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O embaixador Celso Amorim, assessor para assuntos especiais do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou que o Brasil não pode endurecer a posição contra a Venezuela por conta da própria divisão que o país já enfrenta, e que é preciso dosar o tom para ajudar na pacificação e não agravar a própria situação por lá.
Amorim tem sido o principal conselheiro de Lula para orientar sobre qual caminho tomar para se posicionar a respeito da reeleição questionada de Nicolás Maduro. A posição oficial do Brasil tem sido a de exigir as atas de votação que comprovem o alegado resultado da eleição venezuelana antes de reconhecer a vitória do ditador.
“A questão não é endurecer, é de falar a coisa certa que ajude na pacificação. [...] A questão é de tentar criar um diálogo. A Venezuela é um país muito dividido, se nós não agirmos com correção, a possibilidade de agravamento é muito grande”, disse em entrevista à GloboNews nesta quarta (7).
Amorim afirmou, ainda, que a "situação é tão complexa, tão difícil, e a divisão é tão profunda que nós temos que ter capacidade de inovar [que] passa por um diálogo profundo que envolva as duas partes. Qualquer que seja o resultado da eleição, Maduro [ainda] é presidente pelos próximos seis meses".
O embaixador ressaltou o discurso conjunto de Lula com os presidentes da Colômbia, Gustavo Petro, e do México, Lopez Obrador, que assinaram uma carta cobrando de Maduro as atas detalhadas das zonas de votação – com o apoio da União Europeia.
Lula, Petro e Obrador devem fazer uma ligação em conjunto para Maduro ainda nesta quarta (7) ou na quinta (8) para expressar o pedido da carta e pressionar pela divulgação das atas e fim da repressão à oposição.
"Mais importante do que o telefonema para o Maduro [...] é o entrosamento com o México e a Colômbia. Emitiram uma nota importante, foi incluída e mencionada pelo porta-voz da Casa Branca como prova dos esforços para continuar com o diálogo sobre as atas", completou Amorim.
"Se não aparecerem as atas, isso é condenável, indiscutivelmente. Agora, acho que vai ter que ter um diálogo e o Brasil pode ajudar de preferência não sozinho", pontuou ressaltando que não é possível impor uma decisão de fora ao país, e que a solução precisa ser encontrada pela própria Venezuela.
Amorim afirmou, ainda, que a União Europeia deveria ter pressionado Maduro para enviar observadores para acompanharem a eleição no país.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, chegou a ligar para Lula para pressionar Maduro a divulgar as atas, utilizando o petista como interlocutor com o regime chavista. No entanto, o país resolveu se posicionar e reconhecer a vitória de Edmundo González alegando que examinou as atas divulgadas pela oposição..
Amorim foi enviado a Caracas por Lula no último dia 28 de julho para acompanhar a votação, enquanto que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desistiu de mandar dois técnicos que iriam observar o processo eleitoral. O recuo ocorreu após Maduro questionar a lisura das urnas eletrônicas brasileiras, acusando de não serem passíveis de auditoria.
Lula, no entanto, não comentou a fala de Maduro contra o sistema eleitoral brasileiro. Dias depois, ele relativizou a fraude na eleição venezuelana, afirmando que “nada de anormal” aconteceu e que estaria “convencido” de que o processo eleitoral foi “normal” e “tranquilo”.
Celso Amorim diz que as "eleições em si transcorreram com calma", e que depois ficou sabendo sobre restrições sofridas por alguns fiscais partidários. "É lamentável que as atas não tenham aparecido", completou.
No dia seguinte à votação, que proclamou a reeleição de Maduro ainda durante a madrugada, Amorim se reuniu com o candidato da oposição, Edmundo González, e com o próprio ditador, mas o teor das conversas não foi divulgado.
A negociação que pode ter sido aberta, no entanto, não gerou resultados e Maduro endureceu a repressão à oposição. Na última noite, a coordenadora da campanha de Maria Corina Machado, María Oropeza, foi sequestrada pelas forças do regime sem mandato. Ela filmou a chegada dos agentes e divulgou nas redes sociais.
A dificuldade de se avançar no impasse sobre a eleição venezuelana foi também um dos temas da reunião privada que Lula teve com o presidente do Chile, Gabriel Boric, na última segunda (5). Embora não seja confirmada por fontes oficiais, o petista mencionou veladamente a situação da Venezuela durante o pronunciamento conjunto com o mandatário chileno.
“O respeito pela tolerância, o respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados. O compromisso com a paz é que nos leva a conclamar as partes aos diálogos e promover o entendimento entre governo e oposição”, disse Lula.
Boric, pouco depois, emendou e afirmou que é “difícil de acreditar” no resultado das eleições venezuelanas.