O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) vai se encontrar no próximo sábado (4) com o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, na edição de 2023 da Conferência Anual de Ação Política Conservadora (CPAC, na sigla em inglês), o maior evento conservador do mundo. O brasileiro tenta montar uma estrutura política internacional e criar uma aliança entre o PL e o Partido Republicano dos EUA.
Segundo um aliado próximo de Bolsonaro, que pediu para não ter o nome revelado, o objetivo é absorver boas práticas político-partidárias do Partido Republicano e replicá-las no Brasil. Esse seria o primeiro passo de um projeto de buscar experiências positivas em legendas de direita das principais democracias do mundo.
Assim, para além do PL, a conexão com o Partido Republicano serviria para a direita estabelecer uma "rede internacional de apoio mútuo", comenta o ex-secretário de Cultura da gestão de Bolsonaro, André Porciuncula. "A esquerda faz muito bem isso, já passou da hora de começarmos a fazer", destaca.
A ideia de Bolsonaro seria montar uma estrutura política internacional que permita manter engajada a militância conservadora no Brasil. Esse sistema operaria fora da jurisprudência nacional. Assim, em tese, a estrutura ficaria menos sujeita à insegurança jurídica que vem sendo provocada por tribunais superiores brasileiros dentro do país.
Mas, o trabalho seria feito sem "tanto barulho" e "holofotes" nas redes sociais. O foco seria atuar de maneira estratégica e organizada para dar suporte e fortalecer o movimento conservador no Brasil, segundo o aliado do ex-presidente ouvido pela reportagem.
A ideia geral de Bolsonaro e aliados filiados ao PL é promover uma aproximação do eleitor conservador ao partido. O presidente nacional da legenda, Valdemar Costa Neto, não faz objeção em investir na "base" e tem a meta de consolidar a sigla como a maior sigla da direita no Brasil. Para isso, ele até promoveu alterações ao programa partidário.
Alinhamento entre Trump, conservadores dos EUA e Bolsonaro divide PL
A proximidade entre Bolsonaro, Trump e o movimento conservador dos Estados Unidos divide o PL. Algumas lideranças e dirigentes são críticos, outros são indiferentes e outros favoráveis. O partido está dividido em três alas: uma mais pragmática e "municipalista", que é favorável a uma relação de neutralidade com Lula; uma conservadora, mas moderada e independente de Bolsonaro; e outra que deseja manter vivo o legado do ex-presidente.
Os mais críticos entendem que não é um alinhamento bem vindo para um partido que se propõe à construção de uma "oposição democrática" a Lula e seu governo. O argumento é de que a relação alimenta um nicho mais ideológico e minoritário do eleitorado conservador, e não o eleitor mediano, que é conservador, mas menos ideológico.
A ala mais moderada entre os conservadores se posiciona de maneira indiferente, embora defenda um estrito pragmatismo na relação com Trump e a direita nos Estados Unidos. Valdemar Costa Neto, por exemplo, entende que o movimento conservador é permanente e precisa ser estrategicamente explorado, desde que de maneira equilibrada e sem radicalismos.
Já os mais próximos do ex-presidente são, naturalmente, os mais entusiastas do alinhamento com Trump. O grupo avalia que o ex-presidente dos Estados Unidos ainda tem uma força política e popular expressiva e equiparável à de Bolsonaro. Esse capital político pode ser importante para a organização da estrutura política internacional planejada.
Discurso de Bolsonaro na CPAC terá a liberdade como tema
A conferência CPAC começou na quarta-feira (1º) em Washington, nos Estados Unidos, e vai até sábado (4). O discurso de Bolsonaro está previsto para o último dia do evento, às 15h10 (horário de Brasília, 13h10 em Washington), e deve durar cerca de 15 minutos.
Após sua fala, Bolsonaro vai permanecer no evento, onde irá se encontrar com o ex-presidente norte-americano Donald Trump, que faz o discurso de encerramento.
O encontro entre os dois ex-presidentes, bem como a presença e o espaço para o discurso de Bolsonaro, foram articulados pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). Ele também vai participar, como debatedor, de um painel intitulado "A ameaça vermelha chega às Américas" junto com o fundador do Movimento Viva México, Eduardo Verastegui, e com a coanfitriã da CPAC, Mercedes Schlapp.
A participação de Bolsonaro é comemorada com entusiasmo por aliados ouvidos pela Gazeta do Povo. A análise feita é de que a agenda reforça o ex-presidente como o "grande líder" da direita no Brasil. O encontro com Trump, por sinal, é fruto de uma articulação internacional para mostrar que a direita segue "viva e forte". Eles querem mostrar que continuarão representando os interesses do eleitorado conservador e não desistirão de seus países.
Ex-secretário especial de Cultura na gestão de Bolsonaro, André Porciuncula diz que o ex-presidente sempre ressalta a importância da liberdade em discursos. Ele diz acreditar que esse é, sem dúvidas, o tema mais importante e esperado na fala. "Vivemos uma era de graves violações às liberdades individuais, sempre enfeitadas por slogans vazios e palavras de ordem que a extrema-esquerda costuma repetir mimeticamente", comenta.
Porciuncula destaca, ainda, que o ex-presidente sempre foi uma "barreira institucional" contra as violações às liberdades. "Acredito que ele continuará reforçando esse ideal de liberdade como o ponto principal de qualquer política humana minimamente civilizada. Em tempos de duplipensar e novilíngua, dizer o óbvio é um ato de bravura. O presidente paga um preço muito caro por ser um defensor ferrenho da nossa liberdade", diz o ex-secretário fazendo referências à obra do escritor George Orwell.
CPAC oferece importante palanque para Bolsonaro como líder da direita
Um aliado diz que Bolsonaro seguirá "lutando" e "militando" pelas causas conservadoras, que participar da CPAC é um prestígio e prova que ele permanece como a grande liderança da direita. Em condição reservada, ele avalia que o discurso, a reunião com Trump e a presença no evento são oportunidades para recuperar o capital político, embora admita que não há, hoje, garantias de que ele será o candidato da direita nas eleições de 2026.
Outro aliado diz que é cedo para afirmar se Bolsonaro será ou não candidato às próximas eleições presidenciais. Mas, em condição de anonimato, pondera que o ex-presidente terá papel preponderante para a organização da direita e para a viabilização de candidatura de oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Já Porciuncula entende que a presença de Bolsonaro no maior evento conservador do mundo reforça que o ex-presidente é o líder político da direita nacional. "Afasta de vez essa conversa fiada de que ele será substituído em 2026. O encontro dele com o Trump será importante, os dois são os maiores representantes mundiais da direita. Os dois maiores estadistas de nossa época", opina.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) já adotou movimentos para lançar o pai à Presidência em 2026, como forma de consolidar o capital político atual. Mas, o próprio ex-presidente não negou a hipótese de apoiar algum candidato, caso se torne inelegível para a disputa das próximas eleições presidenciais. Ele até avalizou a construção de conversas nesse sentido.
O PL tem o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), como um potencial "plano B" para a disputa presidencial em 2026. Em caso de inelegibilidade, Bolsonaro não descartaria dar seu apoio, desde que ele participe do processo de construção e organização da direita, como almeja o presidente nacional de seu partido, Valdemar Costa Neto.
Ex-presidente pode voltar ao Brasil em março ou abril
A agenda de Bolsonaro na CPAC pode não ser a última nos Estados Unidos. Ele segue com compromissos até pelo menos o fim de março. Assim que concluir a programação, a promessa do ex-presidente é retornar ao Brasil, segundo disse para aliados no Congresso e para Valdemar Costa Neto.
A hipótese de os compromissos se estenderem até abril, porém, não está descartada. Segundo apurou a Gazeta do Povo, existe a possibilidade de uma agenda com o governador do Texas, Greg Abbott, com o senador Ted Cruz, e com outros membros do Partido Republicano e lideranças conservadoras.
Costa Neto admite a possibilidade de o ex-presidente retornar no próximo mês. "Eu acho que o Bolsonaro entra no ritmo daqui, no máximo, um mês ou um mês e meio. Acho que ele já vai estar aqui em abril, na minha opinião", declarou na quarta-feira (1º) a jornalistas após deixar uma reunião com a bancada do PL na Câmara dos Deputados.
Além disso, o jornal Orlando Sentinel informou na quarta-feira (1º) que Bolsonaro planeja fazer de Orlando sua base por pelo menos mais algumas semanas, enquanto o governo dos Estados Unidos processa seu pedido de visto. O advogado do ex-presidente, Felipe Alexandre, disse à reportagem que ele se mudou da casa onde estava, perto de Kissimmee, para um local não revelado.
Já a agência Bloomberg informou na segunda-feira (27) que o governo Lula deu até abril para o retorno de Bolsonaro ao Brasil e destaca que o ex-presidente enfrentará "muitos" processos judiciais em seu retorno dos EUA. Ele é investigado no inquérito que apura os responsáveis pelos atos de vandalismo em 8 de janeiro e no que apura suposto crime de genocídio contra o povo yanomami.
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