O processo de confirmação pelo Senado da indicação do advogado Cristiano Zanin Martins, 47 anos, para ocupar a vaga de Ricardo Lewandowski no Supremo Tribunal Federal (STF), feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), transcorre de forma ágil e sem qualquer embaraço, inclusive com o sinal verde de senadores da ala conservadora.
Zanin foi advogado de Lula, tem um perfil garantista e tornou-se um dos protagonistas da desestruturação da Lava Jato nos últimos anos. Por isso, sua indicação ao STF está sendo vista como mais um revés no combate à corrupção no Brasil.
Desde a publicação da indicação no Diário Oficial, em 1º de junho, todas etapas estão sendo conduzidas de forma acelerada, visando garantir a provável aprovação com larga margem do advogado, tudo em menos de um mês.
A sabatina de Zanin no Senado será na próxima quarta-feira (21) e a votação em plenário será secreta.
Logo após a oficialização do seu nome por Lula, em meio a especulações desde janeiro, Zanin iniciou a série de encontros com os senadores. A partir da última semana, ele tem acelerado esse processo. Um dos objetivos seria esclarecer algumas questões aos parlamentares e até evitar pontos incômodos levantados pela imprensa. Todos o senadores foram procurados, inclusive o ex-juiz Sergio Moro (União Brasil-PR).
Além de se apresentar aos parlamentares, as reuniões serviram para discutir ideias e, sobretudo, vencer resistências. O contato direto permite, em tese, que senadores o conheçam melhor, formem opinião sobre a sua adequação ao cargo e até tratem de demandas específicas.
O senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da Frente Evangélica, expressou a satisfação dos integrantes do grupo ao ouvir de Zanin uma “posição firme” contra a intromissão do STF em temas caros aos conservadores, como as restrições às drogas e ao aborto. Durante um jantar na quarta-feira (14) com a frente, o advogado concordou que o Parlamento deve ter a palavra final sobre essas questões. “O advogado entendeu a necessidade da busca por um equilíbrio entre os poderes”, resumiu.
Sobre as condições de Zanin para exercer o cargo, o presidente da Frente Evangélica afirmou que o advogado "mostrou competência jurídica" e ser um "verdadeiro doutor" ao conseguir reverter a complexa situação judicial de Lula”, mesmo tendo a seu favor “o peso das posições políticas de ministros do Supremo”.
Para ele, a decisão de Lula ao nomear seu advogado pessoal é prerrogativa do presidente, prevista por lei. No entanto, ele enfatizou a importância de o Congresso discutir mudanças na forma de indicação de ministros para o STF, assim como rever regras para o exercício da função, como a fixação de mandatos, “de modo a tornar o Judiciário independente e menos suscetível às vontades de cada ocupante do Planalto”.
À Gazeta do Povo, a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), vice-presidente da Frente Evangélica, compartilhou a sua boa impressão pessoal em relação ao advogado, chamando-o de “doutor Zanin”. Ela destacou a inteligência e a personalidade agradável do indicado de Lula, revelando ter “gostado muito dele como pessoa”.
Embora não tenha garantido o seu voto ao candidato, a ex-ministra do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) solicitou que, caso Zanin seja aprovado pelo plenário do Senado, ele assuma o papel de “o ministro das crianças no STF”, para assegurar a proteção da infância, uma das principais bandeiras da carreira política da senadora.
Parecer da indicação de Zanin destaca carreira no Direito e expõe insuficiência acadêmica
Nesta quinta-feira (14), Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), que também é vice-presidente do Senado, apresentou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) seu parecer como relator da indicação de Zanin. Ele afirmou que o advogado indicado por Lula está apto para ocupar a vaga no STF. De acordo com o senador, os membros da CCJ, na qual o indicado será sabatinado na próxima quarta-feira (21), têm “elementos suficientes” para avaliar a nomeação.
O parecer destacou a trajetória profissional e revelou a ausência de conteúdo acadêmico, que Vital do Rêgo tentou contornar ao afirmar que o advogado foi “autor de inúmeros estudos jurídicos que permeiam discussões nos ambientes forenses pela marca das densas abordagens propostas”, como a publicação de artigos referentes a processos de recuperação judicial, sentença criminal, repercussão geral, entre outros.
Na CCJ do Senado, Zanin responderá a perguntas dos senadores sobre visão de mundo, compromisso com a imparcialidade e papel do STF. Ao menos três pontos devem ser explorados por senadores da oposição: suposta falta de conhecimento jurídico, a relação próxima com o presidente e uma investigação sobre tráfico de influência no Rio de Janeiro, que foi iniciada pela Lava Jato, mas acabou trancada.
Aprovado pela sabatina na CCJ, que deverá comprometer toda a manhã e toda a tarde da próxima quarta-feira, o nome de Zanin será então submetido à votação em plenário na noite da mesma data. A maioria dos senadores tem mostrado apoio em favor do candidato e, não raro, muitos já o chamam de ministro.
O rito rápido permitiu que o processo fosse concluído em curto espaço de tempo, evitando atrasos e prolongamentos às vésperas do recesso parlamentar, que poderiam alimentar novas especulações e resistências, inclusive do próprio partido do presidente, o PT.
De acordo com Marcos Queiroz, analista da Arko Advice, a confirmação de Zanin pelo Senado ocorrerá facilmente devido à combinação de apoios importantes que ele recebeu, inclusive de ministros do próprio STF.
O pragmatismo demonstrado por Zanin em sua busca por apoio, por meio de reuniões individuais em gabinetes e encontros reservados com grupos de parlamentares, incluindo a Frente Evangélica, que tende a ser oposição ao governo, mas recebeu bem o advogado, também contribui para a aprovação.
Além disso, pesa a seu favor o fato de a composição do Senado ser majoritariamente garantista, seguindo a mesma linha jurídica adotada por Zanin, que também critica a Operação Lava Jato, na qual o advogado enfrentou batalhas nos tribunais e que resultou na prisão de Lula – e posterior anulação das condenações.
Jogo de lealdades a políticos alcança até a disputa pela próxima vaga no Supremo
A indicação de Zanin levanta preocupações sobre os requisitos constitucionais para o cargo de ministro do STF, critérios que têm se tornado menos importantes na escolha dos integrantes da Corte. Um desses requisitos é o “notável saber jurídico”, critério sobre o qual ainda restam dúvidas em relação a Zanin. No entanto, essa indicação baseia-se principalmente nos serviços prestados ao presidente da República responsável pela indicação. Essa abordagem política tem se tornado comum, levantando preocupações sobre a qualidade e a isenção do tribunal.
Segundo analistas, no atual contexto em que grupos de ministros buscam impor posições dentro de um histórico ativismo judicial, a confiança pessoal e a lealdade ao presidente que faz a indicação são mais valorizadas do que a competência jurídica.
Com objetivo de assegurar ao Planalto uma rápida confirmação de Zanin e provar sua lealdade, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), presidente da CCJ e aliado tanto de Lula quanto do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já está direcionando esforços para a próxima vaga no STF. Essa será aberta em outubro com a aposentadoria da ministra Rosa Weber.
Alcolumbre deseja influenciar o processo de escolha e está trabalhando para promover Pacheco como opção para substituir a ministra, atual presidente da Corte. Enquanto isso, movimentações estão em andamento também no campo da esquerda, que busca convencer o presidente da República sobre a importância de considerar outros nomes.
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