O deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) está tentando transformar um projeto do movimento social comandado por ele, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), em uma política pública. Trata-se das Cozinhas Solidárias, iniciativa que poderá fazer parte da lei que vai recriar o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). As Cozinhas Solidárias do MTST têm por objetivo distribuir comida de graça para pessoas em situação de vulnerabilidade.
O Projeto de Lei 2920/2023, relatado por Boulos, prevê a recriação do Programa de Aquisição de Alimentos, substituído em 2021 pelo Programa Alimenta Brasil durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
A proposição foi apresentada pelo governo federal há menos de um mês, depois do fracasso da medida provisória que tratava do tema e que não chegou a ser votada. Agora, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) impôs um ritmo acelerado à tramitação do projeto. Aproveitando os esforços da gestão petista para aprovar o PAA, Boulos incluiu as cozinhas solidárias no texto e tenta assim promover e beneficiar a iniciativa do MTST.
Além disso, ao propor a transformação do projeto das Cozinhas Solidárias do MTST em política pública de abrangência nacional, Boulos pode criar uma dificuldade para o andamento de projetos semelhantes já existentes em alguns municípios. É o que afirma a deputada federal Adriana Ventura (Novo-SP) em alteração proposta ao texto do projeto.
“Não podemos esquecer que já existem diversas iniciativas semelhantes em diferentes municípios, sob o amparo das suas competências constitucionais”, salientou. Para ela, com o escopo nacional do projeto, os municípios podem perder autonomia administrativa.
Projeto do MTST poderá receber recursos públicos e ser contratado sem licitação
O texto apresentado pelo deputado do PSOL prevê a dispensa de licitação na contratação de entidades como o MTST. No projeto, Boulos propõe uma alteração na Lei de Licitações que inclui a “contratação de entidades privadas sem fins lucrativos, para a implementação do Programa Cozinhas Solidárias” nas dispensas de licitação.
Em nota, no entanto, Boulos defende “que as cozinhas sejam geridas e operacionalizadas por meio de editais públicos, com ampla concorrência, incluindo a participação de diferentes entidades e instituições, incluindo igrejas e associações de bairro”. O procedimento de chamada pública é mencionado no projeto, mas somente no artigo que se refere ao regulamento do poder Executivo federal sobre a organização e implementação do Programa Cozinha Solidária, que será feito somente após a aprovação da lei.
Se a proposição for aprovada na forma do substitutivo apresentado por Boulos, as Cozinhas Solidárias do MTST também poderão receber recursos públicos para a compra de alimentos e o pagamento de pessoal.
Além das Cozinhas Solidárias, Boulos também prevê a dispensa de licitação para “implementação de cisternas ou outras tecnologias sociais de acesso à água para consumo humano e produção de alimentos”. As cisternas também fazem parte de projetos do MTST. Em março, Boulos gravou um vídeo para divulgar um projeto do coletivo Quebrada Agroecológica, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, em que explicava o funcionamento de uma cisterna e tratava o projeto como uma grande inovação.
As dispensas de licitação propostas por Boulos foram tema de emendas apresentadas ao texto por parlamentares. A deputada Adriana Ventura, por exemplo, busca limitar a dispensa de licitação no que diz respeito às Cozinhas Solidárias. A intenção dela é manter a dispensa apenas para municípios menores, com até 50 mil habitantes. “É fundamental ter a licitação como regra. É a forma de melhor alcançar resultados para o cidadão e para o contribuinte. [...] Não há justificativa para deixar de fazer licitação em municípios médios e grandes”, pontuou Adriana em sua justificativa.
Já o deputado Sargento Portugal (Podemos-RJ), por sua vez, tenta retirar a previsão de dispensa de licitação para a implantação das cisternas. “Haverá uma maior insegurança na execução do programa em razão da não realização de processo licitatório”, apontou o deputado na justificativa de sua emenda.
O parlamentar lembra ainda que já houve casos de escândalos na aquisição de cisternas pelo governo federal. “Um dos casos mais recentes foi divulgado pelo próprio Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), que está investigando desvio de recursos do programa cisternas nos últimos anos, entre os principais problemas apontados estão à falta de prestação de contas, além de superfaturamento”, disse Portugal.
Para a analista política e econômica pela FGV, Carol Curimbaba, a licitação e a fiscalização são pilares importantes na execução de políticas públicas que utilizem dinheiro público. “Independentemente do programa, é preciso que não se afrouxem os meios de fiscalizações. Dinheiro público tem que ter muita fiscalização, tem que ter muita transparência. Quando você não tem licitação, a coisa fica mais desordenada. Tem sim que ter licitação”, destacou a analista.
Boulos conta com apoio do PT para emplacar projeto do MTST em todo o país
Essa não é a primeira tentativa de Boulos de tentar emplacar o projeto das Cozinhas Solidárias em uma lei. Em fevereiro, no início de seu mandato como deputado federal, ele apresentou um projeto de lei para instituir as cozinhas solidárias em âmbito federal.
"É uma experiência extremamente exitosa de iniciativa social nos últimos anos. Desde a pandemia, as cozinhas solidárias distribuíram milhões de refeições por este país, muitas vezes sem qualquer apoio do poder público, para garantir alimentação das pessoas", disse o deputado.
Antes mesmo de apresentar o projeto de lei na Câmara dos Deputados, Boulos levou o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), Wellington Dias, para conhecer uma das Cozinhas Solidárias do MTST. Na oportunidade, Dias comentou a intenção de contribuir com o fortalecimento do projeto de transformar a experiência em política pública. “A ideia é fazer com que esse modelo da cozinha solidária, como é essa aqui do Sol Nascente, chegue onde as pessoas mais precisam. Aqui ninguém larga a mão de ninguém. Vamos fortalecer essa política”, garantiu o ministro.
“Saio daqui mais comprometido ainda. Eu sei do compromisso e da sensibilidade do presidente Lula. Ele não quer só a transferência de renda. Ele quer que as pessoas tenham uma comida boa”, enfatizou o titular da pasta ao finalizar a visita na à iniciativa do MTST, localizada na região do Sol Nascente, em Ceilândia (DF).
Projeto fortalecer possível candidatura de Boulos para a prefeitura de SP
Caso o projeto do PAA seja aprovado na Câmara com o trecho que trata das cozinhas solidárias, poderá garantir projeção nacional ao MTST e também fortalecer o nome do deputado do PSOL para as eleições do ano que vem. Boulos, que já concorreu ao cargo em 2020, deve se candidatar a prefeito de São Paulo mais uma vez em 2024. Ele deve contar com o apoio do PT, que tem sinalizado que o parlamentar será o candidato da esquerda.
Recentemente, membros do Partido dos Trabalhadores (PT) passaram a admitir que Ana Estela Haddad, secretária de saúde digital do Ministério da Saúde e esposa de Fernando Haddad, ministro da Fazenda, é um nome que está sob análise para ser a vice na chapa de Boulos nas eleições municipais de 2024.
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