O homem de R$ 30 bilhões: como funciona a regra que dá a “chave do cofre” a um deputado

O Congresso Nacional vai decidir na tarde desta terça-feira (3) se mantém ou derruba o veto do presidente Jair Bolsonaro ao artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias que garante ao relator-geral do Orçamento deste ano – o deputado Domingos Neto (PSD-CE) – a gestão de R$ 30,1 bilhões. Caso o veto seja derrubado, o deputado-relator ganhará poderes inéditos. Ele vai definir para onde vão os R$ 30 bilhões, e caberá ao Executivo somente cumprir o que foi determinado pelo parlamentar.

O poder de gestão de parte do Orçamento para o relator foi incluído pelos próprios deputados e senadores no ano passado no projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias válido para 2020. Eles decidiram criar uma nova categoria de emenda – a chamada emenda de relator. E separaram R$ 30,1 bilhões do orçamento de 2020 para essa modalidade.

O presidente Jair Bolsonaro, ao sancionar a lei orçamentária de 2020, vetou a criação da emenda de relator e manteve a gestão dos R$ 30,1 bilhões a critério do Poder Executivo. O que os parlamentares vão decidir na tarde desta terça é se mantêm o veto do presidente ou se derrubam e devolvem o poder de gerir os R$ 30,1 bilhões ao relator do Orçamento.

Como funcionará a emenda de relator

Caso os parlamentares derrubem o veto de Bolsonaro, ficará a cargo do relator do Orçamento de 2020 definir onde serão aplicados R$ 30,1 bilhões ao longo deste ano. O Orçamento indica apenas quais são as programações orçamentárias. E essas programações são genéricas e de alcance nacional.

Segundo um consultor de Orçamento da Câmara consultado pela Gazeta do Povo, esses R$ 30,1 bilhões têm de ser distribuídos por 180 rubricas. Essas rubricas estabelecem que as verbas precisam ser destinadas, por exemplo, para custeio de serviço da saúde, assistência hospitalar e ambulatorial, projetos de desenvolvimento regional, educação básica, desenvolvimento urbano, setor agropecuário, segurança, apoio a projetos de infraestrutura turística, entre outros.

A decisão sobre onde cada verba será aplicada (em qual município) e para que obra especificamente ficará a cargo do relator na maioria dos casos, segundo esse consultor, que conversou com a Gazeta do Povo na condição de anonimato. Em tese, explica, o relator poderia destinar toda a verba para a sua região. Mas a tendência é que seja costurado um acordo com os líderes partidários para definir para onde vai cada pedaço do dinheiro. O Poder Executivo, então, terá apenas de executar o que for decidido pelo relator.

Essa emenda de relator vale somente para o Orçamento de 2020. Caso os parlamentares queiram manter o mecanismo para 2021, vão precisar aprovar a medida no Orçamento do ano que vem, cuja discussão começa em abril.

Relator vai gerir 22% das despesas "livres"

Caso realmente o veto seja derrubado, o Congresso colocará 22,15% da receita de livre manejo do Orçamento para gestão do relator Domingos Neto. Isso acontece porque o Orçamento de 2020 prevê um total de R$ 135,9 bilhões para as chamadas despesas discricionárias, ou seja, aquelas de livre manejo, como custeio da máquina pública e investimento.

Desses R$ 135,9 bilhões, a distribuição das emendas ficaria assim, segundo a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara:

• R$ 30,1 bilhões sob a gestão do relator;
• R$ 9,5 bilhões para emendas individuais (valor que é dividido entre deputados e senadores para destinação a obras e investimentos em suas regiões);
• R$ 5,9 bilhões emendas de bancadas (valor que vai para obras e investimentos definidas pelas bancadas de cada estado);
• R$ 3 bilhões para emendas de comissões permanentes e emendas não impositivas de bancadas.

Assim, sobrariam para livre manejo do Poder Executivo R$ 87,4 bilhões. Especialistas afirmam que o valor pode ser insuficiente para o governo manter a máquina pública e fazer o mínimo de investimento federal necessário. Em geral, o poder Executivo precisa de, pelo menos, R$ 100 bilhões.

Caso o veto de Bolsonaro seja mantido pelo Congresso, os R$ 30 bilhões voltariam para a gestão do Poder Executivo, que ficaria com R$ 117,4 bilhões das despesas discricionárias para manejo.

Quem é Domingos Neto

O deputado federal Domingos Neto foi escolhido no ano passado para ser o relator do Orçamento de 2020. O Orçamento válido para um ano é sempre votado e aprovado no ano anterior. A peça é encaminhada pelo Poder Executivo ao Congresso, e os deputados e senadores podem fazer as modificações que julgam necessárias, respeitando a lei. Após a aprovação do Congresso, o Orçamento segue para sanção do presidente, que pode vetar alguns trechos.

Domingos Neto é o coordenador da bancada cearense no Congresso Nacional. O seu nome foi escolhido em fevereiro do ano passado entre os 25 parlamentares do estado – neste ano, ele também continua como coordenador. A indicação dele para a relatoria do Orçamento aconteceu em abril, após decisão do bloco parlamentar liderado pelo deputado Elmar Nascimento (DEM-BA).

Natural de Fortaleza, Domingos Neto tem 31 anos. Ele é deputado federal desde 2011. Em 2013, licenciou-se do mandato para assumir o cargo de Secretário Municipal da Copa em Fortaleza, a partir de 7 de fevereiro de 2013. Reassumiu o posto em 2014, tendo sido reeleito para o mandato de 2015 a 2019. Em 2018, foi novamente eleito pelo seu estado.

É bacharel em Direito e mestre em Administração Pública. É filho do ex-vice-governador cearense Domingos Gomes de Aguiar Filho e da ex-prefeita de Tauá Patrícia Aguiar. Na área econômica, foi favorável à PEC do Teto de Gastos, aprovada em 2016, e à reforma trabalhista, aprovada em 2017. Em 2019, relatou o Orçamento pela primeira vez.