Bolsonaro e os demais líderes dos Brics, na cúpula do G20 no Japão: Xi Jinping (China), Putin (Rússia), Narenda Modi (Índia) e Cyril Ramaphosa (África do Sul).| Foto: Alan Santos/PR

Integrante dos Brics, o bloco das maiores economias emergentes, o Brasil convive nesse grupo com nações que se posicionam de modo oposto no cenário internacional em temas que são sensíveis ao governo Bolsonaro. Também são países que estão entre os principais adversários dos EUA, considerados o parceiro preferencial pelo governo brasileiro e com quem a atual gestão mantém um alinhamento ideológico.

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De todas as nações do G20, o grupo das 20 maiores economias do mundo, só cinco reconhecem o ditador Nicolás Maduro como presidente legítimo da Venezuela. Destas, três fazem parte dos Brics: África do Sul, China e Rússia (a Índia, o outro integrante do bloco, tem uma posição neutra em relação à Venezuela). Os russos inclusive mantém uma parceria militar estratégica com o regime de Maduro.

Já o Brasil tem sido uma das principais lideranças pela deposição de Maduro, juntamente com os EUA. Por sinal, os norte-americanos hoje estão numa guerra comercial contra os chineses, mantém uma relação histórica de atritos com os russos e também se afastaram recentemente dos indianos na área econômica.

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Como então o Brasil está lidando com parceiros de Brics, tão aparentemente desalinhados em relação a sua nova política externa? Com pragmatismo, ignorando as questões ideológicas ou tratando-as apenas marginalmente para priorizar as parcerias comerciais e estratégicas. Essa, aliás, é a orientação da diplomacia brasileira na reunião entre representantes dos Brics que ocorre nesta sexta-feira (26) no Rio de Janeiro.

Como o caso da Venezuela é visto nos Brics

Segundo uma fonte do Itamaraty que falou sob condição do sigilo, o impasse com a Venezuela não é um problema para a unidade do Brics porque os países do bloco não esperam concordância em assuntos de política externa.

Além disso, diz a fonte, há aspectos da situação da Venezuela sobre os quais os países estão de acordo, como o desejo de estabilidade, de recuperação econômica e do bem-estar da população venezuelana.

Já houve uma conversa sobre a Venezuela entre o vice-chanceler da Rússia, Sergei Ryabkov, e o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Ernesto Araújo, quando o diplomata russo veio ao Brasil, em março. Mas, na reunião do Rio, é pouco provável que a questão venezuelana ganhe relevância nas discussões.

Uma motivação básica para o interesse da Rússia e da China em que Maduro continue no poder é financeira: ambas as nações investiram muito na Venezuela de Maduro. No caso da Rússia, por causa de algumas ajudas e empréstimos, o país teria direito a partes significativas de cinco campos de petróleo na Venezuela.

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Como é a relação dos países dos Brics com os EUA

Outra discrepância do atual governo brasileiro com o resto dos Brics está na relação com os EUA. O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Ernesto Araújo têm forte alinhamento ideológico com os líderes norte-americanos atuais, o que torna o Brasil uma exceção no bloco.

China e Rússia, além das divergências históricas com os EUA, têm tido uma relação de morde e assopra com a gestão de Donald Trump: ora ensaiam tréguas, ora trocam farpas.

Por exemplo: no fim de junho, em reunião com o presidente chinês Xi Jinping, Donald Trump sugeriu uma possibilidade de solução para a guerra comercial entre os dois países. Mas, no último dia 15, o presidente norte-americano insinuou no Twitter que a desaceleração econômica da China comprovaria o sucesso de sua estratégia protecionista em relação aos produtos chineses.

A relação da Índia com a gestão Trump também não é tranquila. Há algumas semanas, os indianos perderam o status comercial especial que tinham com os EUA, que os isentavam de tarifas na exportação para os americanos. Em resposta, a Índia impôs tarifas mais altas para alguns produtos oriundos dos Estados Unidos.

Divergências podem prejudicar relação do Brasil com o resto dos Brics?

Mesmo com posições tão distintas em relação a EUA e Venezuela, o Brasil não terá dificuldades de negociar com o Brics, diz a mesma fonte do Itamaraty.

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"Não há oposição nem incompatibilidade entre a atuação do Brasil nos Brics e as nossas relações com os EUA. O Brasil tem uma política externa universalista. Nenhum país do Brics espera do outro plena concordância em assuntos de política externa. A cooperação na diversidade é uma das forças dos Brics."

Sobre um possível abrandamento do interesse brasileiro nos Brics por causa da relação mais estreita com os EUA, a fonte diz que os Brics continua sendo uma "prioridade". "É um foro de países importante com uma agenda de cooperação consistente."

Outras pautas do Brasil com os Brics

Em vez de tocar em assuntos polêmicos, a reunião do Rio de Janeiro servirá sobretudo para que os países avancem em questões de consenso na área comercial.

Os temas prioritários da presidência em vigência do Brasil no bloco são: ciência e tecnologia, inovação, economia digital e o banco dos Brics, o Novo Banco de Desenvolvimento, que ganhará um escritório regional em São Paulo em breve.

Outro assunto de interesse do Brasil é o combate aos ilícitos transnacionais, especialmente nas áreas de contraterrorismo, anticorrupção e recuperação de ativos.

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Na área de ciência e tecnologia, os Brics estão criando uma rede de cooperação chamada de iBrics, cujo objetivo é estimular a parceria entre incubadoras e médias empresas. A rede passará a existir formalmente a partir da Cúpula dos Brics, que neste ano ocorrerá em Brasília nos dias 13 e 14 de novembro.