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Os senadores Eduardo Girão (Novo-CE), Magno Malta (PL-ES) e Carlos Portinho (PL-RJ) e o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RJ) estiveram nesta sexta-feira (21) em Nova York com o propósito de encaminhar um dossiê ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a situação dos presos do 8 de janeiro. A comitiva parlamentar foi recepcionada pelo embaixador do Brasil na ONU, Sérgio França Danese, para iniciar a formalização da denúncia junto ao órgão.
No documento de cerca de 50 páginas, elaborado com a colaboração de defensores de centenas de detidos nos atos de vandalismo na Praça dos Três Poderes e assinado por dezenas de parlamentares, são descritos detalhes de uma escalada de arbítrios e abusos cometidos contra direitos fundamentais. “Todos precisam saber o que está ocorrendo no Brasil, onde cidadãos estão passando por provações inimagináveis, com sistemático desrespeito à Constituição por aqueles que deveriam ser seus primeiros guardiões”, disse Girão ao embarcar na noite de quinta-feira (20) para os Estados Unidos.
“As prerrogativas constitucionais de advogados e as reservas de foro de cidadãos foram ignoradas por uma série de atos que apontam para um Estado de exceção”, protestou o Van Hattem, também antes de deixar o país. Segundo ele, está na hora de a questão ser internacionalizada e para isso está sendo levada à ONU e a outras instituições que monitoram as agressões aos direitos humanos uma "denúncia robusta".
Iniciativa visa alcançar pressão externa contra arbitrariedades
Após a reunião com o representante brasileiro na ONU, os parlamentares relataram uma recepção positiva por parte do diplomata e sua equipe composta por 50 profissionais. Durante o encontro, discutiram os próximos passos da iniciativa para denunciar violações de direitos ocorridas nos dias 8 e 9 de janeiro, quando várias prisões ocorreram. Magno Malta enfatizou que essa primeira incursão do grupo parlamentar no cenário internacional complementa as ações já em curso no país, por meio da defesa dos detidos e das atividades nas sessões plenárias e comissões do Congresso, especialmente na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) de 8 de janeiro. Ele ressaltou a importância de inocentar os inocentes e manter a esperança por justiça.
O senador Carlos Portinho destacou a relevância da grave questão humanitária que envolve os desdobramentos das manifestações na Praça dos Três Poderes no Brasil. Ele considerou que esse tema é pertinente não apenas na ONU e em sua comissão de direitos humanos em Genebra, mas também em outras organizações. Portinho afirmou ainda que acusados e defensores sem acesso a processos e outros abusos exigem uma resposta de autoridades e da sociedade. Ele informou que o escritório do Brasil na ONU compartilhará o documento com o seu colegiado na Suíça, enquanto este está sendo traduzido. Até o momento, cerca de 10 senadores e 80 deputados já assinaram o documento, que ainda segue aberto a novos apoios até ser protocolado em definitivo.
Grupo também vai encaminhar dossiê para corte interamericana
Marcel Van Hattem revelou que o próximo passo do grupo parlamentar será encaminhar um documento similar ao entregue à ONU também para a Organização dos Estados Americanos (OEA), sediada em Washington, mais especificamente para sua Comissão de Direitos Humanos. O deputado explicou que a tramitação da denúncia pode ser mais facilitada nesse fórum, pois prioriza a mediação de conflitos nos países membros. Caso o Estado brasileiro não ofereça uma resposta adequada às denúncias, a acusação poderá ser levada à Corte Interamericana, sediada na Costa Rica, o que poderá resultar em sanções para o país.
Os parlamentares, acolhidos por apoiadores brasileiros nos Estados Unidos, têm como objetivo levar o tema às manchetes da mídia internacional, dando continuidade às reportagens já publicadas nos jornais americanos The New York Times e Washington Post. Van Hattem enfatizou que a estratégia é buscar o maior número possível de foros internacionais, a fim de obter apoio político e pressão externa. Ele ressaltou que essas questões são de extrema gravidade, transcendendo as divisões políticas entre esquerda e direita, governo e oposição, pois dizem respeito à normalidade institucional do país e devem ser enfrentadas em defesa da restauração da democracia constitucional.
Em 13 de julho, familiares dos presos e seus advogados compareceram a uma audiência pública na Comissão de Segurança Pública do Senado para apresentar denúncias de violações dos direitos humanos sofridas pelos detidos. Cerca de 250 indivíduos permanecem presos por mais de seis meses nas penitenciárias da Papuda e Colmeia (feminina) em decorrência dos atos relacionados ao vandalismo em 8 de janeiro. Nesse dia e no seguinte, 1.406 pessoas foram detidas em ônibus e levadas às prisões.
Advogados relatam superlotação e dramas de saúde dos detentos
Durante a sessão, a subdefensora pública-geral, Emmanuela Saboya, trouxe à tona o problema da superlotação das celas na unidade prisional destinada às mulheres. Além disso, destacou a gravidade dos problemas relacionados à alimentação e o evidente impacto negativo na saúde mental e psicológica das detentas. Relatos de graves problemas psiquiátricos e quadros de depressão foram compartilhados, ampliando ainda mais a preocupação com as condições em que essas mulheres se encontravam.
Gabriela Fernanda Ritter, presidente da Associação dos Familiares e Vítimas do 8 de Janeiro (ASFAV), reiterou críticas à alimentação fornecida pelo Estado e manifestou a sua indignação diante da falta de entrega de medicamentos controlados aos presos que necessitam de tratamento para comorbidades, caso de seu próprio pai. Os defensores torcem para que a pressão política internacional possa levar o Brasil a enfrentar de maneira séria o cenário interno de violações de direitos e garantir condições humanitárias e dignas para os detidos.