Em entrevista à revista "Veja" publicada nesta sexta-feira (31), o presidente Jair Bolsonaro (PSL) disse estar preocupado com quebra de sigilo bancário de seu filho Flávio Bolsonaro (PSL) e falou sobre a sua relação de amizade com Fabrício Queiroz, pivô da investigação do Ministério Publico do Rio, com quem disse estar chateado.
"Lógico [que preocupa]. Se alguém mexe com um filho teu, não interessa se ele está certo ou está errado, você se preocupa", disse o presidente à revista.
Na entrevista, Bolsonaro também foi questionado sobre o desemprego. Mas não soube dizer para quando espera a redução do nível de desocupação. "A situação não está nada bacana. Essa é a realidade."
O caso Queiroz
Segundo a Promotoria, há indícios robustos dos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no gabinete de Flávio de 2007 a 2018 na Assembleia Legislativa do Rio, período em que Queiroz trabalhou com o então deputado estadual como uma espécie de chefe de gabinete. Foi com base nesses indícios que a Promotoria solicitou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de 86 pessoas e nove empresas.
No caso de Flávio, uma comunicação do Coaf se refere a 48 depósitos sequenciais de R$ 2 mil em espécie em sua conta bancária de 9 de junho a 13 de julho. O senador afirmou que esses valores se referem a uma parcela do pagamento que recebeu em dinheiro pela venda de um imóvel no período e que foram depositados por ele mesmo num caixa eletrônico.
"Falaram que os depósitos fracionados eram para fugir do Coaf. Dois mil reais é o limite que você pode botar no envelope. O que tem de errado nisso?", disse Bolsonaro à Veja. Aí vem o Queiroz. Realmente tem dinheiro de funcionário na conta dele. O Coaf disse que há movimentações financeiras suspeitas e incompatíveis com o patrimônio do Queiroz. Mas quem tem de responder a isso é o Queiroz."
A investigação do Ministério Público foi aberta após um relatório do governo federal ter apontado movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta bancária de Queiroz, de janeiro de 2016 a janeiro de 2017.
Além do volume movimentado, chamou a atenção a forma com que as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo, em data próxima do pagamento de servidores da Assembleia.
Queiroz já admitiu que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem o conhecimento do então deputado.
"Estou chateado porque houve depósitos na conta dele, ninguém sabia disso, e ele tem de explicar isso daí. Eu conheço o Queiroz desde 1984. Foi meu soldado, recruta, paraquedista na Brigada de Infantaria Paraquedista. Ele era um policial bastante ativo, tinha alguns autos de resistência, contou que estava enfrentando problemas na corporação", contou o presidente na entrevista. "Vocês sabem que esse pessoal de esquerda costuma transformar muito rapidamente auto de resistência em execução."
"Aí começou a trabalhar conosco. E você sabe que lá no Rio você precisa de segurança. Eu mesmo já usei o Queiroz várias vezes. Teve um episódio dele com o meu filho em Botafogo, um assalto na frente de casa, e o Queiroz, impetuoso, saiu para pegar o cara. Então existe essa amizade comigo, sim. Pode ter coisa errada? Pode, não estou dizendo que tem. Mas tem o superdimensionamento porque sou eu, porque é meu filho. Ninguém mais do que eu quer a solução desse caso o mais rápido possível."
Confira a seguir outros trechos da entrevista que Bolsonaro concedeu à "Veja":
Cadeira de presidente é 'criptonita'
Bolsonaro disse que já passou noites sem dormir e chorou "pra caramba também" depois que assumiu a Presidência. "Angústia, né? Tá faltando o mínimo de patriotismo para algumas pessoas que decidem o futuro do Brasil. O pessoal não está entendendo para onde o Brasil está indo. Não preciso dizer quem são essas pessoas. Elas estão aí. Imaginava que ia ser difícil, mas não tão difícil assim. Essa cadeira aqui é como se fosse criptonita para o Super-Homem", disse.
Por que era contra e agora defende a reforma da Previdência
O presidente afirmou que, quando foi deputado, tinha muita "informação de orelhada", e por isso sempre foi contra a reforma da Previdência. Mas que "a realidade" mudou sua opinião. "Se a reforma da Previdência não passar, o dólar pode disparar, a inflação vai bater à nossa porta novamente e, do caos, vão florescer a demagogia, o populismo, quem sabe o PT, como está acontecendo na Argentina, com a volta de Cristina Kirchner. O Brasil não aguentaria outro ciclo assim."
'Não tem outro caminho a não ser privatizar os Correios'
Segundo Bolsonaro, após a Previdência o governo partirá para a reforma tributária e privatizações. Ele disse que já deu sinal verde para a venda dos Correios, e relembrou escândalos de corrupção que rondaram a estatal: "Temos de mostrar à opinião pública que não tem outro caminho a não ser privatizar os Correios. Será assim com outras estatais. Há muitos cabides de emprego dentro do governo".
Quando cai o desemprego?
Questionado, Bolsonaro não respondeu para quando espera uma queda no desemprego. Criticou a dificuldade para se tocar obras de infraestrutura no país – "Quando os chineses quiseram fazer a usina hidrelétrica de Três Gargantas, só avisaram: 'Olha, daqui a dois anos a água vai subir, se vira'. No Brasil você não faz isso" –, citou a falta de qualificação de parte dos desempregados e universitários "que só têm diploma". Criticou quem acha que "gastar mais dinheiro é sinal de que está melhorando a educação". E concluiu: "A situação não está nada bacana. Essa é a realidade".
"Errei ao indicar Vélez como ministro"
Na entrevista, Bolsonaro disse que errou ao nomear Ricardo Vélez Rodríguez ministro da Educação, aceitando a sugestão do ideólogo Olavo de Carvalho. "Depois liguei para ele: 'Olavo, você conhecia o Vélez de onde?'. 'Ah, de publicações.' 'Pô, Olavo, você namorou pela internet?', disse a ele", contou o presidente.
Qual a influência de Olavo?
Embora tenha admitido que aceitou a sugestão feita por Olavo de Carvalho para o Ministério da Educação, Bolsonaro afirmou que o nível de influência do escritor em seu governo é "nenhum". "Ele vinha disseminando os ideais da direita havia muito tempo, uma visão que abriu a cabeça de muita gente. Então, de alguma forma, ajudou na minha eleição. Mas raramente eu converso com o Olavo."
"Aparelhamento mais forte é na Educação"
Ao afirmar que Vélez Rodríguez sofreu sabotagem do próprio gabinete no episódio em que orientou escolas a cantar o Hino Nacional e a ler o slogan do governo, o presidente disse que no governo "há sabotagem às vezes de onde você menos imagina". "Mas o aparelhamento mais forte mesmo é no Ministério da Educação. Eu não sou contra você falar nas escolas, nas universidades, sobre quem foi, por exemplo, Che Guevara. Mas tem de falar também quem foi Brilhante Ustra [reconhecido pela Justiça como torturador], com verdades, e não com mentiras."