Com a definição das presidências das principais comissões permanentes da Câmara dos Deputados, na última quarta-feira (6), o Partido dos Trabalhadores garantiu a liderança daquela que controlará o maior montante de verbas para emendas de comissão: a da Saúde, que será comandada pelo deputado Dr Francisco (PT-PI). O colegiado dispõe de R$ 4,5 bilhões para alocar em emendas parlamentares neste ano de eleições municipais, em que partidos buscam ampliar seu alcance nas cidades, já de olho na disputa para presidência em 2026.
O valor que ficará com a comissão da Saúde é 40% dos R$ 11 bilhões aprovados para o Orçamento de 2024 em emendas deste tipo, entre comissões da Câmara e do Senado. Os R$ 4,5 bilhões da comissão de Saúde estão distribuídos em oito emendas já aprovadas pelos parlamentares no Orçamento de 2024, prevendo, por exemplo, investimentos na estruturação de Unidades de Atenção Especializada em Saúde, mas não há qualquer especificação sobre onde o recurso "nacional" será alocado.
De acordo com um consultor da Câmara ouvido pela Gazeta do Povo, que preferiu se manter no anonimato, em tese, o presidente de uma comissão é quem tem a "chave do cofre" onde fica o dinheiro reservado a ela.
Embora o governo não seja obrigado por lei a pagar esse tipo de emenda de comissão, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, já afirmou, em fevereiro, que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) dará prioridade para a liberação de emendas de saúde e assistência social até 30 de junho, data limite para fazer repasses a estados e municípios antes das eleições.
Sob o aspecto da articulação política, o controle sobre a comissão da Saúde também dá ao PT uma oportunidade para "blindar" a ministra da Saúde, Nísia Trindade dos interesses do Centrão, que tenta assumir a pasta desde o ano passado e voltou a cobiçar o posto recentemente.
Nísia é uma indicação direta de Lula. O processo de "fritura" se intensificou após as crises na pasta, com a explosão de casos de dengue no país, o episódio da nota técnica do ministério que liberava o aborto ao longo de toda a gestação em caso de estupro (posteriormente suspensa) e denúncias de favorecimento a aliados políticos. Uma comissão da Saúde presidida pelo PT pode evitar convocações em série da ministra que poderiam desgastá-la ainda mais.
"A Comissão de Saúde e os recursos do colegiado nas mãos do PT são um grande ganho eleitoral, em relação aos demais partidos dentro do processo político", observa o analista político Waldir Pucci, lembrando que o dinheiro da saúde é bastante visado pelos políticos, e que recentemente o próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), enviou um requerimento de informações questionando a liberação de valores do ministério para emendas parlamentares de aliados do governo, em detrimento de outros partidos.
"A grande questão é a visibilidade que a pasta de saúde e os recursos de saúde tem para o eleitorado brasileiro, porque infelizmente a saúde é um dos maiores problemas que nós temos no Brasil", afirma. "Temos que lembrar que o cidadão não se trata no Ministério da Saúde, ele se trata na UBS [Unidade Básica de Saúde], ele se trata no hospital da sua cidade, ele se trata na sua localidade, então isso pra ele faz uma diferença muito grande dentro do processo eleitoral", completa.
Sobre a blindagem da ministra Nísia Trindade frente ao apetite do Centrão pelo ministério que ela comanda, a analista Priscilla Lapa, doutora em Ciências Políticas, afirma que é muito relevante manter alguém aliado do PT numa pasta que tem tanto impacto nos municípios.
Ela ressalta ainda que liderança do PT numa comissão da relevância da Saúde no atual momento do partido, que vive dificuldades no relacionamento com o Congresso Nacional, certamente poderá contar a favor do governo petista. "Nesse caso ter um colegiado como este num ano eleitoral, com um aliado ocupando esse espaço e poder priorizar recursos para os governos ligados ao governo federal é, sem sombra de dúvidas, politicamente relevante", garante a analista.
Acordos e interesses também pesam na escolha das comissões pelos partidos
A definição da presidência das comissões na Câmara dá preferência de escolha para os partidos com mais deputados eleitos, por isso, o PL, que elegeu 99 deputados em 2022, pôde escolher o comando da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a mais importante da Câmara. A federação do PT (que inclui PV e PCdoB) veio na sequência e ficou com seis comissões, dentre as que já foram definidas – há outros 11 que deverão ser instaladas nesta semana.
O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) lembra que este processo de definições também passa por interesses e acordos. Ano passado, por exemplo, o PL abriu mão de comandar a CCJ para relatar o Orçamento de 2024, com a promessa de assumir a CCJ neste ano. Por outro lado, a estratégia do PT, na visão do deputado de oposição, buscou priorizar a Comissão de Saúde pelo montante de verbas de emendas disponíveis neste ano, que, segundo Calvacante, beneficiarão a sigla de esquerda em ano eleitoral.
Mas o líder do PL, Altineu Côrtes (RJ), discorda da afirmação do correligionário e diz que há um compromisso firmado entre os partidos e o presidente da Câmara para a destinação de recursos das comissões. "No final das contas isso acaba sendo destinado aos municípios Brasil afora", frisa o líder.
Quem é o novo presidente da Comissão de Saúde da Câmara
O presidente eleito da Comissão de Saúde é Dr Francisco (PT-PI), deputado de primeiro mandato, médico e autor do projeto de lei 529/24, que cria a Política Nacional de Combate à Dengue, à Febre de Chikungunya e à Febre Zika. O deputado já foi prefeito de São Francisco do Piauí, no seu estado de origem, e também comandou a Secretaria de Saúde do estado.
Após ser eleito para a comissão, o deputado disse que nesta semana deverá reunir os novos membros do colegiado para definir um cronograma de trabalho e redistribuir os projetos entre os novos membros. Cabe à Comissão de Saúde debater e votar temas relacionados ao Sistema Único de Saúde (SUS), campanhas de saúde, vigilância epidemiológica, instituições privadas de saúde, atividades médicas e paramédicas, patentes de fármacos, entre outros.
Diante da epidemia de dengue no país, Dr. Francisco destacou a necessidade de fortalecer as políticas públicas contra a doença, que recentemente ultrapassou a marca de um milhão de casos, com centenas de mortes. O deputado lembrou que apesar de conviver com a doença há muitos anos, o Brasil precisa reforçar a política nacional de combate ao mosquito Aedes Aegypti, transmissor de uma série de vírus.
A federação governista PT-PV-PCdoB também terá o comando das comissões de Fiscalização e Controle, Cultura, Amazônia, Direitos Humanos e Direitos das Mulheres.
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