A megaoperação do Censo 2020, que seria o mais amplo estudo já realizado no país, pode sofrer uma redução de até 25% no orçamento, inicialmente estimado em R$ 3,4 bilhões pelo IBGE. A pressão parte do governo, mais especificamente do ministro da Economia, Paulo Guedes, que chegou a declarar que “quem pergunta demais acaba descobrindo coisa que nem queria saber”, em fevereiro, na cerimônia de posse da nova presidente do órgão, Susana Cordeiro Guerra.
Agora, em abril, o instituto anunciou que tem o objetivo de realizar uma pesquisa muito custosa e revisa o orçamento para reduzir em um quarto a previsão de gastos – o que daria R$ 850 milhões a menos. Mas o que isso significa?
Por enquanto, o IBGE não tem essa resposta. Apenas garante que vai garantir a qualidade da pesquisa sem perda de informação. A operação inicialmente prevista contaria com a contratação de 250 mil trabalhadores temporários, inclusive os recenseadores que ficariam responsáveis pela coleta de dados.
O questionário brasileiro tem cerca de 150 perguntas – reduzir o número de questões foi uma sugestão de Guedes, como forma de otimizar o trabalho de cada recenseador. Ou ainda reduzir a amostragem, ou seja, a quantidade de pessoas entrevistadas. O problema, no entanto, é bem mais complexo.
Pesquisa densa
O professor Paulo Bracarense, do Departamento de Estatística da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pondera que nas condições atuais do IBGE será difícil realizar a pesquisa. Ele comenta que a previsão inicial de contratação de recenseadores já é apertada – supondo que fossem 240 mil contratados temporários para essa função, haveria uma média de 50 profissionais para cada cidade do Brasil.
Bracarense lembra que o pré-censo de 2020 foi feito na cidade de Poços de Caldas (MG). O município, que tem 170 mil habitantes, contou com 150 funcionários para essa prévia. “Em uma projeção razoável, seriam necessários de duas ou de três vezes mais funcionários de campo do que os atuais previstos”, pondera.
A redução de pessoal invariavelmente implicaria em outros cortes: da amostragem ou do questionário. A hipótese de reduzir o tamanho da amostra, por exemplo de 10% para algo equivalente a 7,5%, é razoável, aponta Bracarense. Isso porque o IBGE tem experiência com pesquisas de amostras reduzidas que compreendem continuamente a realidade socioeconômica brasileira, como é o caso das PNADs.
“Mas isto não pode ser feito sem um colossal planejamento que implicaria em estudos de vários anos. Propor no ano que antecede o Censo qualquer mudança desta ordem tem todas as condições de dar errado”, alerta o professor.
Já a possibilidade que foi levantada por Paulo Guedes, a de reduzir o tamanho do questionário, é vista com muitas ressalvas pela comunidade acadêmica. “Diminuir o tamanho do questionário, seja o reduzido, seja o completo, significa perder informações preciosas. Não se pode trabalhar com esta hipótese”, afirma Bracarense.
Para Marcelo Marchesini, coordenador do Programa Avançado em Gestão Pública do Insper, a impressão é de que o governo assume que, com um questionário menor, o trabalhador temporário fará mais entrevistas, embora não haja nenhuma comprovação de que isso vai ocorrer. “O recenseador não funciona como um relógio, que cortou um quinto das questões e vai cobrir proporcionalmente mais endereços”, argumenta.