O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criou uma comissão de juristas para sugerir mudanças na Lei de Lavagem de Dinheiro, em vigor desde 1998. Na prática, a discussão poderá levar ao afrouxamento da lei, impedindo a interpretação de que o crime de caixa 2 eleitoral pode caracterizar lavagem.
A discussão ocorre após a Operação Lava Jato enquadrar diversos políticos por esse crime, tendo como base repasses de empresas durante campanhas eleitorais. Como os recursos do caixa 2 são ocultados por doadores e recebedores do dinheiro, procuradores e juízes vêm entendendo que se trata de lavagem.
Isso implica em pena maior. Enquanto o crime de lavagem tem pena que varia de 3 a 10 anos de prisão, o caixa 2 costuma ser tipificado como falsidade ideológica pela Justiça Eleitoral, que prevê punição menor, de 1 a 5 anos de reclusão.
O objetivo da comissão da Câmara é delimitar o crime de lavagem, estabelecendo parâmetros para definir se a tipificação penal inclui o caixa 2 das campanhas. Ou seja, na prática a comissão pode mudar a jurisprudência que vem sendo estabelecida para definir de modo expresso que o caixa 2 não é lavagem de dinheiro.
O grupo também deve tratar da lavagem de dinheiro por meio de criptomoedas e pelo pagamento de honorários advocatícios.
A lavagem de dinheiro é uma prática utilizada para encobrir a origem de recursos ilegais. Consiste em um esquema para fazer parecer que quantias obtidas por meio de atividades ilegais vieram de atividades lícitas.
A última vez em que a Lei da Lavagem de Dinheiro havia sofrido mudanças foi em 2012.
Maia:"alargamento" do crime de lavagem de dinheiro causa insegurança eleitoral
Ao criar a comissão, em despacho assinado no último dia 8, Rodrigo Maia apontou "a problemática concernente ao crime de lavagem de dinheiro e ao denominado caixa 2 eleitoral, o qual produz decisões judiciais conflitantes e traz insegurança ao processo eleitoral".
"Decisões judiciais têm promovido um alargamento do tipo objetivo do crime de lavagem, contrário à lei e em afronta ao princípio da subsidiariedade do direito penal, promovendo condenações em casos que extrapolam a previsão legislativa", justificou Maia.
O grupo que vai discutir a revisão na lei é formado por 19 integrantes, entre ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), advogados e uma parlamentar aliada de Maia – a deputada Margarete Coelho (PP-PI).
A previsão inicial é a de que a comissão conclua os trabalhos em 90 dias, prazo que poderá ser prorrogado a pedido do presidente do grupo, o ministro do STJ Reynaldo Soares da Fonseca.
"O leito normal para discussão da necessidade de alterações é o Parlamento, não é o Judiciário. É preciso lembrar que a lavagem de dinheiro, no Brasil, por ano, alcança cerca de R$ 6 bilhões. É um crime com um perfil mais recente dentro dos ordenamentos jurídicos", argumenta Fonseca.
Para a deputada Margarete, a lei de hoje "não tem dado conta" dos desafios que precisa enfrentar. "Tanto é que o Judiciário está 'elastecendo' muito o campo de atuação da lei. A questão eleitoral, do caixa 2, não consta da legislação atual", afirma ela.
"Lavagem continuada" é outra possível discussão
Um dos principais pontos em discussão é se o crime da lavagem de dinheiro possui ou não "natureza permanente", ou seja, se é continuado e ocorre durante todo o período em que o bem permanecer oculto. A questão é essencial para a contagem dos prazos de prescrição.
Em maio de 2017, por exemplo, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que, enquanto houver movimentação de dinheiro oriundo da lavagem de dinheiro, o crime está sendo cometido.
Foi esse entendimento que permitiu a condenação do então deputado Paulo Maluf a 7 anos, 9 meses e 10 dias de prisão por lavagem de dinheiro. Maluf foi condenado por ter desviado recursos da prefeitura de São Paulo, quando era prefeito, de obras tocadas pelo Consórcio Águas Espraiadas. A defesa alegava que o ato estava prescrito porque o dinheiro teria sido enviado ao exterior em 1998.
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