O chanceler francês Jean-Yves Le Drian exaltou em discurso feito nesta segunda-feira (29), no Palácio do Itamaraty, a decisão tomada pelo presidente Jair Bolsonaro de manter o Brasil no Acordo de Paris. Antes de assumir, Bolsonaro tinha cogitado tirar o país do tratado, assim como fez o presidente norte-americano Donald Trump com os Estados Unidos em 2017.
A decisão sobre o acordo ambiental, tomada no fim de junho, não é a primeira que contraria as expectativas de alinhamento automático do Brasil aos EUA na política externa. No começo do mandato, grande parte da opinião pública previa uma adesão irrestrita do Itamaraty aos EUA durante a gestão de Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores. A admiração de Bolsonaro e Araújo por Trump, e a simpatia do novo governo pelos posicionamentos da Casa Branca em questões como a crise na Venezuela e o conflito Israel x Palestina respaldavam essa previsão.
Em sete meses de governo, a expectativa inicial de adesão às posições dos EUA não foi frustrada por completo, mas foi contrariada várias vezes. Relembre cinco ocasiões em que isso ocorreu.
Embaixada em Israel não mudou para Jerusalém
Falava-se que o governo Bolsonaro reconheceria Jerusalém como capital de Israel, com a transferência da embaixada brasileira de Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Mas, no fim da viagem a Israel que o presidente fez em março, a única novidade foi o anúncio da criação de um escritório brasileiro em Jerusalém "para a promoção do comércio, investimento, tecnologia e inovação" em conjunto com Israel.
Mesmo com a desistência de transferir a embaixada para Jerusalém, produtores agrícolas brasileiros temeram que a criação do escritório pudesse afetar as boas relações comerciais com alguns países islâmicos. Para diminuir a possibilidade de atrito e de consequências comerciais negativas, o governo marcou uma reunião com embaixadores de nações muçulmanas na Confederação Nacional de Agricultura (CNA).
Brasil segue firme e forte no Acordo de Paris
Em junho de 2017, Donald Trump retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris. Os termos do tratado tinham sido aceitos menos de um ano antes, em novembro de 2016, pelo então presidente dos EUA Barack Obama. Bolsonaro sinalizou várias vezes que queria ao menos rever os termos do acordo.
O posicionamento brasileiro nessa área criou, por algumas semanas, um impasse para a concretização do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. Alguns políticos europeus criticaram o presidente do Brasil, como o eurodeputado alemão Martin Häusling, integrante de comissões do parlamento europeu relacionadas a agricultura e meio ambiente, que afirmou que "com uma pessoa assim, não dá para negociar nada".
A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e o presidente da França, Emmanuel Macron, sinalizaram que o impasse na área do meio ambiente poderia frustrar um acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul. Mas, no fim de junho, o governo brasileiro confirmou que não exigiria mudança nos tratados climáticos. Macron ficou satisfeito e disse que o Brasil "confirmou o seu compromisso, ao contrário das preocupações que podia haver, com o Acordo de Paris e a luta pela biodiversidade".
Hezbollah não foi classificado como grupo terrorista
A possibilidade de o Brasil classificar o grupo Hezbollah como terrorista foi levantada após a eleição de Jair Bolsonaro. Em novembro de 2018, ao ser questionado sobre a chance de o Brasil seguir os passos dos EUA nas classificações sobre terrorismo, o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, John Bolton, disse que, com a eleição de Bolsonaro, uma das prioridades de Trump seria "estender a cooperação contra o terrorismo, seja quanto a Hezbollah, Hamas ou outros".
Em decisão recente, por ensejo dos 25 anos do atentado ao prédio da AMIA – uma entidade assistencial judaica de Buenos Aires –, o presidente argentino Mauricio Macri assinou um decreto classificando o Hezbollah como terrorista. Isso trouxe à tona mais uma vez a chance de que o Itamaraty contrariasse a Organização das Nações Unidas (ONU) – que não declara o Hezbollah como terrorista – e seguisse os EUA nessa questão.
No entanto, o Itamaraty esclareceu que, por enquanto, uma mudança de posicionamento não está em pauta. Além de contrariar a ONU, o Brasil colocaria em risco relações comerciais, políticas e até militares: desde 2011, a Marinha do Brasil comanda a força-tarefa marítima da Unifil (Força Interina das Nações Unidas no Líbano), uma missão da ONU criada em 1978 para preservar a paz na região.
Relacionamento com a China não esfriou
A China tem divergências históricas com os EUA e uma relação conturbada com o presidente Trump. Mas, mesmo diante da forte afinidade entre Bolsonaro e o líder norte-americano, não esfriou suas relações com o Brasil.
O país oriental continua sendo um forte parceiro comercial. Recebeu 27,8% das exportações brasileiras em 2018, e o governo atual já sinalizou que não quer perder esse mercado. Na quinta-feira (25), Ernesto Araújo confirmou que uma comitiva comandada pelo presidente Jair Bolsonaro viajará à China em outubro. Além disso, o presidente chinês Xi Jinping virá ao Brasil em novembro, já que o país sediará a Cúpula do Brics, deste ano.
Araújo afirmou o interesse do Brasil em aumentar o intercâmbio econômico com a China e em receber mais investimentos chineses. Também disse que quer ampliar a vinda de turistas chineses ao Brasil.
Brasil não impôs restrições à Huawei
Em maio deste ano, o governo norte-americano assinou uma ordem executiva impedindo empresas americanas de usarem telecomunicações de empresas estrangeiras que "possam oferecer risco à segurança nacional". Na lista de empresas que oferecem risco, o Departamento de Comércio do país incluiu a chinesa Huawei, segunda maior fabricante de celulares do mundo. Os americanos acusavam a empresa chinesa de espionagem.
O governo brasileiro não seguiu o posicionamento norte-americano. Em visita no mesmo mês ao país oriental, o vice-presidente Hamilton Mourão disse que o governo brasileiro via com bons olhos a Huawei e que a empresa aumentaria seus investimentos no país.
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