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Dinheiro nas nádegas

Operação abafa trata caso Chico Rodrigues como “voadora” de Bolsonaro na corrupção

Agilidade de Bolsonaro para destituir Chico Rodrigues do cargo de vide-líder do governo no Senado foi exaltada por bolsonaristas: seria essa a tal da "voadora"?
Agilidade de Bolsonaro para destituir Chico Rodrigues do cargo de vide-líder do governo no Senado foi exaltada por bolsonaristas: seria essa a tal da "voadora"? (Foto: Palácio do Planalto)

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O dia seguinte à operação da Polícia federal que apreendeu dinheiro na cueca do senador Chico Rodrigues (DEM-RR), então vice-líder no Senado do governo de Jair Bolsonaro, mobilizou bolsonaristas nas redes sociais e em outros fóruns na tentativa de desvincular o presidente da República do parlamentar. O próprio Palácio do Planalto tratou o caso como um incidente menor e não um "incêndio político" com potencial de chamuscar o presidente.

Ao longo desta quinta-feira (15), governistas trataram a reação de Bolsonaro ao episódio como uma "voadora" do presidente — no dia anterior, ele dissera que daria uma "voadora no pescoço" em membros do governo que se envolvesse em corrupção. Bolsonaro também falou, na quinta, que Rodrigues não fazia parte de seu governo, outro argumento replicado pelos seus apoiadores.

Os defensores da gestão Bolsonaro mencionaram ainda que a ocorrência indica que a Polícia Federal (PF) opera de modo desvinculado ao governo, já que conduziu uma operação desfavorável a um parlamentar ligado ao Palácio do Planalto. Acusações sobre uma suposta interferência de Bolsonaro na PF estiveram entre os principais fatores que levaram à queda do ex-juiz Sergio Moro do Ministério da Justiça, em abril.

"Se Bolsonaro 'controla' a PF, como permitiu que um Senador da base do governo fosse alvo de uma busca e apreensão glútea", escreveu em seu perfil no Twitter o operador do mercado financeiro Leandro Ruschel, que é influente entre os bolsonaristas.

O desligamento de Rodrigues da liderança do governo, ocorrido na tarde desta quinta, foi também celebrado pelos bolsonaristas como uma demonstração do posicionamento do presidente no combate à corrupção. "Não era de se esperar outra atitude do nosso Presidente: tolerância zero com a corrupção!", escreveu a deputada Carla Zambelli (PSL-SP).

À Gazeta do Povo, o deputado Bibo Nunes (PSL-RS) também exaltou a "agilidade" de Bolsonaro. "Não há como impedir todo e qualquer ato de corrupção, e isso em todos os governos do mundo. Mas, no caso do governo Bolsonaro, o que vimos foi o presidente agindo rapidamente. É um governo sem corruptos de estimação", declarou. Para Nunes, a rapidez demonstrada pelo governo no caso deve fazer com que o assunto não permaneça em destaque nos próximos dias e, assim, não interfira na agenda da gestão Bolsonaro. "Isso vai morrer. Como as medidas foram tomadas na hora, não há o que se levar adiante", disse.

A avaliação é rechaçada pelo vice-líder do PT na Câmara, deputado Bohn Gass (RS). Ele acredita ser impossível desvincular Chico Rodrigues da gestão Bolsonaro. "Ele [Rodrigues] é, sim, parte do governo. Tão parte que Bolsonaro o escolheu para ser seu representante no Senado. E fez isso porque se enxergava no senador", disse. O senador e o presidente da República também são amigos de longa data, amizade cultivada ao longo do tempo em que atuaram juntos na Câmara dos Deputados.

Para Gass, o episódio tende a se somar a outros incidentes que relacionam a família Bolsonaro com acusações de corrupção, como o suposto esquema de "rachadinhas" no gabinete do hoje senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), quando ele era deputado estadual no Rio de Janeiro. "As provas existem da ligação de Bolsonaro com a corrupção. A família dele fez 'rachadinhas' e o presidente escolhe como líderes pessoas que fazem essa malversação dos recursos públicos", declarou.

No Palácio do Planalto, caso Chico Rodrigues não foi tratado como "voadora"

O esforço dos bolsonaristas nas redes sociais não foi acompanhado pelo Palácio do Planalto. O Executivo não considerou o episódio como um "incêndio político", a ponto de levar à criação de uma força-tarefa para minimizar seus impactos.

Nos corredores da sede do governo, interlocutores de Jair Bolsonaro reconhecem que o caso incomoda e constrange a Presidência da República, mas garantem que, nos bastidores, não houve ampla mobilização para discutir estratégias capazes de desassociar o governo do parlamentar.

O que se comenta no Planalto é que o próprio Bolsonaro tomou, sem alardes, a iniciativa de desvincular o Executivo do agora ex-vice-líder do governo. Por isso, não houve reuniões para discutir que estratégia tomar.

“O caso não tem essa proporção de ‘incêndio’. É um incômodo, é sempre chato, porque trata-se de um vice-líder, mas ele não é integrante do governo, não foi pego roubando dinheiro dentro de um ministério ou combinando propina. O afastamento é um problema muito mais do Senado Federal do que do governo federal”, diz um assessor palaciano.

Membros da articulação política, inclusive, disseram à Gazeta do Povo que a remoção de Rodrigues da liderança do governo não passou pelo ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela interlocução com o Congresso. Explicam que a escolha de líderes e vice-líderes é uma atribuição do presidente da República. Sustentam, portanto, que foi o próprio Bolsonaro, amigo de longa data de Rodrigues, que acatou pedido do próprio senador e o dispensou da função.

A narrativa levantada por Bolsonaro — e reiterada por auxiliares no Planalto — é que um vice-líder do governo não necessariamente é um membro do Executivo. “O meu governo são os ministros, estatais e bancos oficiais. Esse é o meu governo. Alguns acham que toda corrupção tem a ver com o governo. Não”, declarou o presidente, na manhã desta quinta-feira (15). “Nós destinamos dezenas de bilhões para estados e municípios, têm as emendas parlamentares, e, de vez em quando, não é muito raro, a pessoa faz uma malversação desses recursos”, acrescentou.

A apreensão do dinheiro nas nádegas de Chico Rodrigues é, assim, tratado como um episódio isolado e desassociado do Executivo. Assessores palacianos citam como exemplo o senador Fernando Bezerra (MDB-PE), líder do governo. O emedebista é suspeito de ser dono de uma concessionária de automóveis apontada por delatores como destinatária de propinas a ele. De acordo com a PF, ele e o filho, o deputado Fernando Bezerra Coelho Filho (DEM-PE), teriam recebido R$ 5,5 milhões em propinas de empreiteiras. Mas auxiliares do Planalto reconhecem que o caso de Rodrigues é mais emblemático.

Nas eleições de 2018, Rodrigues declarou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que mantinha R$ 525 mil em espécie. Os questionamentos levantados no Planalto que tornam esse caso mais suspeito que os envoltos por Bezerra é justamente por que um senador que declara tamanha quantia esconderia consigo R$ 15 mil próximo às nádegas e R$ 18,1 na cueca. “Ter dinheiro em casa não seria motivo para ele botar essa quantia na cueca. Se ele botou, é porque era algo suspeito. É uma história mais escatológica, de fato”, comenta um técnico do Planalto.

O episódio envolvendo Rodrigues levou alguns no Planalto a lembrar de outro caso suspeito em Roraima, uma investigação contra o senador Romero Jucá (PMDB-RR), em 2010. Às vésperas das eleições, R$ 100 mil foram jogados de um carro que deixava a produtora do parlamentar, então líder do governo na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em depoimento à PF, o empresário Amarildo Rocha Freitas afirmou ter recebido o pacote das mãos do senador, que se candidatava à reeleição, e de seu filho, Rodrigo Jucá (PMDB), então candidato a deputado estadual.

Chico Rodrigues é membro do Centrão

A tentativa de desconexão entre Bolsonaro e Rodrigues se dá quando, paradoxalmente, o presidente está mais próximo do que nunca do chamado Centrão, grupo de parlamentares de diferentes partidos do qual o senador por Roraima faz parte.

Bolsonaro se posicionou contra o Centrão durante sua campanha eleitoral mas, nos últimos meses, fez acenos positivos ao grupo, e recebeu afagos em retorno. O presidente recriou o Ministério das Comunicações para dar a chefia da pasta a um deputado do Centrão, Fábio Faria (PSD-RN), e tem indicado apoio à candidatura de Arthur Lira (PP-AL) à presidência da Câmara. O alagoano é visto como o principal líder do Centrão na Câmara dos Deputados.

Colega de partido de Rodrigues, o senador Jayme Campos (DEM-MT) diz que "são duas coisas bem distintas" o episódio envolvendo o senador por Roraima e a relação entre o partido e o governo. "É um caso que ainda precisa de esclarecimentos. Ainda não se sabe qual o encaminhamento do processo. Por enquanto, estou sabendo pela imprensa. E isso é um assunto que não pode ser tratado de forma abstrata", destacou.

Campos disse ainda que Rodrigues precisa "ter garantido seu direito de ampla defesa". A direção do DEM divulgou nota menos simpática a Rodrigues: ainda na quarta-feira, o partido disse que está atento a "todos os detalhes da investigação e, havendo a comprovação da prática de atos ilícitos pelo parlamentar, a Executiva Nacional aplicará as sanções disciplinares previstas no Estatuto do partido".

O deputado Bibo Nunes também não vê possibilidade de o incidente prejudicar a aproximação entre o governo e as forças de centro. "Eu acredito que não afeta. E se alguém se importar com isso, é alguém que não interessa ao governo. Quem é que vai proteger uma pessoa que anda com dinheiro na cueca?", questionou.

Já Bohn Gass avalia que Bolsonaro se tornou "carne e osso" com o Centrão e isso reforça a impossibilidade de se desvincular o presidente de ações praticadas por lideranças governistas que façam parte do bloco.

Senador diz ser inocente

Em nota oficial, o senador Chico Rodrigues afirmou que é inocente e, por isso, afastou-se do cargo de vice-líder do governo para dedicar-se à sua defesa. "Vou cuidar da minha defesa, e provar minha inocência. Volto a dizer, ao longo dos meus 30 anos de vida pública, tenho dedicado minha vida ao povo de Roraima e do Brasil, e seguirei firme rumo ao desenvolvimento da minha nação.

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