Presidente Lula decidiu revogar portaria do Fisco sobre o monitoramento do Pix| Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
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Depois de ter fracassado na operação para tentar conter a crise de imagem e de ser alertado por aliados de que pequenos comerciantes em todo o país teriam passado a recusar o pagamento via Pix, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recuou da portaria da Receita Federal que ampliou o monitoramento das transações financeiras em todo o país. A medida foi acertada nesta quarta-feira (15) durante uma reunião no Palácio do Planalto com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e visa conter um embate direto com a oposição sobre o tema no Congresso Nacional.

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Antes de tomar essa decisão, o Palácio do Planalto já havia escalado diversos aliados do governo para tentar conter a enxurrada de críticas nas redes sociais sobre a ampliação da fiscalização sobre as transações financeiras. Contudo, um vídeo publicado pelo deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) ampliou a pressão dentro do governo Lula para que o texto fosse imediatamente revogado. 

A publicação do deputado, feita na terça-feira (14), já contava com aproximadamente 150 milhões de visualizações e o nome de Nikolas Ferreira esteve entre os assuntos mais comentado na rede social X (antigo Twitter) nesta quarta. A avaliação dentro do governo é de que o vídeo de um parlamentar da oposição veio a público antes de uma reação por parte do Executivo para conter a crise.

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Na gravação, Nikolas disse que o governo queria monitorar profissionais informais como se fossem “grandes sonegadores”. O deputado esclareceu que o Pix não seria taxado, mas avaliou que a medida poderia estar nos planos do governo Lula mais adiante.  

“É sempre é bom lembrar, a comprinha da China não seria taxada, mas foi. Não ia ter sigilo, mas teve. Você ia ser isento do imposto de renda, não vai. O Pix não será taxado, mas não duvido que possa sim. Quem mais será afetado por esta medida serão os trabalhadores, que serão monitorados como se fossem grandes sonegadores”, salientou o parlamentar.

Antes disso, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) já havia afirmado que estava mobilizando a bancada de seu partido no Congresso Nacional para derrubar a medida da Receita.  "Junto à nossa bancada de deputados e senadores do PL, e de outros partidos, buscaremos medidas para derrubar essa desumana Instrução Normativa da Receita de Lula da Silva", disse Bolsonaro em post no X.

Após a repercussão negativa para o governo nas redes sociais, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, alegou que a portaria estava sendo "distorcida" pela oposição. "Instrução está sendo revogada porque ela não pode ser usada de pretexto para desvirtuar a tramitação da MP. Não queremos que a oposição continue distorcendo essa medida", disse. 

Antes de revogar a decisão, Haddad já havia informado que a Advocacia-Geral da União (AGU) foi acionada, pois "tem havido crimes envolvendo relações de consumo" e que envolvem cobrança adicional pelo pagamento com o Pix em comércios. 

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"A AGU foi envolvida para tomar providências judiciais contra os golpistas. Quem está divulgando fake news está patrocinando organizações criminosas no país, que estão atuando, mandando boleto para a casa das pessoas, cobrando a mais indevidamente, dizendo que estão sendo taxados", disse o ministro.

Já o advogado-geral da União, Jorge Messias, afirmou que a PF será notificada para identificar os autores da "narrativa" contra a "economia popular", que fizeram com que pessoas caíssem em golpes.

Além disso, Messias disse que notificou a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) para investigar práticas abusivas detectadas a partir do anúncio da Receita sobre a fiscalização do Pix.

Governo usou EBC e influenciadores para tentar conter crise do Pix

Escalado para assumir a comunicação do governo Lula, o ministro Sidônio Palmeira já vinha atuando desde a semana passada para tentar conter a crise sobre o Pix. Partiu do marqueteiro, por exemplo, a ideia de que o petista gravasse um vídeo para classificar como "fake news" as informações sobre a taxação do Pix.

"Tem uma quantidade enorme de mentiras, desde ontem, em todas as redes sociais, dizendo que o governo vai taxar o Pix. Eu quero provar que é mentira. O governo não vai taxar o Pix. O que nós podemos fazer é fiscalizar para evitar lavagem de dinheiro. Vou doar R$1013 para resolver o problema da dívida do Corinthians. Estou junto com a torcida do Corinthians. Eu acredito no Pix, acredito no governo e nós não vamos taxar", disse Lula na gravação divulgada na última sexta-feira (10). 

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Além do presidente e de demais integrantes do governo, o Palácio do Planalto vinha usando a estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) para tentar conter a crise. Na segunda-feira (13), o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, esteve no programa Voz do Brasil para tratar sobre o tema.

“Todo mundo gosta da declaração pré-preenchida. Você chega lá e não tem trabalho nenhum. Porque os dados, por exemplo, de saldo, de conta bancária e de aplicação financeira já estão pré-preenchidos. E por que já estão pré-preenchidos? Porque as instituições financeiras prestam as informações para a Receita Federal”, disse o secretário da Receita. 

Desde então, cortes da participação de Barreirinhas passaram a ser usados nas redes da TV estatal. A EBC escalou ainda a apresentadora Cissa Guimarães, do programa Sem Censura, para gravar material para o Instagram, TikTok e Youtube.

“Muita gente está espalhando a fake news de que o Pix será taxado. Isso é mentira”, diz ela no material distribuído pela empresa nas redes sociais. A expectativa dentro do Planalto era de que um rosto popular como o da apresentadora ajudasse o governo nessa ofensiva. 

Além disso, influenciadores ligados ao governo Lula estavam usando suas redes para tratar sobre o tema. O economista e ex-BBB Gil do Vigor publicou um vídeo alegando que a portaria da Receita Federal não trazia nenhuma regra nova. 

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"O que muda agora é uma maior ampliação na transparência, com o objetivo de monitorar mais de perto algumas transações realizadas por meio do Pix ou de cartões de crédito", disse. Ainda segundo o influenciador "a Caixa Econômica Federal, como instituição pública, já enviava informações para o Fisco, e a novidade agora era a obrigatoriedade de bancos privados e fintechs, como Nubank e PicPay, também reportarem esses dados.

Assim como o ex-BBB, a influenciadora Nath Finanças também gravou vídeos para repercutir a informação. “Bancos e instituições digitais, como Nubank, PicPay, 99 Pay e PagSeguro, por exemplo, não estavam na norma. Agora, eles passam a se reportar para a Receita”, disse. 

Portaria do Pix caiu 15 dias após entrar em vigor

Em vigor desde o dia 1º de janeiro, a portaria da Receita Federal estabeleceu que todas as transferências acima de R$ 5 mil para pessoas físicas e de R$ 15 mil para pessoas jurídicas seriam monitoradas para evitar sonegação fiscal. O secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, afirmou, no entanto, que o governo recuou após "pessoas inescrupulosas" distorcerem o ato normativo.

“Nos últimos dias, pessoas inescrupulosas distorceram e manipularam um ato normativo da Receita Federal, prejudicando muita gente no Brasil, milhões de pessoas, causando pânico, principalmente na população mais humilde, desacreditando injustamente um instrumento de pagamento tão importante no dia a dia das pessoas”, disse Barreirinhas, após o encontro com Lula e Haddad no Planalto. 

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Além das transações via Pix, informações de operadoras de cartão de crédito e instituições de pagamento, como grandes varejistas, bancos virtuais e carteiras digitais também estavam sendo monitoradas. Até então, apenas os bancos tradicionais, públicos e privados, repassavam esses dados à Receita.  

Além de revogar a portaria do Fisco, o ministro Fernando Haddad anunciou que o presidente Lula pretende editar uma Medida Provisória (MP) para assegurar que as transferências via Pix não possam ser tributadas. O texto é uma tentativa do governo de conter as reações que já vinham sendo articuladas pelos parlamentares da oposição no Congresso. Os trabalhos no Legislativo serão retomados a partir do dia 1º de fevereiro.  

"O ato que ele [Barreirinhas] acaba de anunciar é para dar força a uma MP que o presidente vai assinar. MP que reforça tanto os princípios da não oneração do Pix, quanto de todas as cláusulas de sigilo bancário do Pix. Que foram objeto de exploração dessas pessoas que estão cometendo crime", afirmou Haddad. 

Oposição afirma que pressão popular ocasionou recuo do governo Lula

O deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), presidente da Frente Parlamentar do Livre Comércio, comemorou a decisão do governo Lula após a mobilização nas redes sociais.

"O recuo do governo sobre a norma de monitoramento financeiro, incluindo o Pix, prova o que sempre defendi: o Brasil só muda quando o povo se mobiliza. Precisamos de força nas ruas e nas redes! E é por isso que a esquerda quer tanto o PL das Fake News: para calar nossa voz", disse Bragança.

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Nas redes sociais, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) afirmou que a união da sociedade “derrubou” a nova regra. “O PT tentou monitorar o seu dinheiro, principalmente o do mais pobre, mas o povo se uniu na rede social e derrubamos a decisão”, disse Nikolas.

Já o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) destacou que a “mobilização espontânea apavorou Lula e Taxad”, em referência ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “Você acabou de testemunhar a verdadeira razão pela qual o atual desgoverno e os falsos defensores da democracia querem censurar as redes sociais: querem oprimir o povo sem serem incomodados!”, afirmou.

Haddad havia dito durante o anúncio da MP que Flávio Bolsonaro não poderia reclamar da Receita, citando suposta prática de "rachadinhas" pelo senador. "As rachadinhas do senador Flávio foram combatidas porque a autoridade identificou uma movimentação absurda nas contas dele. Agora o Flávio Bolsonaro está reclamando da Receita? Ele não pode reclamar da Receita, ele foi pego pela Receita", criticou o ministro.