Uma mudança de entendimento da Advocacia-Geral da União (AGU) sobre multas ambientais liberou o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para insistir na cobrança administrativa e judicial de R$ 29,1 bilhões. A liberação ocorreu por meio da emissão de pareceres da AGU, que alteraram normas sobre prescrição das multas e sobre a notificação de infratores.
Para o advogado e consultor ambiental Antônio Fernando Pinheiro Pedro, trata-se de uma mudança de entendimento baseada em viés político-ideológico.
As multas haviam sido consideradas prescritas, após publicação de entendimento dado pelo ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Eduardo Bim. Para Bim, essas penalidades eram inválidas por interpretar que determinados despachos nos processos não interrompem a contagem de prazos para prescrição.
Pelo novo entendimento, a AGU passa agora a sustentar que a contagem do prazo para essa prescrição fica interrompida durante a realização de certas diligências, como vistorias e elaboração de pareceres. Na prática, o novo entendimento prolonga o tempo que o governo tem para processar os infratores.
No que diz respeito à notificação dos infratores, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o Ibama decidiu anular as penalidades impostas, por considerar uma irregularidade a notificação dos infratores por edital. Agora, a AGU sustenta que as notificações por edital são regulares, e, portanto, a cobrança das multas deve prosseguir.
A Gazeta do Povo tentou contato com o Ibama para saber se as multas já estão sendo cobradas e de que forma os recursos obtidos serão aplicados, mas não obteve resposta até a publicação da matéria. O espaço segue aberto para manifestação.
Mudança de entendimento da AGU sobre multas ambientais tem viés político-ideológico, diz advogado
Ao anunciar os pareceres da AGU, o advogado-geral da União, Jorge Messias, destacou a importância de se rejeitar a prescrição das multas ambientais. “A infração ambiental não pode compensar financeiramente. Neste momento em que a humanidade enfrenta uma ameaça existencial, com a crescente emergência climática, a AGU não poderia deixar de cumprir seu papel de dar segurança jurídica para um dos eixos centrais da proteção ambiental: a responsabilização dos que agridem o meio ambiente e colocam em risco o futuro do planeta”, concluiu Messias.
No entanto, para Pinheiro Pedro, trata-se de uma mudança de entendimento baseada em viés político-ideológico. “A ‘mudança de planos’, dentro da AGU, ainda mais por evidente viés político-ideológico, fere de morte o Estado de Direito. Mais uma ‘lacração’ em prejuízo da razão”, opinou o advogado e consultor ambiental.
Após a emissão dos pareceres da AGU, em entrevista para a CBN, o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, disse que o governo Bolsonaro “jogou na lata do lixo” as multas por questões ambientais. “O que percebemos é que o governo passado jogou na lata do lixo quase R$ 29 bilhões de multas. Agora nós estamos trabalhando para recuperar isso, até por conta de uma questão de credibilidade”, disse o presidente do Ibama.
Pinheiro Pedro, no entanto, alerta que a mudança de entendimento só encontra amparo nos processos sancionadores não abrangidos pela decisão anterior. O processo administrativo sancionador ambiental visa a apuração de infração ambiental e a imposição de sanções administrativas. “Nesse caso, a mudança de entendimento seria legal, porque teria por objetivo reduzir a impunidade no que se refere a crimes ambientais. Mas isso seria, ainda, passível de judicialização”, disse o advogado.
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