete exclusivamente ao presidente da Câmara.
Nesse contexto, a formação de uma base forte se torna necessária para Bolsonaro. A Câmara tem hoje um bloco parlamentar formado por nove partidos – PL, PP, PSD, MDB, DEM, Solidariedade, PTB, Pros e Avante – que reúne 221 deputados, mais de 40% do total de integrantes da Câmara. O grupo é chefiado por Arthur Lira.
Outro pedido de impeachment foi protocolado na quarta-feira (22) pelo PDT. O documento é assinado pelo presidente da sigla, Carlos Lupi, e pelo presidenciável Ciro Gomes, um dos derrotados por Bolsonaro na eleição de 2018.
O partido integra a oposição no Congresso, ao lado de forças como o PT, cujo principal expoente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu nesta quinta que o "fora Bolsonaro" se torne uma frase de ordem da esquerda.
Maia, o adversário
A movimentação de Bolsonaro tem também como foco reduzir a influência do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, sobre os outros parlamentares. Maia comanda a Câmara desde 2016 e é respeitado pela maior parte do parlamento – a ponto de existir até uma articulação para a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que o permitiria concorrer a uma nova eleição interna.
Um dos fatores que levou Maia a ser elogiado pelos deputados é o protagonismo que ele trouxe à Câmara ao longo de 2019, principalmente pela tramitação da reforma da previdência.
A disputa pela sucessão de Maia, que deixa o cargo no próximo mês de fevereiro se as regras não forem modificadas, já tem alguns nomes colocados. Entre eles, Arthur Lira. O presidente Bolsonaro diz rotineiramente que não tem interesse em interferir nas eleições dos outros poderes. Mas a vitória de um aliado seu para o comando da Casa seria celebrada dentro do governo.
"Todos estão com o cabelo em pé"
Mas se a aproximação de Bolsonaro com o Centrão pode melhorar a imagem do presidente junto a um grupo político, pode também fazer com que o chefe do Executivo passe a enfrentar contestações de lideranças que o apoiaram justamente por esperar nele uma rejeição à chamada "velha política".
Alguns dos deputados eleitos pelo PSL e que já se distanciaram do bolsonarismo ao longo do ano passado se manifestaram publicamente contra as reuniões de Bolsonaro com as forças de centro. "Presidente Jair Bolsonaro acaba de conseguir criar o seu novo partido 'Aliança com o Centrão'. O 'toma lá, da cá' está novamente oficializado no BRASIL!!", escreveu Junior Bozzella (SP).
"Foi só encontrar com os líderes do centrão e no outro dia querer desmontar a equipe de Moro ou é impressão minha?", questionou Dayane Pimentel (BA), recordando o episódio da "quase demissão" do ministro da Justiça, na quinta-feira.
Mas mesmo entre os ainda bolsonaristas o alinhamento entre Bolsonaro e o Centrão gera controvérsias. Um deputado que migrará para o Aliança Pelo Brasil, partido idealizado pelo presidente, disse que as conversas abalaram a base. "Todos estão com o cabelo em pé. Colocar a velha política de volta? Isso não tem cabimento. Nenhum bolsonarista vai apoiar isso", questionou.
O parlamentar disse que, em sua visão, o problema maior não está no fato de os possíveis novos aliados de Bolsonaro serem de centro, mas sim de terem acusações de corrupção. "Nós fomos para as ruas para protestar contra a corrupção do MDB, do PSDB, do PP, do PT… e agora eles podem estar se aproximando do governo", contestou.
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