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A Codevasf, estatal voltada a programas de irrigação e desenvolvimento do semiárido brasileiro e comumente usada para articulações políticas, doou R$ 106 milhões a instituições privadas apenas no primeiro trimestre deste ano. A apuração da Folha de São Paulo, publicada nesta segunda (22), mostra que a companhia mudou o foco da distribuição de recursos que, até o ano passado, eram encaminhados majoritariamente às prefeituras.
De acordo com o levantamento, prefeituras das áreas atendidas pela Codevasf receberam 52% dos repasses neste ano, contra 74% do registrado em 2022. A estatal passou a atender também entidades voltadas ao agronegócio e até mesmo ligadas a garimpeiros, como a Cooperativa de Trabalho Agropecuaristas e Garimpeiros da Bahia, que teria recebido equipamentos avaliados em R$ 211 mil.
A cooperativa está sediada no município de Quijingue (BA) e tem o vice-prefeito Romerinho (PL) como apoiador. O político é também favorável ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e milita com um grupo pela legalização do garimpo na região – seriam mais de 15 mil garimpeiros, segundo ele.
A apuração aponta, ainda, que o estado da Bahia foi o mais beneficiado por recursos da Codevasf no primeiro trimestre deste ano, com repasses que somam R$ 41,8 milhões. O estado deu 72% dos votos a Lula no segundo turno da eleição de 2022.
Além da Bahia, a Codevasf também encaminhou recursos para entidades religiosas de Sergipe, entre elas a Assembleia de Deus comandada pelo pastor Virgínio de Carvalho, que foi o segundo suplente da senadora Maria do Carmo Alves (PP) em 2021.
Uma auditoria da Controladoria Geral da União (CGU) realizada em 2022 e divulgada no começo deste ano aponta que veículos e equipamentos doados pela Codevasf foram parar em imóveis particulares e eram usados mediante cobranças de taxas e destinados a entidades chefiadas por políticos.
Em nota, a estatal afirmou que a doação de máquinas e equipamentos para entidades sem fins lucrativos ocorre “quando há parecer técnico favorável e alinhamento entre a finalidade do bem e as atividades indicadas no estatuto da instituição beneficiária”.
A Codevasf diz, ainda, que acompanha o uso dos bens doados por amostragem e que denúncias de eventual uso indevido podem ser encaminhadas à ouvidoria do órgão.