Passados quase quatro anos do atentado que quase matou o presidente Jair Bolsonaro, o agressor confesso Adélio Bispo de Oliveira poderá ter seu futuro definido ainda neste mês de julho. Está prevista para o fim do mês uma perícia psiquiátrica em que ele terá seu estado mental novamente avaliado. Se os médicos atestarem que ele não representa mais perigo, para si ou outras pessoas, Adélio poderá até mesmo deixar a Penitenciária Federal de Campo Grande (MS), onde ele é mantido desde setembro de 2018, após sua prisão em Juiz de Fora (MG), e ir para casa.
Apesar de ter passado todo esse período no presídio, Adélio não cumpre pena, pois não foi condenado pela tentativa de homicídio. Em 2019, ele foi absolvido após ser considerado inimputável, em razão do diagnóstico de “Transtorno Delirante Persistente”, uma doença que, segundo a sentença, o impedia de entender que estava cometendo um crime e, com isso, determinar, por sua própria vontade, uma conduta oposta.
Nesta decisão, de junho de 2019, o juiz do processo, Bruno Savino, de Juiz de Fora, ordenou que ele ficasse internado por tempo indeterminado, mas que fosse reavaliado em três anos, prazo que venceu no mês passado. A perícia só não foi realizada até o momento pela dificuldade de encontrar psiquiatras dispostos a fazer a avaliação.
Após mais de um mês de tentativas, a Justiça Federal conseguiu, com a colaboração de Associação Brasileira de Psiquiatria, designar dois profissionais para o procedimento, que será bancado pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), vinculado ao Ministério da Justiça e que administra os presídios federais.
Caso seja constatado que ele está 100% curado, Adélio poderá ir para a casa e terá liberdade para circular livremente pelas ruas, segundo o advogado Zanone Manuel de Oliveira Júnior, que defendeu Adélio no início do processo e hoje responde como seu curador, ou seja, o responsável por cuidar de seus interesses na Justiça.
“Esses peritos vão analisar se houve alguma melhora, se houve a convalescência [recuperação da doença] total ou parcial, o quadro de saúde. O perito vai juntar isso e falar se ele pode sair da medida de segurança detentiva para a restritiva. Ou seja, ao invés da internação, se ele pode fazer um tratamento ambulatorial em casa, em que teria de ficar alguém, uma enfermeira ou pessoa da família, responsável pela medicação”, explicou à Gazeta do Povo.
A decisão final caberá a um juiz de Campo Grande, que supervisiona a internação. Zanone entende que o melhor para Adélio é que ele continue no presídio de segurança máxima. “Eu sou a favor que ele continue no sistema federal, porque ele já foi ameaçado de morte no sistema estadual. Para mim, hoje, o Adélio na rua, no atual cenário político, com os ânimos acirrados, eleição se avizinhando, o Brasil é pequeno para ele”, afirmou.
Questionado se, solto, Adélio seria capaz de cometer um novo atentado, Zanone diz que só os psiquiatras poderão responder. “Tem que avaliar a capacidade de compreensão dele, do que é certo e o que é errado, e de autodeterminação, se ele domina sua própria vontade.”
Uma solução intermediária, ainda segundo o advogado, seria liberá-lo para casa, mas manter medidas de monitoramento – como uso de tornozeleira, restrição de locomoção, comparecimento periódico perante um juiz – a exemplo do que é feito com criminosos que representam algum perigo.
Nesta quinta-feira (14), o juiz Bruno Savino, de Minas Gerais, pediu ao juiz corregedor da penitenciária de Campo Grande a renovação da permanência de Adélio no estabelecimento. Segundo Zanone, no entanto, trata-se de uma decisão apenas sobre sua permanência no local, não sobre a prorrogação da internação, que será definida a partir da perícia, ainda não realizada. Ainda conforme o advogado, é a partir do exame que o magistrado de Campo Grande decidirá se ele ficará internado por mais um ano. A partir daí, de ano em ano a condição mental e comportamental de Adélio será reavaliada, para novas decisões sobre o prolongamento da internação.
Cartas indicam estado psicótico grave de Adélio
A liberação é medida menos provável, no entanto, diante do histórico recente de Adélio no presídio. Nos últimos anos, ele passou a enviar cartas para o advogado e alguns veículos de imprensa. Várias delas, publicadas no mês passado pela revista Veja, indicam um “estado psicótico grave”, de esquizofrenia paranoide, segundo um médico consultado.
Nessas cartas, Adélio escreve, por exemplo, que “Bolsonaro é o anticristo”, faz acusações contra uma suposta conspiração da maçonaria, divaga sobre o Santo Daime... Tudo isso em frases desconexas, mal formuladas e de sentido quase incompreensível.
“E o rito dos ritos no Planalto Central no jardim da Presidência colocado por eles (maçons) representa o mundo dos mortos e como a pirâmide em fotos do meu celular que por sua vez fotografei em Juiz de Fora em Minas Gerais próximo ao Hotel Trade em uma rotatória pirâmide com arcos que a envolve em leste oeste e sul norte nesta (incompreensível) vem o anticristo”, diz uma das cartas publicadas pela Veja.
A previsão é que em dois meses, ou um mês após a perícia, o resultado da perícia seja oficializado no processo, para então o juiz decidir. Se ele continuar no presídio, como prevê seu curador, ele passará a ser reavaliado a cada ano, para definir se poderá ou não deixar o presídio e ir para casa.
No ano passado, a Defensoria Pública da União chegou a requerer que ele fosse internado num hospital psiquiátrico em Barbacena (MG), onde poderia ficar mais próximo da família. O Supremo Tribunal Federal (STF), negou o pedido, por ausência de vagas em Minas e pela constatação de tratamento adequado na penitenciária de Campo Grande.
Investigação sobre suposto mandante da facada prossegue
Fora a indefinição sobre a permanência ou não no presídio, ainda ronda o caso de Adélio a dúvida sobre a participação de terceiros ou a existência de um mandante para o atentado contra Bolsonaro.
Dois inquéritos da Polícia Federal já concluíram que ele agiu sozinho, mas uma nova frente de investigação, reaberta no fim do ano passado e ainda inconclusa, busca revelar quem pagou pelos serviços de Zanone Manuel de Oliveira Júnior.
O advogado sempre disse que foi uma pessoa ligada à igreja evangélica que Adélio frequentava em Montes Claros (MG), sem dar muitos detalhes nem identificar esse patrocinador.
Diretamente interessados na questão, o presidente Jair Bolsonaro e seu advogado pessoal, Frederick Wassef, conseguiram, no ano passado, derrubar uma decisão que impedia a análise de material apreendido pela PF em locais de trabalho de Zanone. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ainda tenta reverter essa decisão no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília, alegando que o procedimento afronta o sigilo profissional de advogado com cliente.
Zanone não soube informar se o material que foi apreendido em seu escritório já foi periciado. O delegado Martin Bottaro Purper, que passou a tocar a investigação, tem experiência em investigações de homicídios e já coordenou ações contra o Primeiro Comando da Capital (PCC), maior facção criminosa do país, nascida em presídios paulistas.
Bolsonaro e Wassef sustentam que Adélio não tem problemas mentais, e que agiu como um terrorista a mando de alguma organização criminosa ligada à esquerda para assassinar o então candidato. A reportagem apurou que a defesa do presidente poderá requerer a participação de peritos assistentes para acompanhar a avaliação psiquiátrica, prevista para o fim deste mês, e verificar o resultado da avaliação oficial.
Procurado para comentar o caso, Wassef disse que não pode falar sobre a investigação, porque o processo corre sob segredo de Justiça.
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