Com a Argentina prestes a assumir a presidência do Mercosul, a eleição do esquerdista Yamandú Orsi para a presidência uruguaia pode ser um alívio para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Com a vitória de Orsi, o brasileiro ganha um aliado regional e no Mercosul, que passa a ter um quadro ideológico equilibrado.
Com a eleição de Orsi, o Mercosul terá dois presidentes de esquerda (Brasil e Uruguai) e dois de direita (Argentina e Paraguai) – a Bolívia, de Luís Arce (esquerda), também foi integrada ao Mercosul mas ainda não concluiu sua adesão e, por isso, o país ainda não possui poder de voto. A América do Sul também ganha um viés predominantemente esquerdista, com nove dos 12 países presididos por líderes progressistas.
Nos bastidores do governo, a vitória da esquerda no Uruguai foi vista com bons olhos. O cenário foi comemorado pela possível sinergia que Lula pode ter com o novo presidente Uruguaio. “A vitória do partido Frente Ampla, do Yamandú, é um bom boa notícia para o atual governo brasileiro”, avalia Pedro Feliú, professor de relações internacionais da Universidade de São Paulo.
O docente explica que, ainda que não tenha tomado posse, é possível fazer previsões sobre os interesses e possíveis vertentes que o presidente eleito devem adotar durante sua gestão. Yamandú Orsi foi eleito pelo Frente Ampla, mesmo partido de Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai que possui uma amizade com Lula. Mujica, inclusive, apoiou a candidatura de Orsi.
“O Frente Ampla é um partido que tem uma elevada apreciação ao Mercosul, foca na integração regional como um dos objetivos a serem atingidos do ponto de vista político e se posiciona contrariamente à negociação de acordos comerciais fora da tarifa externa comum ou fora do Mercosul em geral. Então acredito que para essas agendas, o Lula terá um parceiro mais confiável”, pontua Feliú. Na avaliação do professor, a eleição de Orsi pode ser um afago para Lula no Mercosul.
Com a Argentina prestes a assumir a presidência do Mercosul, a eleição do esquerdista Yamandú Orsi para a presidência do Uruguai representa um alívio estratégico para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Mercosul diante da Argentina assumindo a presidência do bloco econômico
A vitória de candidato da Frente Ampla reforcaria a aliança regional e equilibra o bloco sul-americano em termos ideológicos. No novo cenário, o Mercosul contará com dois presidentes de esquerda (Brasil e Uruguai) e dois de direita (Argentina e Paraguai). A Bolívia, liderada por Luis Arce (esquerda), já foi integrada ao Mercosul, mas ainda não concluiu sua adesão, o que a impede de exercer poder de voto. Paralelamente, a América do Sul exibe um panorama predominantemente progressista, com nove dos 12 países sob governos de viés esquerdista.
No governo brasileiro, a eleição de Orsi foi recebida com entusiasmo diante da expectativa de sinergia entre Lula e o novo presidente uruguaio. Pedro Feliú, professor de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), diz que a vitória é uma boa notícia para o governo brasileiro.
Segundo o professor da UP, ainda que Orsi não tenha assumido, é possível prever os rumos que sua administração deve tomar, considerando sua filiação ao mesmo partido de Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai e aliado de longa data de Lula. Mujica apoiou publicamente a candidatura de Orsi.
“A Frente Ampla valoriza o Mercosul, prioriza a integração regional como objetivo político e rejeita negociações comerciais que não respeitem a tarifa externa comum do bloco. Por isso, é provável que Lula encontre em Orsi um parceiro mais confiável para fortalecer essas agendas”, explica o professor. Ele ressalta que a eleição do novo líder uruguaio pode representar um alento para o Brasil no contexto do Mercosul.
Lula, com apoio do novo presidente uruguaio, pode impulsionar pautas sociais no Mercosul
Analistas apontam que o apoio de Yamandú Orsi no Mercosul poderá ser crucial para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), especialmente no primeiro semestre de 2025, quando a Argentina assumirá a presidência pro tempore do bloco. A transferência de liderança ocorre na próxima semana, durante a Cúpula de Líderes, evento no qual Lula já confirmou presença.
A gestão do argentino Javier Milei, que assume a presidência do Mercosul, representa um desafio direto ao governo brasileiro. Conhecido por sua postura libertária, Milei mantém uma agenda contrária à de Lula, com pouco interesse em pautas sociais ou ambientais, áreas prioritárias para o petista.
Segundo diplomatas ouvidos pela Gazeta do Povo sob condição de anonimato, Orsi pode se tornar um aliado fundamental para Lula manter essas pautas em evidência dentro do bloco. Embora temas sociais e ambientais sejam recorrentes nas discussões do Mercosul, há receios de que eles percam força durante a presidência argentina, em função da postura de Milei.
Milei já demonstrou desinteresse por essas questões durante sua participação no G20, presidido pelo Brasil em 2023. O governo argentino absteve-se de apoiar declarações sobre igualdade de gênero e, embora tenha aderido à Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza, proposta por Lula, apresentou ressalvas ao programa. A iniciativa visa coordenar esforços internacionais para combater a fome por meio de recursos financeiros e políticas de inclusão.
Em comunicado oficial, a gestão Milei detalhou suas posições no G20: “Sem impedir a declaração de outros líderes, o presidente Javier Milei deixou claro que discorda de pontos como a promoção de limites à liberdade de expressão nas redes sociais, a interferência em soberanias nacionais por instituições globais e a ideia de que maior intervenção estatal seja a solução para o combate à fome.”
Embora o Mercosul seja tradicionalmente um bloco focado em questões econômicas, os membros têm buscado integrar esses temas ao desenvolvimento social e sustentável. A presidência brasileira do Mercosul no segundo semestre de 2023 reforçou esse compromisso. Durante o período, a chancelaria do Brasil promoveu debates voltados à segurança alimentar, inclusão social e desenvolvimento ambiental.
O bloco já conta com iniciativas estruturadas nessas áreas. Há grupos específicos para criar políticas públicas voltadas à proteção social, como a Rede de Seguridade Social do Mercosul, que busca estabelecer uma rede mínima de assistência para os habitantes dos países membros.
Apoio de Yamandú pode favorecer acordo de livre comércio com União Europeia
A troca de presidência no Uruguai pode favorecer as negociações do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, que se arrasta há mais de duas décadas. O atual presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, vinha indicando a possibilidade de abandonar o bloco para fechar acordos comerciais bilaterais, como um tratado de livre comércio entre Uruguai e China.
“O Uruguai sempre demonstrou interesse em firmar acordos isolados, envolvendo apenas o país e outro parceiro, seja um bloco econômico ou uma nação específica. Caso isso ocorra, um tratado desse tipo poderia praticamente desmontar o Mercosul e inviabilizar o acordo com a União Europeia”, alerta José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
No entanto, especialistas acreditam que a gestão de Yamandú Orsi poderá trazer maior alinhamento político com o Brasil e fortalecer as tratativas conjuntas do Mercosul. “Yamandú já expressou durante sua campanha apoio ao método de negociação em bloco e à conclusão do acordo com a União Europeia. Não vejo sinais de que ele criará obstáculos para essas negociações avançarem”, avalia Pedro Feliú, professor de Relações Internacionais da USP.
Nesta sexta-feira (29), Yamandú fez uma visita ao Brasil e se reuniu com o presidente Lula no Palácio do Planalto. Após o encontro, reforçou seu apoio às negociações com o bloco europeu. "Dedicamos a maior parte da reunião para analisar a situação atual e as possibilidades que temos. Podemos dizer que somos otimistas quanto à possibilidade de continuar estreitando laços com outras regiões, principalmente Europa", disse.
Apesar disso, o impacto econômico do Uruguai dentro do Mercosul ainda é limitado. De acordo com Castro, “o peso do Uruguai no bloco está concentrado na exportação de carne, mas a maior parte dos frigoríficos do país pertence a brasileiros. Portanto, as decisões econômicas são, em grande parte, influenciadas por empresários do Brasil.”
Lacalle Pou, durante seu mandato, buscou avançar em negociações bilaterais, mas enfrentou resistência dos demais membros do Mercosul, que priorizam a unidade nas tratativas comerciais. Com a posse de Orsi, especialistas apontam para uma provável sintonia entre os governos de Uruguai e Brasil no que diz respeito às negociações com a União Europeia.
As negociações entre Mercosul e União Europeia, iniciadas em 1999, preveem a redução de tarifas e taxas alfandegárias em uma série de produtos. No entanto, o tratado encontra-se paralisado desde 2019 devido a preocupações de países europeus, como a França, sobre questões sanitárias e ambientais, especialmente relacionadas ao Brasil e à Argentina.
Embora apresentadas como justificativas técnicas, analistas sugerem que essas exigências escondem um viés protecionista. Produtores europeus temem a concorrência de produtos sul-americanos, reconhecidos por sua qualidade superior e preços mais baixos.
Ainda assim, o Mercosul mantém esforços para avançar na negociação, que, se concluída, será o maior acordo comercial entre blocos econômicos do mundo. A conclusão do tratado é considerada estratégica para reforçar a competitividade global dos países sul-americanos e fortalecer suas economias.
Eleição de Orsi pode ser esperança para Lula, que busca a integração regional
Outro ponto destacado por especialistas e que pode ganhar força com a eleição de Yamandú Orsi no Uruguai é a integração regional. Feliú acredita que o novo presidente uruguaio deve se alinhar a Lula para impulsionar o alinhamento político e econômico entre os países da América do Sul, incluindo uma possível reativação da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), que perdeu relevância nos últimos anos.
Desde seu retorno a Planalto, em 2023, Lula enfrenta o desafios na integração regional, especialmente devido a dificuldades em estabelecer relações construtivas com líderes de diferentes espectros ideológicos.
Apesar de manter um relacionamento diplomático considerado harmonioso com Luis Lacalle Pou, o ex-presidente uruguaio frequentemente antagonizava o petista em temas sensíveis, como a crise política na Venezuela e os esforços de integração sul-americana.
Em uma tentativa de revitalizar a Unasul, Lula organizou em 2023 uma cúpula em Brasília, reunindo os líderes sul-americanos. Lacalle Pou, no entanto, demonstrou resistência ao bloco, criticando o viés político de esquerda predominante e reprovando a postura de Lula diante do regime do ditador Nicolás Maduro na Venezuela.
A ascensão de Javier Milei à presidência da Argentina representou um obstáculo adicional para os planos de integração de Lula. A divergência ideológica entre os dois líderes contribuiu para o enfraquecimento da relação entre Brasil e Argentina, tradicionalmente um dos pilares da cooperação sul-americana.
Segundo Feliú, esse cenário compromete o papel de Lula como líder regional e torna o próximo ano ainda mais desafiador, especialmente com a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos.
A proximidade entre Milei e Trump, bem como a postura alinhada de Santiago Peña, presidente do Paraguai, são fatores que dificultam o avanço de uma agenda integradora. Feliú aponta que uma eventual indicação de um diplomata paraguaio para a secretaria-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), sob influência de Trump, seria mais um golpe para os esforços de Lula.
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