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Às vésperas de encerrar seu mandato, o presidente Jair Bolsonaro (PL) fez uma transmissão ao vivo na internet, nesta sexta-feira (30,) para prestar contas da sua gestão e comentar o atual momento político do país. No próximo domingo, 1º de janeiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) toma posse como novo presidente. A live quebrou um longo período de silêncio de Bolsonaro, que optou por se recolher após a derrota nas eleições e após um problema de saúde. A última live feita por ele havia sido na semana anterior ao segundo turno das eleições.
Ao longo de 50 minutos, Bolsonaro falou sobre avanços e desafios enfrentados pelo seu governo, em especial com a ocorrência da pandemia da Covid-19 e destacou também fatores que dificultaram seu mandato, como os frequentes conflitos com ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e os impactos da guerra entre Rússia e Ucrânia. “Vencemos esses quatro anos com um saldo bastante positivo em que pese os problemas que tivemos. Nenhum chefe de Estado que eu tenha conhecimento aqui no Brasil enfrentou algo parecido com isso”, declarou.
Sobre as manifestações de seus apoiadores em todo o país, que estão em curso desde o final das eleições, Bolsonaro disse que os atos são legítimos e que há deturpação de autoridades e de parte da imprensa a respeito das reais intenções dos manifestantes. Ele negou participação ou envolvimento na organização desses atos e pediu aos apoiadores para que deem seguimento à oposição ao governo Lula sem violência.
“Creio no patriotismo, na inteligência, na garra de vocês. Sei o que vocês passaram ao longo desses dois meses de protestos, com sol, chuva. Isso não vai ficar perdido. Imagens foram para fora do Brasil. Aqui dentro despertou milhões de pessoas a estudarem por que tivemos essas manifestações. O pessoal passou a entender o que tem a perder, o que é a política brasileira”, disse Bolsonaro.
“O quadro que temos pela frente agora, a partir de 1º de janeiro, não é bom. Não é por isso que vamos jogar a toalha, deixar de fazer oposição, deixar de criticar, de conversar com seus vizinhos, agora com muito mais propriedade e conhecimento. Vamos pro tudo ou nada? Não! Não tem tudo ou nada. Inteligência! Temos que mostrar que somos diferentes do outro lado – nós respeitamos as leis e a Constituição, nós sabemos dar valor à liberdade”, enfatizou.
A mensagem de Bolsonaro acontece após episódios de vandalismo e de tentativa de uso de um artefato explosivo por manifestantes descontentes com o resultado das eleições. Um homem foi preso acusado de tentar explodir uma bomba nas proximidades do aeroporto de Brasília. Em depoimento à polícia, o suspeito afirmou que a ideia era criar o "caos" e que o ato foi planejado no acampamento instalado em frente ao quartel-general do Exército. Bolsonaro afirmou na live que "nada justifica essa tentativa de ato terrorista na região do aeroporto”.
Durante a transmissão, Bolsonaro também fez críticas ao que considera excessos do Judiciário em relação a seus apoiadores e apresentou um balanço com os principais avanços ocorridos durante seu mandato. Entre os principais feitos, citou a redução da inflação e a recuperação de empregos após a crise econômica internacional em decorrência da pandemia, a redução recorde de homicídios, ações de desestatização e desburocratização e redução de impostos.
“O mundo todo vinha sofrendo com inflação, e nós domamos a inflação. Tivemos três meses de deflação no Brasil – junto com o Parlamento, e não na canetada. Zeramos impostos federais nos combustíveis, botamos um teto no ICMS. Hoje ainda temos a gasolina em média a R$ 5 em todo o Brasil, que chegou na casa dos R$ 8. Está no orçamento tudo previsto para que no ano que vem continuem zerados os impostos federais. Mas o novo governo, como a imprensa noticiou, quer que se volte a cobrar os impostos federais a partir de janeiro. Então pelo que tudo indica a gasolina sobe quase um real a partir de 1º de janeiro”, disse.
Bolsonaro questiona tratamento dado a manifestantes
Ao comentar os protestos de apoiadores, o atual presidente condenou a forma como parte da imprensa tem abordado os atos e reforçou que é favorável a que apoiadores seus que cometerem quaisquer crimes respondam pelos seus atos. Disse, porém, que há uma tentativa de criminalizar os manifestantes rotulando-os de antidemocráticos ou violentos.
“A facada que recebi [em 2018] foi de um ex-filiado do PSOL, que é um partido satélite ao PT. E a imprensa não bateu em cima disso, não levou para a questão ideológica. Não falou em pessolista, petista, de esquerda. Hoje em dia se uma pessoa comete um deslize, um crime, ou faz algo reprovável pela sociedade, é ‘bolsonarista’”, questionou.
Outro ponto criticado por Bolsonaro em relação a setores da imprensa foi quanto a uma possível leniência em relação aos excessos do Judiciário ao ordenar prisões de críticos de ministros do STF. “Essa falta de liberdade prejudica a democracia. E isso aí, no futuro, se continuar, vai pegar todo mundo. O oxigênio da democracia é a liberdade”, declarou.
“Hoje em dia se você falar em urnas, você tem problema sério. E se for parlamentar, pode perder seu mandato, como o Francischini [Fernando Francischini, ex-deputado estadual pelo Paraná] perdeu. Nossas liberdades estão sendo tolhidas. Cabe a nós lutar contra isso. Discutir as questões que, discutindo, você aperfeiçoa”.
Críticas à Justiça Eleitoral
Ao comentar as eleições deste ano, Bolsonaro disse que houve falta de imparcialidade por parte do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com postura favorável do tribunal à campanha de Lula. Um dos pontos mais criticados foi a decisão do presidente do TSE, Alexandre de Moraes – depois confirmada pelos demais ministros – de rejeitar a ação apresentada pela coligação de Bolsonaro para invalidar os votos de 59,2% das urnas eletrônicas usadas no segundo turno da eleição. Na ocasião, o ministro negou entrar no mérito da denúncia e condenou a coligação a pagar uma multa de R$ 22,9 milhões por "litigância de má-fé".
Para Bolsonaro, tais decisões abusivas estimularam os protestos iniciados após o resultado eleitoral. “Para qualquer medida de força sempre há uma reação. Você tem que sempre buscar o diálogo para resolver as coisas, não pode dar um soco na mesa e não se discute mais o assunto. Isso tudo levou uma massa de pessoas às ruas. E essa massa, atrás de segurança, foi para os quartéis”.
O presidente disse, ainda, que os atos não são coordenados e que não participou da organização dos protestos. Quanto à acusação de críticos de que tramaria um golpe de Estado por força das manifestações, Bolsonaro refutou a acusação. Disse que “ninguém quer uma aventura”. “Em nenhum momento fui procurado para fazer nada de errado, violentando seja o que for. Eu entendo que fiz minha parte e estou fazendo até hoje dentro das quatro linhas”, disse.