A crise política e de saúde pública fez emergir um novo articulador político no Palácio do Planalto. O ministro-chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, ganhou força nos bastidores com as saídas dos ministros Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, e Sergio Moro, da Justiça e Segurança Pública. O general da reserva tem coordenado ações de resposta à pandemia do coronavírus e investido na articulação com o Congresso.
Avesso à exposição e pragmático no trato político, Braga Netto assumiu o protagonismo no governo. Ostenta status parecido com o de Paulo Guedes, a ponto de vencer uma queda de braço com o ministro da Economia ao lançar o programa Pró-Brasil, uma espécie de novo PAC. É visto como um conciliador nato que preza, acima de tudo, pela disciplina. Missão dada é missão cumprida.
O chefe da Casa Civil é o coordenador do gabinete de crise montado no Palácio do Planalto para acompanhar a situação e os efeitos do coronavírus no país. Supervisiona o trabalho de outros 15 ministros e representantes de seis autarquias do governo federal. A criação do gabinete foi uma resposta do presidente Jair Bolsonaro ao protagonismo do ex-ministro Luiz Mandetta nas primeiras semanas da crise sanitária.
Braga Netto passou a coordenar as coletivas de imprensa diárias para atualização de casos de Covid-19 no país. Os encontros eram uma iniciativa do Ministério da Saúde. Mas, com a escalada da tensão entre o presidente e Mandetta, as coletivas passaram a ser realizadas no Palácio do Planalto, sob coordenação do chefe da Casa Civil e sempre com a presença de mais ministros do governo para diminuir o protagonismo do então ministro da Saúde, que acabou demitido.
Durante as coletivas, Braga Netto chega a interromper os demais ministros enquanto eles respondem a perguntas dos jornalistas e é comum que o ministro-general passe bilhetinhos aos colegas durante o encontro com a imprensa. Tudo para evitar declarações desnecessárias e que possam gerar novos conflitos.
Braga Netto coordena resposta da economia
Também foi Braga Netto quem anunciou, no dia 22 de abril, um plano para recuperação da economia pós-coronavírus. O programa Pró-Brasil tem como objetivo gerar emprego e recuperar a infraestrutura do país em resposta aos impactos trazidos pelo combate ao novo coronavírus. A proposta terá sua implantação começando em larga escala a partir de outubro e deve movimentar mais de R$ 250 bilhões em investimentos em 10 anos, segundo o governo.
O anúncio foi feito sem a presença do ministro Paulo Guedes ou de algum técnico do Ministério da Economia. Braga Netto garantiu que o projeto tem apoio de toda a equipe ministerial. "Todos os ministros foram favoráveis ao programa. Sem nenhum problema", disse.
A equipe econômica, no entanto, vê o plano lançado por Braga Netto com ressalvas e é contra o aumento do gasto público. Guedes segue pregando a necessidade de manter a agenda liberal, com incentivos ao investimento privado. Uma hora antes do lançamento do Pró-Brasil, o secretário especial de Desestatização do Ministério da Economia, Salim Mattar, declarou que o Brasil não tem dinheiro público para investir.
Articulação com o Congresso nacional
Também coube ao ministro-chefe da Casa Civil atuar para uma aproximação de Bolsonaro com partidos influentes no Congresso Nacional — o bloco conhecido como Centrão, formado por legendas como DEM, PTB, PP, Solidariedade, PRB, PSD, MDB, PR, Podemos, Pros e Avante.
Em duas semanas, Braga Netto articulou reuniões entre o presidente e representantes de sete partidos do bloco. O objetivo é formar uma base governista na Câmara e no Senado num momento de fragilidade política do presidente Jair Bolsonaro e o governo está oferecendo, inclusive, cargos em troca de apoio.
De acordo com a Folha de São Paulo, o movimento de aproximação com o Centrão segue uma tática militar conhecida como "vencendo o inimigo pelo coração". O significado é que, para se conquistar um objetivo, deve-se ouvir as "necessidades das pessoas".
Braga Netto sinalizou aos líderes do Centrão que vai atender os pedidos do bloco. O presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, chegou a se referir ao general como "primeiro ministro" durante live com investidores promovida pela XP Investimentos, no dia 19 de abril.
Quem é o general Braga Netto
Braga Netto assumiu a chefia da Casa Civil em fevereiro deste ano, depois da saída de Onyx Lorenzoni, que foi para o Ministério da Cidadania. Em 2018, foi chefe da intervenção federal na segurança pública no Rio de Janeiro.
Nascido em Belo Horizonte, Braga Netto tem 62 anos e cumpre o "perfil mineiro": prefere o trabalho ao verbo. É conciliador ao extremo — agiu nos bastidores para tentar impedir a demissão de Luiz Henrique Mandetta e a saída de Sergio Moro. Não teve sucesso, mas ninguém pode acusá-lo de ficar com os braços cruzados.
Descrito como respeitoso, bem humorado e afável, o general é tido como capaz de reconhecer talentos e limitações próprias e de sua equipe. Ele não toma decisões tempestivamente.
Começou a carreira militar na Academia Militar das Agulhas Negras (RJ), onde se formou em 1978 aspirante a oficial da Cavalaria. Em 42 anos no Exército, trabalhou na Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, assessorou o ministro do Exército, coordenou pelo Exército os Jogos Olímpicos do Rio em 2016 e chefiou as principais unidades dos mais importantes postos militares do país, entre eles o Comando Militar do Leste, que abrange os estados do Sudeste. O general foi ainda observador militar das Nações Unidas no Timor Leste, e adido na Polônia e nos Estados Unidos. Tem pelo menos 25 condecorações nacionais e quatro no Exterior
O ministro gosta de mandar e, mais ainda, de ser obedecido. Ao assumir o comando da intervenção no Rio, que lhe concedeu poderes de governador do estado na área da segurança pública, em 2018, Braga Netto determinou a seus subordinados e pediu aos familiares discrição nas redes sociais. A gestão dele à frente das polícias fluminenses durou oficialmente de fevereiro a dezembro de 2018. Antes, já havia comandado operações de Garantia da Lei da Ordem na cidade do Rio.
Obteve sucesso ao conseguir reduzir a maioria dos índices de criminalidade, com destaque para as quedas no número de homicídios de civis e de policiais. Mas a morte da vereadora Marielle Franco (Psol), durante a intervenção, deixou uma mancha no currículo do general. O assassinato demorou a ser elucidado e até hoje pairam dúvidas sobre quem mandou matar a parlamentar carioca.
No início do governo Bolsonaro, Braga Netto chegou a ser convidado pelo ministro Sergio Moro para ocupar a Secretaria Nacional de Segurança Pública, mas recusou. Não havia chegado a hora de deixar o Exército. Essa decisão veio apenas no início deste ano, quando aceitou o convite para a Casa Civil e entrou para a reserva das Forças Armadas.
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