O ministro da Justiça, Flávio Dino, tornou-se favorito para ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF) não apenas por ter a confiança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Contatos e experiência dentro do Poder Judiciário, experiência e perspicácia política, enfrentamento direto à direita que apoia o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), além de certa antipatia e inveja por parte do PT, fizeram do ex-juiz, ex-governador e senador licenciado do PSB o preferido para o cargo.
Hoje, Dino também conta com o apoio dos dois mais poderosos ministros do STF: o decano Gilmar Mendes e o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes.
A proximidade com Lula interessa a eles, especialmente num momento em que a Corte se vê acuada ante iniciativas no Congresso que podem reduzir poderes dos ministros, como os limites às decisões monocráticas e pedidos de vista, fixação de mandatos e possibilidade de revisão de suas decisões pelo próprio Legislativo. O Executivo, hoje, se opõe a essas propostas porque tem no STF um aliado e por entender que o avanço delas pode atrapalhar a aprovação de sua agenda econômica, além de criar uma crise entre os poderes que nada ajudaria Lula.
Além de ser próximo de Lula, Dino também tem trânsito no Congresso. Em 2006, deixou a carreira de juiz federal para se eleger deputado federal pelo PCdoB. No governo Dilma Rousseff, foi presidente da Embratur e, em 2014, elegeu-se governador do Maranhão, cargo para o qual foi reeleito. No ano passado, foi eleito senador pelo estado pelo PSB. A vocação política vem do berço: seu pai, advogado, foi vereador de São Luís, deputado estadual e prefeito no interior. Caso seja mesmo indicado para o STF, o histórico deve garantir a aprovação de Dino pelo Senado.
A parcela mais pragmática do PT, por sua vez, prefere Dino no STF porque se incomoda com a popularidade e protagonismo que ele obteve em menos de um ano no governo. Dino nunca foi do partido e, dentro do STF, dificilmente abriria mão da cadeira de ministro para se candidatar à Presidência e, com isso, frustrar planos da legenda de um petista suceder Lula na Presidência – hoje, almejam esse posto os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Rui Costa (Casa Civil).
O PT ainda teria interesse em ocupar ou apadrinhar um nome para o Ministério da Justiça, que poderia ainda ser desmembrado, para que fosse criada uma pasta específica para a Segurança Pública. As duas áreas passaram a ser consideradas fundamentais para a imagem do governo, em razão do recrudescimento da violência e da criminalidade nos últimos meses.
Fora isso, Dino é reconhecido dentro do PT e apreciado por Lula por ser, dentro do governo, o mais ferrenho crítico e opositor de políticos e grupos ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
O ministro da Justiça bateu de frente com parlamentares da direita que o convocaram ao Congresso, principalmente para questionar o desmonte da política de acesso a armas do governo passado, indagá-lo sobre a visita ao Complexo da Maré, no Rio, e ainda sobre a suspeita de omissão na proteção da Praça dos Três Poderes no 8 de janeiro.
Regulamentação da internet e PF
A avaliação do entorno de Lula é que, além do embate verbal, Dino também se saiu bem em medidas mais concretas, principalmente na tentativa de pressionar as plataformas digitais para banir conteúdos incômodos à esquerda, sob o pretexto de combater o “discurso de ódio”.
Em julho, em discurso no congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), o ministro admitiu que defende a regulamentação mais rígida do que trafega nas redes por considerar que “a internet funciona como uma plataforma das ideias da direita, funciona como uma plataforma do poder econômico, funciona como uma plataforma da negação de direitos”.
A defesa da regulamentação também agrada vários ministros do STF, que entendem que as plataformas permitiram que corressem soltas mensagens e postagens que incentivaram a manifestação do 8 de janeiro que resultou na invasão e depredação das sedes dos Poderes.
Dino agiu em sintonia com Alexandre de Moraes em maio, quando abriu uma apuração no Ministério da Justiça contra o Google por publicar, em sua página inicial de buscas, link para um texto crítico ao projeto de lei das “fake news” – medida semelhante foi tomada pelo ministro no âmbito judicial, com abertura de inquérito criminal na Corte.
A ascendência de Dino sobre a Polícia Federal também é vista como um atrativo, uma vez que a atual direção e postos relevantes dentro da corporação foram preenchidos com sua participação e conhecimento. A PF é importante para o STF porque executa as investigações de Alexandre de Moraes nos inquéritos das “fake news” e das “milícias digitais”, principais frentes da ofensiva contra a direita ligada a Bolsonaro.
Ademais, formou-se uma tradição, desde 1988, de nomear ministros da Justiça para a Corte. Saíram da pasta para o tribunal Alexandre de Moraes (nomeado por Michel Temer), André Mendonça (indicado por Jair Bolsonaro), e os ex-ministros Nelson Jobim (Fernando Henrique Cardoso), Maurício Corrêa (Itamar Franco) e Paulo Brossard (José Sarney).
Oposição à Lava Jato
Outro fator que importa para Lula no STF, presente em Dino, é a posição de franca oposição à Lava Jato. O presidente se arrepende de algumas indicações que fez para o tribunal e quer evitar novas investigações aos moldes da operação contra si ou aliados. O mesmo critério será determinante para a escolha do próximo procurador-geral da República.
Além de declarações críticas a expoentes da Lava Jato, como o senador e ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador e deputado cassado Deltan Dallagnol, Dino mobilizou a PF para apurar supostas irregularidades na 13ª Vara Federal de Curitiba, com base numa fiscalização recente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), focada nos recursos recuperados. No STF, portanto, Dino se somaria à ala que, desde 2019, vem paulatinamente anulando condenações e investigações.
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