Há poucos dias do início do recesso parlamentar, a partir de 18 de julho, a Câmara dos Deputados registra baixa produtividade e acumula projetos e grupos "emperrados". Além disso, pode deixar diversas matérias importantes que aguardam análise para o segundo semestre, ou mesmo para 2025.
Apesar de uma extensa pauta prevista para este ano legislativo, o primeiro semestre foi marcado mais uma vez por dificuldades na articulação política com o Planalto. O Executivo impediu, por exemplo, que o Congresso colocasse um ponto final na questão da desoneração da folha de pagamento, uma polêmica que envolve 17 setores fundamentais da economia, e que se arrasta desde o final de 2023.
Feriados como a Semana Santa e os festejos juninos também ajudaram a esvaziar os corredores da Câmara, contribuindo para a baixa produtividade, e análise de poucos projetos importantes até agora, como destaca o professor de Ciências Políticas do IBMEC de Belo Horizonte, Adriano Cerqueira.
"Ninguém está com cabeça para ficar pensando em pauta na Câmara dos Deputados não, então era previsível. Teve muito barulho mas pouca produção legislativa, no meu entendimento", diz o professor.
Ainda de acordo com o professor Adriano Cerqueira, é bem provável que muito do que o parlamento está deixando para após o recesso fique mesmo é para o ano que vem. Arthur Lira já acenou que convocará uma semana de trabalho em agosto e outra em setembro para tentar fazer a pauta da Câmara avançar, mas o analista acredita que este esforço não terá muito resultado.
Cerqueira afirma que as eleições municipais de outubro deverão esvaziar o Congresso, e apenas duas semanas de esforço concentrado para votar tanta coisa não será o suficiente.
O analista acrescenta ainda que, passadas as eleições, o parlamento vai se debruçar na sucessão de Arthur Lira, que desde 2021 está no comando da Câmara, e vai se empenhar em fazer um sucessor, em fevereiro de 2025.
Veja abaixo projetos e temas que ficaram pendentes na Câmara:
Fake News
Após muitas polêmicas no texto do projeto que tratava da responsabilização das chamadas big techs sobre conteúdos publicados, e a rejeição do texto então relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que não teve apoio para votação, o projeto foi "sepultado" por decisão do presidente Arthur Lira, que decidiu instalar um grupo de trabalho para começar do zero a discussão sobre big techs e inteligência artificial. O grupo foi instalado recentemente, mas ainda não começou a trabalhar.
Aborto
Uma proposta do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), equiparando o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio teve a urgência aprovada em junho no plenário, mas as críticas e a resistência ao texto fizeram mais uma vez o presidente Arthur Lira adiar a discussão, com a promessa de que instalará mais um grupo, ou comissão, para debater o tema no segundo semestre, com "responsabilidade e transparência".
Sóstenes Cavalcante, o autor do projeto, admite alterar o texto, abrandando a pena para as mulheres vítimas de estupro que praticarem o aborto após as 22 semanas de gravidez. Essa foi uma das principais críticas ao texto, que teve sugestões até da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro.
Enquanto o projeto do aborto aguarda para ter a análise retomada no segundo semestre, a Comissão de Constituição e Justiça tenta avançar com outra proposta que busca aumentar a pena para o crime de estupro para até 22 anos, no caso do crime provocar lesão corporal grave; e 24 anos, quando praticado contra vulnerável. O relator, deputado Capitão Alberto Neto (PL-AM), disse que a ideia é discutir o aumento das penas juntamente com o PL que criminaliza o aborto.
Desoneração da folha de pagamentos
A "novela" sobre a prorrogação da desoneração da folha de pagamentos, aprovada pelo Congresso no final do ano passado e depois vetada pelo presidente Lula, ainda segue sem solução. Enquanto isso, os setores produtivos temem o fim de benefícios e o desemprego de milhões de pessoas que trabalham em 17 setores fundamentais para a economia. Jornais como a Gazeta do Povo são beneficiados pela desoneração.
A bola está com o Senado, mas como o tema é bastante complexo, pode ficar para o segundo semestre, embora o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG) tente um acordo para elaborar as medidas de compensação. Os senadores, ao que tudo indica, trabalham com a necessidade de aprovar o texto até o dia 10 de agosto, quando termina o prazo dado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para que o Congresso encontre uma solução para o problema.
PEC de Anistia a partidos políticos
Consenso total entre os partidos políticos desde que começou a ser discutida na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), e aprovada em maio do ano passado na comissão, a proposta que altera a Constituição Federal de 1988 para permitir que os partidos políticos sejam perdoados por não cumprir as cotas de inclusão de pretos e mulheres. A proposta foi retirada de pauta esta semana por Arthur Lira.
O presidente da Câmara se mostrou impaciente com um comentário do líder do PT, Odair Cunha (MG), que alegou haver diferenças entre o texto apresentado pelo relator da matéria na comissão especial, Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP), e o texto anteriormente aprovado na CCJ que contava com apoio de todas as legendas - do PT ao PL.
A comissão especial não chegou a votar o parecer, o que permitiu que o plenário pudesse aprovar a urgência e em seguida discutir a matéria. Mas com a queixa do PT, Lira disse que vai aguardar o consenso para voltar a incluir o texto sobre a anistia aos partidos na pauta do plenário.
Anistia a envolvidos no 8 de janeiro
Ao menos seis projetos que propunham anistia aos processados pelos atos de vandalismo de 8 de janeiro foram apresentados na Câmara. Eles foram juntados para análise conjunta em um único projeto de lei, que está sendo relatado pelo deputado Rodrigo Valadares (União-SE).
Ele disse à Gazeta do Povo que está trabalhando com base em praticamente três outras propostas e excluiu algumas hipóteses que estavam em outros dos projetos iniciais. Valadares disse que não pode antecipar o parecer, mas informou que o texto busca anistiar apenas quem participou do 8 de janeiro e de atos correlatos, e disse que o texto não beneficiará o ex-presidente Jair Bolsonaro, "a pedido do próprio Bolsonaro", frisou. As hipóteses de extender o benefício ao ex-presidente ou a participantes de eventos ocorridos antes do 8 de janeiro estavam em projetos iniciais que foram descartados por Valadares.
O deputado disse que vai discutir com a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Caroline de Toni (PL-SC) a melhor alternativa para que a proposta de anistia aos presos por participação nos atos que terminaram com a depredação de prédios públicos na Praça dos Três Poderes tenha menor resistência e possa ser aprovada na Comissão logo após o reinício dos trabalhos na Câmara, em agosto.
PEC das Drogas
Pouco depois do Supremo Tribunal Federal decidir pela não criminalização do usuário de maconha que porte até 40 gramas da droga, para diferenciá-lo do traficante, o presidente da Câmara, Arthur Lira, de Portugal, onde participava do evento de Gilmar Mendes que ficou conhecido como Gilmarpalooza, anunciou uma comissão especial para analisar a PEC das Drogas.
O texto relatado pelo deputado Ricardo Sales (PL-SP) foi aprovado na CCJ e ao contrário do que decidiu a Suprema Corte, proíbe o porte e a posse de qualquer tipo de drogas em todo território nacional. Apesar do anúncio, a comissão também só deverá começar a funcionar após o recesso parlamentar.
Em teoria, uma Proposta de Emenda Constitucional poderia se sobrepor à decisão do STF de descriminalizar a maconha. Mas nada garante que o Supremo não declare a própria PEC inconstitucional e prolongue o embate.
CPIs dos abusos do Supremo e do crime organizado
Dentre os muitos assuntos do parlamento que vão ficar para depois estão as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), que aguardam deliberação do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, para instalação e designação de membros.
Embora o regimento interno da Câmara só permita o funcionamento simultâneo de cinco CPIs, nove pedidos de instalação foram protocolados desde o final do ano passado, com as 171 assinaturas necessárias, e aguardam a palavra final de Lira.
Entre os assuntos que os deputados querem investigar estão o abuso de poder por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), e possíveis excessos do Judiciário; a investigação de crimes sexuais contra menores na Ilha de Marajó, no Pará; irregularidades cometidas por companhias de energia elétrica no pais; e a atuação do crime organizado.
Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2025
A votação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) é mais uma que deve ficar para agosto, segundo informou o relator da matéria à Agência Senado. O Senador Confúcio Moura (MDB-RO) disse que não há tempo hábil para analisar as emendas apresentadas até o próximo dia 17, último dia útil antes do recesso parlamentar.
O senador admitiu ainda que as reuniões da Comissão Mista de Orçamento, que analisa o texto, foram prejudicadas em função desses "recessos brancos", numa referência a viagens de parlamentares e parada para os festejos de São João, quando os parlamentares foram dispensados.
De acordo com o que prevê a Constituição Federal, o Congresso Nacional só poderia entrar em recesso no dia 17 de julho após a aprovação do projeto da LDO que vai orientar os gastos do governo no ano que vem. A matéria orienta a elaboração do projeto da Lei Orçamentária Anual (PLOA) que deve ser enviado pelo Poder Executivo até 31 de agosto. Mas o senador Confúcio Moura espera que o projeto da LDO seja votado antes desse prazo.
Calendário eleitoral e sucessão no Congresso devem manter pautas em compasso de espera, dizem analistas
Na opinião do analista político Cristiano Noronha, da consultoria Arko Advice, o restante do ano legislativo deverá ser tomado mesmo pelas eleições municipais de outubro, com boa parte dos parlamentares em suas bases eleitorais.
Mesmo assim, Cristiano destaca entre o que ainda pode ser votado antes do recesso a importância da regulamentação da reforma tributária. Ela definirá novos tributos e alíquotas que farão com que as mudanças tributárias aprovadas no ano passado passem a valer de fato.
Já o professor Adriano Cerqueira, do IBMEC, acredita que "o que não foi votado até agora dificilmente será votado". Para o analista, é comum que os anos eleitorais sejam prejudicados no parlamento, e com os problemas atuais de articulação do Executivo com as lideranças do Congresso essa dificuldade se acentuou.
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