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Concessão de rádio e TV

Canal do PT na TV aberta pode violar princípios da moralidade e isonomia

(Foto: Unsplash)

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O pedido do Partido dos Trabalhadores para ter um canal na TV aberta e no rádio deve parar na Justiça. Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo afirmam que, embora não haja nenhuma lei proibindo a legenda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de fazer a solicitação, uma "TV PT" em canal aberto poderia violar os princípios da isonomia e moralidade.

Esta é a primeira vez que um partido político solicita ao Executivo sua própria concessão pública e a novidade gerou, além de críticas da oposição – principalmente por se tratar do partido do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva – muitas dúvidas sobre a legalidade do pedido.

O advogado especialista em direito civil, André Viana avalia não haver ilegalidade à primeira vista, mas diz estranhar o pedido, já que a concessão é pública e geralmente entregue pelo governo a entidades privadas, ou mesmo fundações e igrejas.

Acostumado aos processos de concessões públicas, Viana explica que as regras para conseguir uma emissora de rádio ou TV seguem as mesmas definidas pela Lei de Licitações e que, a partir da vontade expressa pelo PT, o Ministério das Comunicações precisa abrir concorrência para ver se há outros interessados na faixa pretendida pelo partido político.

"Se eu vou ter um canal de TV aberta específico para minha ideologia político-partidária eu vou ter problemas por não trazer exemplos de outras ideologias e ainda a questão da concessão não atender ao cunho social para o qual foi criado", afirma Viana.

Segundo o especialista, a lei determina que a TV aberta tenha caráter de educação, informação e entretenimento, o que não condiz com a mera transmissão de ideologias partidárias.

A utilização do fundo partidário para investimento em emissoras de rádio e TV também deverá ser outro ponto de questionamento na justiça, de acordo com o especialista em direito eleitoral Alberto Rollo. “É interesse público usar essa verba para manter uma concessão de TV? Quem vai pagar essa conta? É para isso que serve o fundo partidário?”, pergunta ele.

O jurista Fabrício Rebelo lembra que a concessão pública equivale a ato administrativo e, portanto, tem como um dos princípios a moralidade, por isso acredita que a intenção do PT de ter uma emissora de televisão aberta poderá ser questionada até no Supremo Tribunal Federal (STF).

“Essa questão já gera uma nova discussão, é possível se discutir se não viola o princípio constitucional da moralidade a utilização de verba pública para que um partido possa adquirir uma concessão de um outro serviço público”, afirma o jurista.

Segundo ele, pelo caráter de ineditismo, o pedido da TV PT deve mesmo acabar nas mãos da Suprema Corte, que teria que definir uma tese sobre a possibilidade ou não desse tipo de concessão pública.

Além disso, Fabrício Rebelo levanta mais uma questão: como ficaria a concessão durante a campanha eleitoral? Segundo ele, se candidatos que têm vida pública precisam se afastar, caso de apresentadores de TV, inclusive, como seria viável o funcionamento de uma televisão controlada por um partido político?

O advogado eleitoral Rodrigo Queiroga, por outro lado, afirma que não vê problema no pedido de concessão, que seria “mais uma questão moral do que legal". "Se você for trabalhar no aspecto econômico é outra situação, ele [partido] não pode ter uma emissora com o objetivo de ter lucro. E no aspecto moral a questão da parcialidade, se eu tenho um canal ele tem que ser imparcial”.

Concessão também pode ser barrada pelo Congresso

A Constituição brasileira estabelece que cabe à União explorar diretamente ou mediante concessão os serviços de rádio e TV. Isso significa que o detentor de uma concessão de rádio ou de televisão não é o dono daquele negócio, mas está apenas autorizado a explorá-lo por tempo determinado –10 anos no caso do rádio e 15 no caso da TV.

Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.

Apresentado o pedido ao ministério das Comunicações, é feita uma análise técnica para inclusão do canal e, se o requerimento estiver de acordo com a legislação, o pedido é enviado à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) para realização de estudo de viabilidade técnica, para inclusão do canal requerido no Plano Básico de Distribuição de Canais de Televisão Digital – PBTVD. Se constatada a viabilidade técnica, a Anatel segue com as etapas para inclusão do canal. Não há um tempo determinado para a análise.

Cumpridos os requisitos, o pedido de concessão segue para avaliação do Congresso Nacional, onde deverá ser elaborado e aprovado Projeto de Decreto Legislativo sobre a outorga. Somente depois disso o texto segue para o Executivo.

A TV do PT

No pedido apresentado ao Ministério das Comunicações, o Partido dos Trabalhadores alegou que a TV do PT complementaria as ações de comunicação do partido, já estruturadas em diversos canais como YouTube, redes sociais (Facebook, Instagram, Telegram, WhatsApp), Spotify, rádios online (Rádios PT e PT Cast), sites de diretórios, além de outros meios de divulgação do partido.

Os canais de comunicação já utilizados pela sigla servem principalmente para divulgar as ações e ideologias, com a transmissão de "lives" de eventos, informes e notícias sobre programas e do governo Lula.

Recentemente, por exemplo, as redes petistas divulgaram a visita do ditador venezuelano Nicolás Maduro ao Brasil e as ações promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, como a que disse que integrantes da direita "armaram" diligência em invasão para supostamente desmoralizar o movimento.

O deputado federal Jilmar Tatto, também secretário de Comunicação do PT, disse que “a concessão vai ajudar a difundir as nossas ideias e propostas da militância”.

Levantamento realizado pelo PT aponta que atualmente existem 49 canais vagos pelos estados brasileiros e com possibilidade de concessão pelo Ministério das Comunicações.

Reações contrárias

O primeiro questionamento judicial contra a vontade do PT de ter a sua televisão aberta já foi feito pelo partido Novo. Para a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), a pretensão pode ser classificada como um "disparate".

“Não me causa nenhum espanto que o PT queira um canal próprio de TV. Se pensar num canal, junto com o PL das Fake News, percebe-se que Lula quer controlar a narrativa”, opina.

Para a parlamentar, a ideia do Partido dos Trabalhadores demonstra a intenção de reescrever a história de maneira própria. “Querer que um partido com o histórico do PT tenha seu próprio canal fere a isonomia. Isso é abuso de poder, e expressa autoritarismo”, acrescenta a deputada.

Adriana Ventura disse ainda que "não tem cabimento financiar rádio e TV com dinheiro do povo, já que os partidos são sustentados pelo fundo partidário, ou seja, com recursos públicos".

Guta Pini, do movimento Olho no Congresso Brasil e articulista do Boletim da Liberdade, também manifestou indignação com o pedido do PT para ter uma televisão própria, que classifica como uma “imoralidade".

Além disso, Guta afirma que a TV do PT viola o princípio da isonomia, ao desrespeitar a igualdade de oportunidades entre os partidos políticos. “Tal medida garantiria a supremacia de um partido em detrimento dos demais e com o aval do Estado, o que é inaceitável em uma democracia”.

O deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) também anunciou que entrou com representações no Tribunal de Contas da União (TCU) e na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e que ser for necessário irá também à Justiça para impedir que o PT tenha um canal próprio de TV aberta.

Sampaio lembra que isso ocorreu na Venezuela do ditador Maduro, que primeiro criou uma TV, depois fechou os demais canais. “Seguimos atentos e diligentes para impedir que o nosso país afunde nas mãos do Lula”, afirmou.

Protestos nas redes

A coordenadora do Olho no Congresso, Cristina Leal, diz que o movimento fará protestos contra a TV do PT nas redes sociais. “Um absurdo, se cada partido que estiver no governo resolver montar sua emissora de rádio e TV não há democracia verdadeira que possa resistir”, ressalta.

Cristina lembra as eleições de 1990, quando o apresentador Sílvio Santos teve a candidatura rejeitada pelo Tribunal Superior Eleitoral, justamente por ser dono de uma emissora de TV.

O deputado Federal Kim Kataguiri (União-SP) também usou as redes sociais para criticar a pretensão do PT a uma concessão pública de TV. Kataguiri ironizou o pedido e chegou a sugerir nomes para futuros programas, como “Mais Petê” e “Um Maduro no Pedaço”.

Marcos Pollon (PL-RS), disse na CNN que quando ouviu sobre o pedido chegou a pensar que era “meme”. Ele ainda perguntou: “Qual será o próximo passo agora? Fazer o Super Lula, como Maduro fez na Venezuela?”, questiona, referindo-se ao personagem criado pela TV estatal venezuelana, Super Bigote.

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