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Nações Unidas

Bolsonaro diz na ONU que Brasil sofre “difamação” por causa da Amazônia e Pantanal

Bolsonaro na ONU: o que o presidente disse na Assembleia Geral das Nações Unidas em 2020
Bolsonaro no telão do plenário da ONU, em vídeo gravado para ser exibido na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas. (Foto: Reprodução/ONU TV)

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O presidente Jair Bolsonaro disse nesta terça-feira (22), em vídeo que foi exibido na abertura da 75.ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), que o Brasil não mede esforços para preservar sua natureza e que as queimadas na Amazônia e no Pantanal não estão fora do controle. Ele também afirmou que o Brasil é vítima de uma ação internacional de difamação na área ambiental motivada por interesses comerciais de outras nações.

Além disso, Bolsonaro também fez questão de defender as realizações do governo contra a Covid-19. Criticou a imprensa, acusando-a de "politizar o vírus" e provocar "pânico" na população.

O presidente também reafirmou ao mundo que o Brasil é um país cristão, criticando o que chamou de "cristofobia".

Outro alvo de crítica de Bolsonaro foi o ditador venezuelano Nicolás Maduro. O presidente afirmou que o Brasil é destaque no mundo pela defesa dos direitos humanos, e citou a acolhida dos venezuelanos que fogem de seu país como exemplo disso. Bolsonaro, por outro lado, elogiou o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump – que também é crítico de Maduro.

O presidente brasileiro usou o discurso na ONU para acenar aos investidores internacionais. Disse que o atual governo quebrou a "tradição protecionista" do Brasil, e defendeu acordos comerciais com outras nações. Também destacou que o país realizou reformas que melhoraram o ambiente de negócios.

O pronunciamento de Bolsonaro na ONU, bem como o de todos os chefes de Estado, foi gravado em vídeo por causa da pandemia de coronavírus – para evitar aglomeração no plenário da sede das Nações Unidas, localizada em Nova York (EUA).

O que Bolsonaro falou na ONU sobre meio ambiente

O Brasil, destacou Bolsonaro, é campeão na produção de alimentos. Segundo ele, o país tem uma produção capaz de alimentar 1 bilhão de pessoas no mundo.

O presidente associou o agronegócio a uma suposta campanha de difamação do Brasil por sua política ambiental. “Somos vítimas de uma das mais brutais campanha de desinformação sobre o Pantanal e Amazônia”, criticou.

O presidente disse, contudo, que o Brasil zela pelo meio ambiente. Afirmou que o país é líder em conservação de florestas tropicais e tem a matriz energética mais limpa do mundo. “Mesmos sendo uma das 10 maiores economias do mundo, somos responsáveis por 3% da emissão de carbono [no mundo]. Garantimos segurança alimentar a um sexto do mundo, mesmo usando apenas 27% do nosso território para agropecuária”, disse.

Por todos esses motivos, Bolsonaro entende que o mundo tenta desinformar e difamar o Brasil. “Por isso, há tanto interesse em propagar desinformações sobre nosso meio ambiente. Estamos abertos para o mundo naquilo que melhor temos para oferecer”, ressaltou.

Como era esperado, Bolsonaro frisou que as queimadas no Pantanal e na Amazônia não são incomuns. “Os incêndios ocorrem praticamente nos nos mesmos lugares, no entorno da floresta”, disse.  O índio e o caboclo, disse Bolsonaro, costumam queimar áreas já desmatadas em busca de sobrevivência. O presidente garantiu que focos criminosos são contundentemente combatidos. “Mantenho política de tolerância zero crime ambiental. Buscamos a regularização fundiária visando identificar os autores desses crimes.”

Em seguida, deu uma alfinetada aos críticos na Europa. “Lembro que a região amazônica é maior que toda a Europa Ocidental. Daí, a dificuldade de combater não só os focos mas também a extração ilegal de madeira e a biopirataria. Por isso, estamos ampliando e buscando o emprego de tecnologias”, disse.

Bolsonaro destaca na ONU as ações contra a Covid-19

Bolsonaro também fez um balanço das ações de seu governo na luta contra a Covid-19. Questionado internacionalmente e até acusado de genocídio por supostamente não zelar pelas vidas de brasileiros, ele usou o início do discurso para prestar solidariedade às vítimas do coronavírus. “Quero lamentar, em primeiro lugar, cada morte”, afirmou.

O pronunciamento foi sucedido, contudo, da narrativa defendida por ele desde o início da pandemia, de que a economia não poderia ser deixada de lado. “Desde o princípio, alertei que tínhamos dois problemas para resolver: o vírus e o desemprego, e que ambos deveriam ser tratados simultaneamente e com a mesma responsabilidade”, declarou.

Ao mundo, Bolsonaro disse que, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), não pôde ditar as políticas de combate à pandemia e que teve de distribuir recursos aos governadores. “Por decisão judicial, toda as medidas de isolamento e restrições de liberdade foram delegadas a cada um dos 27 governadores”, afirmou.

O presidente, entretanto, enalteceu o auxílio emergencial. De forma “arrojada”, disse Bolsonaro, o governo concedeu o auxílio emergencial em parcelas que somam aproximadamente US$ 1 mil para 65 milhões de pessoas.

Os US$ 1 mil citados (cerca de R$ 5,5 mil), contudo, não batem com os valores pagos. Foram, até agora, cinco parcelas de R$ 600 – o que somado dá R$ 3.000. Com as quatro parcelas adicionais de R$ 300, serão no máximo R$ 4.200 por beneficiado. Além disso, Bolsonaro não citou que seu governo propôs apenas R$ 200 mensais e que foi o Congresso que elevou o valor para R$ 600.

No discurso na ONU, o presidente afirmou ainda que o Brasil destinou mais de US$ 100 bilhões para ações de saúde e socorro a empresas por causa da pandemia. “Assim como compensou a perda de arrecadação dos estados e dos municípios e assistiu a mais de 200 mil famílias indígenas com produtos alimentícios e [medidas de] prevenção à Covid”, destacou.

Críticas à imprensa e defesa da cloroquina

Não faltaram críticas de Bolsonaro na ONU à imprensa. Para ele, os meios de comunicação foram os principais responsáveis por politizar o coronavírus.

“Como aconteceu em grande parte do mundo, parcela da imprensa brasileira também politizou o vírus, disseminando o pânico entre a população sobre o ‘lema’ ‘fica em casa e a economia a gente vê depois’”, acusou.

Também sobraram referências indiretas à sua retórica pró-cloroquina. Disse que o governo estimulou, “ouvindo profissionais de saúde”, o tratamento da Covid-19. Mas fez referência ao medicamento quando falou dos investimentos do governo em pesquisa e inovação. Afirmou que o governo destinou US$ 400 milhões para pesquisa, desenvolvimento e produção da vacina de Oxford no Brasil. E aí falou que, somente o insumo de hidroxicloroquina sofreu um reajuste de 500% no início da pandemia.

Ao mundo, Bolsonaro garantiu que não faltaram, nos hospitais, os meios necessários para atender os pacientes da Covid-19. E ponderou que a pandemia do coronavírus deixa como legado a importância de os países não dependerem de outras nações para a produção de vacinas e medicamentos para o combate a doenças. “A pandemia deixa a grande lição de que não podemos depender apenas de umas poucas nações para a produção de insumos e meios essenciais para nossa sobrevivência.”

Nesse contexto de inovação e pesquisa, o presidente da República disse que o Brasil está aberto para o desenvolvimento de “tecnologia de ponta e inovação”. “A exemplo da Indústria 4.0, da inteligência artificial, da nanotecnologia e da tecnologia 5G, com quaisquer parceiros que respeitem nossa soberania e prezem pela liberdade e pela proteção de dados”, afirmou.

Direitos humanos, Venezuela e democracia

O discurso de Bolsonaro na ONU contemplou ainda os esforços do governo no campo humanitário e nos direitos humanos. Para ele, o Brasil vem sendo referência internacional pelo “compromisso e pela dedicação no apoio prestado aos refugiados venezuelanos (...) que chegam ao Brasil a partir da fronteira no estado de Roraima”.

Ao comentar isso, fez críticas abertas ao ditador venezuelano, Nicolás Maduro. “A Operação Acolhida recebeu quase 400 mil venezuelanos, deslocados devido à grave crise político-econômica gerada pela ditadura bolivariana.”

As declarações sobre os refugiados venezuelanos eram esperadas. Na sexta-feira (18), o Brasil recebeu em Roraima o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo. Algum aceno a essa visita era esperado por interlocutores do presidente – especialmente depois das críticas que o governo sofreu por causa da visita de Pompeo.

Bolsonaro disse em seu pronunciamento nas Nações Unidas que, com a participação de mais de 4 mil militares, a Força-Tarefa Logística Humanitária busca acolher, abrigar e interiorizar as famílias de venezuelanos que chegam à fronteira.

Nisso, posicionou o Brasil como um país defensor da democracia, em crítica indireta à Venezuela. “Como membro fundador da ONU, o Brasil está comprometido com os princípios basilares da Carta das Nações Unidas: paz e segurança internacional, cooperação entre as nações, respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais de todos”, afirmou.

Bolsonaro também alfinetou Maduro quando falou do "criminoso derramamento de óleo venezuelano, vendido sem controle", que poluiu praias no Brasil em 2019. Na verdade, sabe-se que o petróleo que atingiu o litoral de vários estados do Nordeste, no ano passado, provavelmente era da Venezuela. Mas ainda não foi descoberto de qual navio ocorreu o vazamento – o que significa que não necessariamente a Venezuela seja responsável pelo acidente ambiental, pois o culpado seria a empresa dona da embarcação que transportava o óleo do país vizinho.

Críticas à "cristofobia" e acenos a Trump

Durante seu pronunciamento na ONU, Bolsonaro também fez acenos a seu eleitorado mais fiel. Eleito com um discurso de resgate de valores cristãos, ele manifestou claramente a defesa da democracia e de um de seus pilares, a liberdade religiosa. E pediu o combate à “cristofobia”.

“Na América Latina, continuamos trabalhando pela preservação e promoção da ordem democrática como base de sustentação indispensável para o progresso econômico que desejamos. A liberdade é o bem maior da humanidade. Faço um apelo a toda a comunidade internacional pela liberdade religiosa e pelo combate à cristofobia”, cobrou Bolsonaro.  “O Brasil é um país cristão e conservador, e tem na família sua base”, disse o presidente.

Outro aceno interno (e também externo) foi feito por Bolsonaro ao saudar nominalmente o presidente dos EUA, Donald Trump, que está em campanha eleitoral contra o democrata Joe Biden. Trump é admirado por apoiadores mais alinhados com o bolsonarismo. Além disso, os Estados Unidos são considerados hoje, pelo Planalto, o principal parceiro do Brasil.

“O Brasil saúda, também, o Plano de Paz e Prosperidade lançado pelo presidente Donald Trump, com uma visão promissora para, após mais de sete décadas de esforços, retomar o caminho da tão desejada solução do conflito israelense-palestino”, declarou.

O presidente brasileiro fazia referência ao recente acordo, mediado por Trump, que restabeleceu as relações diplomáticas entre Israel e duas nações árabes: Bahrein e Emirados Árabes Unidos.

Sobre Israel, Bolsonaro adotou pragmatismo no discurso e deixou claro que, em sua política externa, o Brasil busca aproximação simultânea com o governo israelense e os países árabes. “A nova política converge com essas iniciativas, que finalmente acendem uma luz de esperança para aquela região”, disse.

Fim da "tradição protecionista" no comércio externo

O discurso de Bolsonaro também contemplou referências à política comercial liberal defendida pelo governo. Ele garantiu que segue comprometido com a conclusão dos acordos comerciais firmados pelo Mercosul com a União Europeia e com a Associação Europeia de Livre Comércio. “Esses acordos possuem importantes cláusulas que reforçam nossos compromissos com a proteção ambiental”, disse.

Em alfinetada a governos anteriores, disse que o Brasil “finalmente abandona uma tradição protecionista”. “Passa a ter, na abertura comercial, ferramenta indispensável de crescimento e transformação.” Ele reafirmou o apoio à reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC), que, para Bolsonaro, “deve prover disciplinas adaptadas às novas realidades internacionais”.

O presidente deixou claro que o Brasil segue rumo ao alinhamento com os países mais desenvolvidos. Nesse contexto, disse que o Brasil está “igualmente próximo” do início do processo oficial de acesso do Brasil à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) – o "clube" de nações ricas. “Por isso, já adotamos as práticas mundiais mais elevadas em todas as áreas, desde a regulação financeira até os domínios da segurança digital e da proteção ambiental”, disse o presidente.

Dentro do contexto da abertura comercial, Bolsonaro fez um rápido balanço de algumas medidas econômicas aprovadas desde 2019, a exemplo da reforma da Previdência, que melhoraram o ambiente de negócios no Brasil.

Afirmou também que, recentemente, enviou ao Congresso as reformas tributária e administrativa. E comemorou a aprovação de duas reformas setoriais, a exemplo dos novos marcos regulatórios do saneamento e do gás natural. “Eles atrairão novos investimentos, estimularão a economia e gerarão renda e emprego.”

Bolsonaro ainda destacou que o Brasil foi, em 2019, o quarto maior destino de investimentos diretos em todo o mundo. E disse que, no primeiro semestre de 2020, apesar da pandemia, houve um aumento do ingresso de investimentos, em comparação com o mesmo período do ano passado. “Isso comprova a confiança do mundo em nosso governo", disse.

Por que um brasileiro sempre abre a assembleia da ONU

Bolsonaro foi o primeiro chefe de Estado a falar na abertura da 75.ª Assembleia Geral das Nações Unidas. A abertura desse encontro anual da ONU por um presidente brasileiro é uma tradição.

O costume não está previsto no estatuto das Nações Unidas. Mas é um reconhecimento ao Brasil, um dos fundadores e o primeiro a aderir à organização, criada em 1945. Dois anos depois, Oswaldo Aranha, ex-ministro da Justiça, Relações Exteriores e da Fazenda nas gestões de Getúlio Vargas, presidiu a primeira e a segunda sessão.

Com voto favorável do Brasil, a criação de Israel foi aprovada nas duas primeiras assembleias. Desde então, o chefe de Estado brasileiro sempre inaugura a Assembleia Geral, em reconhecimento à diplomacia conduzida por Aranha.

A fala do presidente brasileiro é sucedida pelo discurso do presidente dos Estados Unidos. Ao todo, 193 Estados-membros compõem a Assembleia Geral.

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