Cinco mandados de busca e apreensão e um de prisão preventiva foram cumpridos em São Paulo e no Distrito Federal nesta quarta (2) pela Operação 3FA da Polícia Federal. A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e o hacker Walter Delgatti foram dois dos alvos, além de dois ex-assessores da parlamentar e um auxiliar do técnico.
Carla Zambelli teve mandados de busca e apreensão cumpridos em seu gabinete no Congresso, no apartamento funcional em Brasília e em outro em São Paulo. Já Delgatti foi o alvo do mandado de prisão preventiva, cumprido em Araraquara (SP).
De acordo com as informações oficiais divulgadas pela Polícia Federal, a operação teve como objetivo de “esclarecer a atuação de indivíduos na invasão aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e na inserção de documentos e alvarás de soltura falsos no Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP)”.
“As ações ocorrem no escopo de inquérito policial instaurado para apurar a invasão ao sistema do CNJ, que tramitou perante a Justiça Federal, mas teve declínio de competência para o Supremo Tribunal Federal (STF) em razão do surgimento de indícios de possível envolvimento de pessoa com prerrogativa de foro”, completou a PF.
A deputada negou qualquer envolvimento no esquema e disse que a única relação que tinha com Delgatti foi para a contratação de serviços de tenologia para o seu site pessoal.
Segundo a investigação, os crimes teriam ocorrido entre os dias 4 e 6 de janeiro de 2023, quando dados falsos teriam sido inseridos no sistema do CNJ e, possivelmente, de outros tribunais do Brasil. “Onze alvarás de soltura de indivíduos presos por motivos diversos e um mandado de prisão falso em desfavor do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes”, afirma a autoridade.
As supostas inserções fraudulentas teriam ocorrido após uma invasão aos sistemas, com o uso de credenciais falsas obtidas de forma ilícita, “conduta mediante a qual o(s) criminoso(s) passaram a ter controle remoto dos sistemas”. Os fatos investigados configuram, em tese, os crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica.
Segundo as investigações da PF, Delgatti teria recebido R$ 13,5 mil da deputada para invadir os sistemas do CNJ, em transações financeiras por PIX feitas por dois assessores dela.
Buscas e quebra de sigilo bancário
Os mandados foram expedidos pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e cumpridos em São Paulo (dois de busca e apreensão e um de prisão preventiva) e no Distrito Federal (três de busca e apreensão), além de análise do material apreendido.
Entre os materiais alvos da autoridade nos endereços de Carla Zambelli estão telefones celulares, tablets, outros dispositivos eletrônicos, documentos relacionados à investigação, armas, munições e o passaporte.
Já Delgatti foi preso pela terceira vez pela Polícia Federal. Ele ficou conhecido como "hacker da Vaza Jato" por invadir telefones celulares de autoridades envolvidas com a Operação Lava Jato, sendo conduzido à prisão anteriormente em junho deste ano e em julho de 2019 durante a Operação Spoofing, em que investigações apontaram o acesso a contas do aplicativo de mensagens Telegram.
Delgatti estava em liberdade condicional desde o dia 10 de julho com o uso de tornozeleira eletrônica.
Além dos mandados de busca e de prisão, Moraes também determinou, segundo despacho obtido pela Gazeta do Povo, a quebra do sigilo bancário de Delgatti, de Carla Zambelli e mais três pessoas: Jean Vilela e Renan Goulart, ex-assessores da deputada, e Thiago Eliezer, que trabalhava com o hacker e teria feito efetivamente a invasão aos celulares de autoridades descoberto pela Operação Spoofing. A empresa de Delgatti, a Delgatti Desenvolvimento de Sistemas, também teve o sigilo bancário suspenso.
Moraes determinou que os bancos encaminhem os dados ao STF em até 30 dias a partir do recebimento do comunicado da decisão judicial.
Delgatti diz que Zambelli pediu invasão às urnas
Em depoimento à PF na prisão de junho, Delgatti disse que teria sido demandado por Carla Zambelli, em setembro de 2022, às vésperas da eleição, para tentar invadir a urna eletrônica ou qualquer sistema da Justiça com a intenção de mostrar a fragilidade dos dispositivos. No entanto, ele disse que não conseguiria acessar a urna pelo código-fonte não estar conectado a um computador em rede.
A deputada teria pedido a ele para acessar o celular e o email de Alexandre de Moraes, mas que também não teria encontrado nada de comprometedor em uma invasão anterior, em 2019. Delgatti teria sugerido, então, o acesso ao sistema do CNJ e a emissão do mandado de prisão falso em desfavor do magistrado.
Delgatti mencionou, ainda, que foi levado por Carla Zambelli para um encontro com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Palácio da Alvorada, em agosto de 2022. A reunião, no entanto, foi negada pela deputada e por Bolsonaro.
Em uma entrevista coletiva na Câmara dos Deputados no final da manhã, Carla Zambelli negou qualquer envolvimento com a invasão aos sistemas do CNJ, e disse que contratou Walter Delgatti apenas para prestar serviços de tecnologia para melhorar o seu site pessoal.
De acordo com ela, houve o encontro de Delgatti com Bolsonaro (negado anteriormente) para explicar sobre a segurança das urnas eletrônicas, mas que nenhum pedido de invasão foi feito.
Um pouco mais cedo, a defesa da parlamentar disse, em uma nota, que a operação da PF foi recebida "com surpresa", já que teria se colocado à disposição para prestar todas as informações necessárias. "E, em nenhum momento, a parlamentar deixou de cooperar com as autoridades".
"Respeita-se a decisão judicial, refuta-se a suspeita que tenha participado de qualquer ato ilícito e, por fim, a deputada Carla Zambelli vai aguardar com tranquilidade o desfecho das investigações e a demonstração de sua inocência", disse.
Já o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, considerou a operação como uma "barbaridade" e que as autoridades "não respeitam os deputados que têm imunidade".
"Isso não tem como acabar bem. Invadiram a casa do ex-presidente da República. É uma perseguição contra o PL, que não entendo como o Poder Judiciário não enxerga que isso não tem como acabar bem", disse em entrevista à CNN Brasil.
Pelas redes sociais, o ministro Flávio Dino, da Justiça, justificou a operação deflagrada pela Polícia Federal.
"Em prosseguimento às ações em defesa da Constituição e da ordem jurídica, a Polícia Federal está cumprindo mandados judiciais relativos a invasões ou tentativas de invasões de sistemas informatizados do Poder Judiciário da União, no contexto dos ataques às instituições", disse.
O nome da operação, 3FA, faz uma alusão à "autenticação de dois fatores (2FA), método de segurança de gerenciamento de identidade e acesso que exige duas formas de identificação para acessar recursos e dados".
Delgatti foi levado por Carla Zambelli ao PL
Em meados de julho, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, disse que Carla Zambelli levou Delgatti à sede do partido, em Brasília, para prestar trabalhos à legenda.
"Ela levou ele lá porque ele pediu, ela quis ficar bem com ele. Ele pediu: 'me leva no Valdemar', insistiu com ela. Quando ela levou o hacker para falar comigo, deixou bem claro: 'Valdemar, estou trazendo aqui porque ele pediu para vir aqui porque ele quer conversar com você'", disse em entrevista à GloboNews.
Costa Neto afirmou, ainda, que Delgatti teria dito que "entrava no telefone de todo mundo" e que faria o que o PL "precisar". O presidente do partido teria dito que não poderia contratá-lo: "eu não posso te contratar. Eu gostaria de ter uma pessoa como você aqui para poder ajudar a gente".
Zambelli, no entanto, teria acenado contra a contratação.
Análise no Conselho de Ética
Além da operação da Polícia Federal, Carla Zambelli terá uma representação analisada pelo Conselho de Ética da Câmara dos Deputados nesta quarta (2).
A parlamentar é alvo de uma representação apresentada pelo PSB (veja na íntegra) e tem como relator o deputado João Leão (PP-BA). O partido acusa a deputada de quebra de decoro parlamentar por ter xingado e constrangido o deputado Duarte (PSB-MA) durante audiência com o ministro Flávio Dino no dia 11 de abril.
O comportamento, segundo o PSB, "reduz o Parlamento a uma roda de conversas informais, onde qualquer pessoa pode ofender sem ser repreendido". A representação acrescenta que a imunidade parlamentar é uma proteção à democracia e não deve ser usada de forma "imoral e zombeteira".
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