A nomeação de Ciro Nogueira para a Casa Civil do governo federal não vai alterar o tamanho da base do governo na Câmara e no Senado, ao menos por enquanto. Mas líderes do governo no Congresso ouvidos pela Gazeta do Povo creem que ter o presidente nacional do PP no "coração" do Palácio do Planalto pode solidificar a base. Ciro Nogueira toma posse oficialmente nesta quarta-feira (3), mas já está trabalhando junto à Presidência da República desde a semana passada.
Na Câmara, a base calcula que o governo tem hoje, pelo menos, os 308 votos necessários para se aprovar uma proposta de emenda à Constituição (PEC). A depender da pauta, os votos podem chegar a 360, mas nada que chegue à contabilidade de 384 votos feita em fevereiro pelo líder governista, Ricardo Barros (PP-PR).
"Nunca teve isso, qual foi a votação que chegamos nisso? Tem ali alguns partidos que não são da base, mas que, em algumas pautas, apoiam. O PSDB e o Novo, por exemplo, não são, mas votam em algumas reformas que o Planalto quer", explica o deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA), vice-líder do governo na Câmara.
No Senado, a leitura é semelhante. A base calcula que o governo tenha entre 50 e 60 votos, algo não muito diferente do cenário atual. "O que muda é que o Ciro vai deixar a base melhor organizada", analisa um interlocutor do Planalto. "Ainda mais que, agora, o Ciro vai ter a caneta para poder fazer as articulações", complementa.
Como Ciro Nogueira pode elevar o tamanho da base
O desafio inicial de Ciro Nogueira será o de organizar e solidificar a base no Parlamento. Paralelamente e após isso, o ministro poderá adotar as articulações para elevar a sustentação de apoio do governo. Seu dever será o de contar votos e aumentá-los para assegurar não apenas as vitórias do governo nas duas Casas, mas, também, preparar o palanque da campanha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de aliados nos estados.
Para atingir esse objetivo, interlocutores palacianos admitem que o novo ministro da Casa Civil buscará trazer o PSD de volta à base governista, em uma interlocução que pode envolver a recriação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e sua cessão a Gilberto Kassab. "Hoje, estamos quase 100% fora da base, falta só uma declaração formal do Kassab com a gente. Somos praticamente independentes do governo", diz uma liderança do PSD na Câmara à reportagem.
O senador Elmano Férrer (PP-PI), vice-líder do governo no Senado e segundo-secretário da Mesa Diretora, é entusiasta da ideia de Nogueira priorizar o retorno formal do PSD à base. "No meu entendimento, esse deve ser um dos primeiros caminhos que o Ciro deve fazer na construção do diálogo com vistas ao fortalecimento de uma provável e quase certa candidatura do nosso Bolsonaro", destaca.
A recriação do Ministério do Trabalho foi uma decisão acertada e que ajuda no processo de recuperar a base, avalia Férrer. O senador cita o elogio feito pelo presidente nacional do Solidariedade, deputado Paulinho da Força (SP), outro que se distanciou do governo. "O Ciro se entende muito bem com o Paulinho, o Kassab, o Marcos [Pereira, presidente do Republicanos], o Valdemar [da Costa Neto, dirigente do PL]. É a pessoa certa para fazer esse movimento e dialogar também com o MDB, não o MDB radical", sustenta.
O deputado federal Pedro Lupion (DEM-PR), vice-líder do governo no Congresso, é outro defensor dessas conversas. "Um dos motivos da entrada do Ciro no coração do Planalto foi justamente isso, fazer essa articulação. Ele abre portas e canais de diálogos muito fortes com todos os presidentes partidários. Nenhum outro ator político do Palácio teria condições para falar de igual para igual com os dirigentes", pondera.
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, deputado licenciado pelo PSD — e que deve se filiar ao PP —, é um dos que auxiliará Nogueira nas conversas com Kassab. Outro dirigente partidário que pode entrar na mira da costura promovida pela Casa Civil é ACM Neto, presidente nacional do DEM, que terá o senador Jaques Wagner (PT-BA) como adversário ao governo baiano nas eleições de 2022.
A adesão do DEM à base por agora, entretanto, é improvável. "É uma questão muito mais de problema pessoal do presidente ACM Neto com a nomeação do ministro [da Cidadania] João Roma. O Neto não queria e ficou essa rusga", explica Lupion, que é vice-presidente nacional do partido. "Mas havendo a polarização [entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula], é muito mais fácil para o Neto ter Bolsonaro no palanque do que buscar uma terceira via", complementa.
Como a Casa Civil pode organizar a base do governo no Senado
O Planalto nutre grandes expectativas com a chegada de Nogueira à Casa Civil. Senador licenciado, o presidente do PP terá o papel de organizar a base em sua "casa". Até a gestão de Davi Alcolumbre (DEM-AP), a articulação governista avalia que não havia grandes dificuldades. "O Alcolumbre fazia uma costura que contemplava todo mundo", sustenta um interlocutor palaciano.
Com a eleição de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) à presidência, o Planalto entende que o senador deixou de fazer o mesmo "meio-de-campo" com os parlamentares — até por ter sido eleito com o apoio de partidos da oposição. "Ficou um vácuo de poder que o Fernando [Bezerra (MDB-PE), líder do governo no Senado] não conseguiu ocupar", reforça o interlocutor.
Agora, com Ciro na Casa Civil, a expectativa da articulação é que ele reabra o diálogo com a base. "Eu entro no sétimo ano de meu mandato e sempre percebi uma falta de articulação entre o Senado e o Executivo", analisa o senador Elmano Férrer.
"Esse trabalho de aproximação foi feito com muita competência por outros senadores, como o Fernando Bezerra e o Eduardo Gomes [(MDB-TO), líder do governo no Congresso], mas creio que não ao [nível] que Ciro fará na Casa Civil. Ele tem uma vasta experiência armazenada e tenho a convicção de que vai fortalecer o entendimento parlamentar que deve haver entre o Executivo e o Legislativo, e vice-versa. Sinto, realmente, a falta disso", complementa Férrer.
Que desafios Ciro Nogueira terá de superar na organização da base no Senado
A volta das atividades legislativas nesta semana marca o efetivo início das articulações de Ciro Nogueira no Senado. E o ministro da Casa Civil começa com um grande desafio pela frente: aprovar a indicação do ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), André Mendonça, ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O titular da AGU ainda enfrenta resistências no Senado, não a seu nome ou à pessoa, mas, sim, por expectativas criadas de outros nomes melhor avaliados por senadores, segundo apurou a reportagem, a exemplo do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, e do titular da Procuradoria-Geral da República (PGR), Augusto Aras.
Diante disso, o Planalto estuda como estratégia no Senado promover primeiro as sabatinas de embaixadores pendentes na Comissão de Relações Exteriores (CRE) e da recondução de Aras à PGR, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que o governo acredita ter mais de 60 votos para aprovar. A ideia é fazer "testes" junto à base para assegurar pelo menos 50 votos a Mendonça no plenário.
O senador Elmano Férrer não crê, entretanto, em dificuldades para aprovar a indicação de Mendonça. Para ele, mesmo sem Nogueira na Casa Civil, seria possível aprovar com alguma vantagem acima dos 41 votos mínimos. "É algo que acredito devido ao trabalho que ele está fazendo no contato com os senadores. Com o Ciro, facilitou muito mais e isso vai aumentar [os votos]", prevê.
O principal desafio de Nogueira estará, contudo, na CPI da Covid. Férrer acredita que os trabalhos do colegiado ampliaram as tensões entre o Senado e o Planalto. "A CPI criou um inegável clima de animosidade que o Ciro terá de distensionar. Mas, no meu entendimento, ele vai jogar um banho de água fria na comissão, porque aquilo transformou-se em uma inquisição", analisa o senador.
Qual será o novo papel da Casa Civil para consolidar a base na Câmara
A nomeação de Ciro Nogueira ao Planalto também impacta a articulação na Câmara, Casa legislativa onde atuou por 16 anos. A expectativa de governistas é que ele consolide a base em uma articulação pragmática e cumpra, assim, a promessa feita ao deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES), vice-líder do governo na Câmara.
"O que nos interessa é o painel do Senado e da Câmara, onde estão as reformas importantes. Com a Flávia [Arruda, ministra-chefe da Secretaria de Governo] e o Ciro, o governo reforça um time que já era bom. Venceu todas [as votações], não perdemos nenhuma", destaca Melo.
Apesar dos elogios feitos pelo vice-líder governista, a articulação política ainda era criticada por parlamentares da base nos bastidores. Com Nogueira, entretanto, Melo acredita que esses ruídos reduzirão e acredita até na possibilidade de ampliação da base.
"Vamos trabalhar com a hipótese que tinha um vácuo dessa gestão e vamos admitir que esse vácuo, agora, foi preenchido, ele não existe mais. O senador Ciro é um homem preparado, é a peça que faltava para o governo continuar de pé e aumentar sua base", analisa Melo.
O deputado Joaquim Passarinho analisa com mais sobriedade a nomeação. "Não muda em nada o tamanho da base, fazem muita espuma. Saiu o [Luiz Eduardo] Ramos [transferido para a Secretaria-Geral], que tinha uma boa articulação, e entrou um político. Vai melhorar a relação com o Congresso? Vai, ele é experiente, sempre foi bom articulador, mas não vejo ninguém dizendo que vai deixar ou ingressar à base por causa disso", diz o vice-líder do governo.
Quais as 'provas de fogo' da articulação do Planalto na Câmara
O ministro Ciro Nogueira terá algumas "provas de fogo" para testar a base após sua nomeação. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), anunciou que irá tratar imediatamente dos textos da reforma tributária, da reforma eleitoral, da privatização dos Correios, da reforma administrativa e do voto impresso auditável.
"Vamos tratar de temas super importantes que precisam de uma base forte, grande, e entendo que esse protagonismo do PP com o Ciro acaba dando uma margem muito boa dentro da Câmara e resolve o maior calo que temos, hoje, que é o Senado", destaca o deputado Pedro Lupion, vice-líder do governo no Congresso.
Os textos da reforma tributária discutidos pelo governo estão bem encaminhados e em processo de reformulação entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e os respectivos relatores. O governo acredita que serão matérias que terão maior facilidade.
Já a reforma administrativa pode não ser aprovada mesmo com a reformulação da base, sobretudo com o próprio Lira dizendo que ela pode entrar na pauta do plenário até novembro e, assim, dilatando a previsão de votação. Pautas que atingem o serviço público são impopulares, sobretudo em ano pré-eleitoral, quando o comum é a discussão de pautas mais "palatáveis" politicamente.
A privatização dos Correios será um teste importante para a medir a base, que aprovou anteriormente a desestatização da Eletrobras. A reforma eleitoral, que prevê o voto distritão, tem conversas avançadas e boas chances de passar, afirma Lupion. O voto impresso, contudo, não é visto com otimismo pelo vice-líder do governo. "Ainda não consigo ver uma articulação tão pesada que leve os partidos a voltarem atrás e apoiarem o texto para levar ao plenário", avalia.
Que influência Ciro Nogueira pode ter na base do governo no Congresso
Além das votações na Câmara e no Senado, existem as votações das sessões do Congresso, como discussões de vetos presidenciais e medidas provisórias (MPs). As perspectivas de organização da base com deputados e senadores por óbvio, levam a base governista a criar boas expectativas para as sessões do Parlamento.
O deputado Marco Feliciano (Republicanos-SP), vice-líder do governo no Congresso, tem boas expectativas com a nomeação de Nogueira ao Planalto. "Um político com a envergadura dele frente a um ministério da importância da Casa Civil, com certeza dará uma nova dinâmica nas relações do governo com o Parlamento", analisa.
A quantificação da base do governo é, contudo, difícil de calcular no momento, analisa Feliciano. "Pois não existe unanimidade entre os membros dos partidos, mas é óbvio que só melhora o apoio às pautas governistas. A tendência da base governista com um político experiente e bem articulado na chefia da Casa Civil é se manter fiel ao bloco de apoio", avalia.
O vice-líder do governo não tem dúvidas de que o Planalto terá votos suficientes para aprovar as pautas mais significativas para o país. "Politicamente, muda para melhor, pois os políticos se sentirão mais prestigiados e a base fiel fica solidificada, pavimentando o caminho para um grande bloco de apoio até 2022", pondera. "Para nós, vice-líderes e líderes no Congresso, prevejo que teremos mais facilidade nas articulações das pautas de interesse público devido a esse rearranjo na política de apoio ao governo", complementa Feliciano.
Quais os desafios que a Casa Civil terá nas sessões do Congresso
O ministro Ciro Nogueira também terá desafios pela frente nas sessões do Congresso, sobretudo no que diz respeito aos vetos presidenciais. Rejeições de trechos parciais ou totais de Bolsonaro — muitos dos quais são previamente acordados pela articulação antes de sua aprovação — têm irritado a base.
Em março, por exemplo, Bolsonaro sancionou parcialmente o projeto de lei que instituiu os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro), que criou um instrumento de captação de recursos para o agronegócio no mercado financeiro. A proposta foi aprovada com acordo entre governo e os partidos nas duas Casas. Em junho, o Congresso derrubou o veto parcial.
Na semana passada, Bolsonaro vetou integralmente o projeto de lei que obrigava os planos e seguros de saúde a oferecerem a quimioterapia oral domiciliar aos doentes de câncer. O autor da proposta, senador Reguffe (Podemos-DF), pediu a sanção da proposta em reunião no fim de semana com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
"Tem tido muito problema nos vetos. Existia e agora acho que o maior desafio do ministro Ciro na articulação do Congresso será conter isso, as decisões tomadas no Palácio por assessores do presidente que acabam descumprindo acordos que fazemos para vencer as votações", critica o deputado Pedro Lupion.
O vice-líder do governo diz que o projeto que obriga planos e seguros de saúde a oferecerem a quimioterapia aos doentes de câncer, por exemplo, incomodou a base. "Está a maior confusão. É um projeto que houve acordo com a base para que fosse votado. Agora, fica a oposição tripudiando pelas costas que não vamos derrubar [o veto]", desabafa Lupion.
O fundão eleitoral é outro na esteira da polêmica. Bolsonaro tem sinalizado que vetará a proposta. "Acho que grande parte dos parlamentares terá uma dificuldade imensa para derrubar um veto que trata de fundo eleitoral. É um desgaste extremamente desnecessário e uma injustiça com os parlamentares que votaram a favor, porque votaram pelo Orçamento [o fundão foi incluído dentro do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)]", diz Lupion.
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