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Nações Unidas

Como é a relação do governo Bolsonaro com a ONU

Bolsonaro: críticas à ONU antes da posse; poucas mudanças depois. (Foto: Alan Santos/PR)

Antes de assumir a Presidência, Jair Bolsonaro sugeriu várias possibilidades de mudanças na política externa do Brasil que poderiam fazer o país bater de frente com a Organização das Nações Unidas (ONU). Até agora, porém, nenhuma transformação significativa foi levada às últimas consequências.

Nesta terça-feira (23), o presidente fará o discurso de abertura na assembleia-geral da ONU, em Nova York (EUA), onde deve adotar uma atitude conciliatória, diferente daquela que costumava demonstrar antes de ser eleito.

Em agosto de 2018, Bolsonaro chegou a dizer: "Se eu for presidente, eu saio da ONU". Na verdade, o então candidato se referia ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, órgão do qual os Estados Unidos saíram em junho do mesmo ano. Até o momento, no entanto, o Brasil não abandonou esse conselho.

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Outras ameaças feitas antes da posse ou no início do mandato não se cumpriram. O Brasil ainda não transferiu a embaixada de Israel de Tel Aviv (capital do país segundo a ONU) para Jerusalém, como se havia cogitado; não pediu revisão do Acordo de Paris sobre o clima; e continua seguindo a ONU ao não classificar o grupo libanês Hezbollah como terrorista.

"Apesar do discurso, não houve muita mudança. Por enquanto, o Brasil mantém a mesma linha de comportamento mais ou menos desde que a ONU foi criada", diz Demetrius Pereira, professor de relações internacionais da ESPM-SP.

Para o deputado estadual e cientista político Heni Ozi Cukier (Novo-SP), que já trabalhou no Conselho de Segurança da ONU, Bolsonaro não traiu suas promessas em relação à política externa, mas só readequou o discurso.

"Na maioria dos assuntos de política externa, ele manteve a posição que tinha. São assuntos sobre os quais ele não tinha total informação sobre todos os pontos de vista. Conforme ele vai percebendo as opções, vai se adequando à realidade. Ele vai descobrindo as nuances e os detalhes e recalibrando as posturas iniciais", afirma Cukier.

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Conselho de Segurança da ONU: vaga não é prioridade de Bolsonaro

Se, por um lado, o Brasil não parece querer romper vínculos com a ONU, também não tem atuado com especial empenho para fortalecer os laços.

O pleito por uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU, por exemplo, que era uma das prioridades da política externa dos governos PT, deixou de ser uma pauta importante do governo.

Em entrevista de março ao jornal Valor Econômico, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, afirmou sobre a questão que "a gente não está muito preocupado com isso".

Conselho de Direitos Humanos: participação de Damares

Depois que o presidente dos EUA Donald Trump anunciou que seu país sairia do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em junho de 2018, Bolsonaro indicou que poderia adotar a mesma linha.

O órgão é visto por alguns grupos como ideologicamente enviesado, especialmente por causa da frequência de resoluções contrárias a Israel. Além disso, entre as 47 nações que participam de suas decisões, estão países notoriamente violadores dos direitos humanos, como Arábia Saudita, Venezuela e Cuba.

No entanto, o Brasil ainda não indicou que pretenda sair do conselho e continua participando das suas reuniões. Em fevereiro, a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, liderou uma delegação brasileira numa reunião do conselho em Genebra (Suíça).

Para Heni Ozi Cukier, sair do órgão não ajudará a resolver os problemas relacionados a ele. "A melhor maneira de lidar com esses problemas não é não estando presente; é estando lá e se contrapondo. Se você sai, você não vai poder votar contra as decisões absurdas do Conselho de Direitos Humanos ou qualquer aberração que aconteça lá dentro. E a ONU não vai deixar de existir porque o Brasil ou os Estados Unidos saíram", diz.

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Acordo de Paris: sem mudanças nos termos

Bolsonaro sinalizou várias vezes que poderia tentar rever os termos do Acordo de Paris, que trata sobre as mudanças climáticas no mundo e propõe metas para diminuir o impacto negativo das atividades humanas sobre o meio ambiente.

O posicionamento brasileiro nessa área criou, por algumas semanas, um impasse para a concretização do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul. Mas, no fim de junho, o governo brasileiro confirmou que não exigiria mudança nos tratados climáticos.

Governo Bolsonaro segue sem reconhecer Jerusalém como capital de Israel

Desde que apoiou a criação do Estado de Israel, em 1947, a ONU considera que a capital do país é Tel Aviv, e não Jerusalém. Em 2009, uma resolução da ONU declarou que as ações de Israel para tentar impor suas leis sobre a cidade de Jerusalém "são ilegais e, portanto, nulas e sem validade".

Em 2017, à revelia da ONU, Trump reconheceu Jerusalém como capital de Israel. Esperava-se que Bolsonaro pudesse fazer o mesmo, com a transferência da embaixada brasileira de Israel de Tel Aviv para Jerusalém.

A única novidade nesse sentido, no entanto, foi a criação de um escritório comercial brasileiro na cidade de Jerusalém em conjunto com Israel.

Hezbollah: classificação da ONU ainda é parâmetro

A ONU não classifica o grupo libanês Hezbollah como terrorista. A possibilidade de o Brasil contrariar a organização nesse ponto foi levantada várias vezes após a eleição de Jair Bolsonaro e, mais recentemente, por causa de um decreto do presidente argentino Mauricio Macri, que classificou o grupo como terrorista. Mas, por enquanto, o Itamaraty não mudou sua posição e continua seguindo os critérios da ONU.

Troca de embaixador na ONU

A principal mudança concreta dos últimos meses na relação com a ONU foi a troca do embaixador que representa o Brasil no órgão.

Mauro Vieira, diplomata que ocupou cargos importantes no governo durante as gestões do PT e foi indicado pelo ex-presidente Michel Temer como embaixador do Brasil na ONU, foi substituído pelo diplomata Ronaldo Costa Filho às vésperas da assembleia-geral da ONU.

"A troca de embaixador na ONU pode representar uma nova relação. É um cargo político de prestígio, que já foi ocupado por vários ex-chanceleres", diz Demetrius Pereira

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