Os parlamentares contrários ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmam que pretendem organizar uma oposição institucional ao governo no Congresso Nacional. As conversas ainda são incipientes, mas o aumento de deputados e senadores conservadores na próxima legislatura, que toma posse nesta quarta-feira (1º), engrossou o grupo de opositores que trabalha para coordenar um movimento de resistência às medidas e ações de Lula no Palácio do Planalto.
Senadores de oposição argumentam que o primeiro passo é assegurar a eleição do senador eleito Rogério Marinho (PL-RN) para o comando do Senado. "Não para fazer oposição ao presidente Lula, mas para que a Casa seja uma entidade e um poder independente aos poderes da República", diz o senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS). Marinho disputa o comando do Senado com o atual presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG). A eleição ocorre na quarta-feira.
Na Câmara, além de propostas de reuniões semanais, também está em discussão a definição de pautas em comum. O deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES) quer apresentar entre 40 a 60 dias uma agenda legislativa de oposição. Na última quarta-feira (25), ele iniciou os trâmites para a contratação de uma consultoria que vai auxiliá-lo a mapear as pautas prioritárias que virão a ser defendidas pelos parlamentares que irão se opor ao governo federal.
O pontapé para a elaboração de uma agenda legislativa é visto por opositores como a pedra fundamental que marca o início de um processo de organização do grupo de opositores. A lista de pautas ainda será definida em reuniões com deputados a partir da próxima quinta-feira (2), após a posse da nova legislatura.
A ideia de deputados da oposição é apresentar uma agenda ampla contendo pautas que, eles entendem, não terá o apoio de Lula e de seu governo. Entre as propostas, há sugestões de reformas amplas, como a administrativa e a do Judiciário, com direito a delimitações aos poderes de tribunais superiores e mandatos de magistrados, como propõe o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP).
O fim do foro privilegiado, a prisão após condenação em segunda instância e o voto impresso auditável são outras propostas defendidas por diferentes parlamentares. A deputada federal Bia Kicis (PL-DF), autora da proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso votada na última legislatura, atua para apresentar uma nova redação no início da legislatura.
Até a elaboração da agenda legislativa e a definição da estratégias para avançar os assuntos, contudo, Melo defende que a oposição concentre as energias em questionar e convocar ministros do governo para explicar declarações e medidas. "A pauta deve começar pelo combate às inverdades e mentiras sendo disseminadas desde a transição, o governo está exagerando nas fake news", diz. "Vamos montar um exército de questionamentos e o governo pode se preparar, porque vai ter um pacote de convocações de ministros para poder explicar as inverdades que tem dado publicidade", complementa.
O parlamentar também é favorável à instalação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar possíveis responsabilidades do ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, nos atos de vandalismo de 8 de janeiro. Porém, a própria oposição está dividida sobre qual CPI é mais prioritária. Outros acham que a mais urgente é a que propõe investigar supostos abusos de autoridade de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A divergência na política é natural e deputados não veem problemas na indefinição de qual CPI é mais importante, por exemplo. Existe, porém, uma análise entre parlamentares de que é imprescindível assegurar uma coordenação da oposição, sob pretexto e risco de não oferecer uma resistência firme a Lula. Hoje, o grupo de deputados federais que se dispõe a contestar o governo federal ainda está desorganizado, com alguns parlamentares ainda tomando decisões independentes e até sem planejamento.
Qual é o planejamento projetado para organizar a oposição no Congresso
Vice-líder do governo na Câmara na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado Evair de Melo diz que irá construir um organograma para auxiliar na organização da oposição. "Vamos aguardar a chegada de todo mundo, identificar um a um e começar a trabalhar", destaca.
O parlamentar se articula para ser o líder da oposição ao governo Lula na Câmara. "Tem deputado que é bom de articulação, de Judiciário, de falar em comissão e de discursar em plenário. Vamos organizar e avaliar o talento, a especialidade e o papel que cada um pode cumprir na oposição", diz.
Ao identificar a disponibilidade, pretensão e habilidades dos deputados para fazer a oposição, Melo acredita que seja possível montar um bloco coeso e organizado. "Queremos identificar a habilidade potencial de cada um e montar um organograma da oposição para que cada um possa atuar em um campo, seja de fiscalização, denúncia, em plenário ou nos bastidores", explica.
O deputado entende que o processo de organização pode levar "alguns dias", mas assegura que será possível montar uma coordenação eficiente, com o estabelecimento de metas e objetivos. Ele discorda, porém, que a atual desorganização da direita decorra de vaidades.
"Acho que cada um tenta dar o seu melhor mesmo em 'carreira solo'. Tem espaço para todo mundo, a oposição não vai ser uma pessoa, vai ser um bloco onde cada um vai ter o seu protagonismo. Nos outros mandatos, Lula tinha só uma meia dúzia perturbando, agora, ele vai ter um exército alinhado", diz. "Nunca tivemos uma direita organizada na oposição, é uma experiência nova, mas tenho certeza que as abóboras se juntarão e vamos organizar um grupo muito qualificado", complementa.
Nos cálculos de Melo, a bancada orgânica da oposição pode chegar a 250 deputados e a 300 em temas ideológicos. O grupo de oposição dialoga em um grupo de WhatsApp e tem discutido a organização do bloco ainda em termos informais, mas existe a expectativa de que as primeiras reuniões formais possam ter início na próxima semana.
"Estamos nos falando muito no grupo, inclusive essas ações que cada um faz [contra o governo Lula] são compartilhadas, cada um faz ao seu juízo de forma solo, mas com apoio de todos. Na quinta (2) ou sexta-feira (3), vamos reunir o primeiro grupo para organizar as primeiras ações", afirma Melo. Ele e o deputado Sanderson (PL-RS) apresentaram pedidos de impeachment de Lula. Também há pedidos de investigação contra o presidente da República por ter sugerido a hipótese de que a ex-presidente Dilma Rousseff sofreu um "golpe".
No Senado, os cálculos sugerem que a oposição pode chegar a pelo menos 35 votos e os senadores prometem uma oposição com "conteúdo e lógica". "Os bons projetos nós vamos aprovar, mas tudo que não for interessante para o país nós vamos combater", diz Luiz Carlos Heinze.
Para o senador, é importante uma discussão sobre o decreto que restringiu o acesso ao porte e à posse de armas e também a temas da área econômica discutidos pelo governo, como a ideia de moeda única para países do Mercosul e o financiamento de obras em países estrangeiros com recursos do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "Vamos fazer uma oposição responsável para melhorar o destino do nosso país, que já estava sendo bem feito no governo passado", afirma.
O senador Wellington Fagundes (PL-MT) reforça o discurso de defesa de uma oposição responsável que assegure a manutenção dos investimentos e de uma economia fortalecida e sugere que a candidatura do senador eleito Rogério Marinho à presidência do Senado é uma sinalização disso. “Ele quer ser um presidente na linha construtiva, de uma oposição consciente”, afirma.
“Estamos em sintonia com a população, apresentando uma candidatura extremamente viável e que representa mudanças, mas isso não quer dizer que estamos aqui para agredir nosso adversário, é uma casa dos pares, da maturidade, nós representamos os estados brasileiros”, complementa Fagundes.
Oposição quer reuniões semanais para definir até palavras de ordem
A deputada Bia Kicis defende reuniões semanas junto à bancada de oposição a Lula para discutir não apenas pautas legislativas, mas também coordenar denúncias e até palavras de ordem contra o governo. O objetivo é assegurar uma resistência vigilante, proativa, programática e fiscalizatória.
A proposta é que a direita trabalhe com uma organização semelhante à apresentada pela esquerda na gestão Bolsonaro. Bia entende que a esquerda recebia orientações semanais sobre como acusar o antigo governo e o ex-presidente, e considera que as críticas e acusações eram feitas de forma organizada para criar narrativas.
"Uma semana eles eram orientados a chamar o Bolsonaro de genocida, e aí, onde estivesse, a única palavra era essa. Na outra semana era outro assunto, e não importa se é verdade ou mentira, eles não estão nem aí para isso. Eles querem criar uma narrativa, mentir para fazer a narrativa colar. É como se diz na política: uma versão é mais importante que o fato. A gente tem que entender isso", afirma.
A ideia defendida por ela é mencionar palavras de ordem no plenário, nos breves comunicados, em todas as comissões e usar o tempo de liderança para "martelar" e "mostrar o que está sendo feito". "Vamos denunciar as coisas que estão sendo feitas de errado, porque isso com certeza não vai faltar, vai sobrar. Estamos vendo a quantidade de absurdo que já está sendo feito", sustenta.
A parlamentar esclarece que não concorda com o posicionamento da esquerda, mas entende que o modelo de briefing semanal pode ser replicado pela oposição a Lula. "Nós podemos definir palavras de ordem baseadas na verdade, porque para falar mal do PT não precisa criar nenhuma narrativa, é só falar a verdade", defende.
O deputado Luiz Philippe considera que a organização da oposição deve começar por lideranças que tenham "credibilidade" e possam expandir desse núcleo duro para pessoas com pensamento similar. "Ser oposição é ter, primeiro, objetivos comuns, e ter coragem de sofrer as consequências de ser oposição em segundo lugar. Em terceiro, não pode abrir mão da coesão", destaca.
O parlamentar entende que tem muitos deputados com visibilidade, mas sem coesão na defesa das ideias, e vice-versa. "Tem que começar com o núcleo duro bem coeso. A gente ainda está nessa etapa, não estamos nem na etapa de expansão", comenta, com críticas veladas a deputados que considera vaidosos e até narcisistas. "Tem as bancadas 'da live e do meme', que têm canal de mídia e estão loucos para aparecer de novo."
Como opositores querem avançar o voto impresso, reformas e outras pautas
A oposição a Lula também planeja manter um boa relação institucional com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para assegurar a votação de matérias da agenda legislativa a ser construída, incluindo o voto impresso. O deputado Evair de Melo vai apoiar a pauta e promete dialogá-la com Lira junto de Bia Kicis quando o novo texto estiver pronto.
"O Arthur coloca pra votar e respeita, é um homem que não é de sentar em cima de pauta legislativa, ele tem esse perfil. Uma vez convencido da necessidade técnica ele sempre se dispõe a dialogar. Confio muito na palavra dele, como ele tem com todos. Quando botar para votar, respeita o plenário", comenta Melo.
Bia não espera um compromisso de Lira com o mérito do voto impresso, mas acredita que ele possa encaminhá-la para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), uma vez que a nova PEC esteja pronta e com o mínimo de 171 assinaturas necessárias para ser protocolada. "Ainda não comecei a colher as assinaturas porque não redigi essa nova proposta. Estou pensando qual seria a melhor forma de fazer uma redação que afastasse resistências e angariasse apoio", justifica.
Para a elaboração da nova PEC do voto impresso, Bia tem ouvido especialistas, acadêmicos na área de segurança em sistemas eleitorais e também deputados. "Sempre tenho falado que eu pretendo, mais uma vez, dar uma chance à nossa democracia de fazer com que os eleitores se sintam confiantes. Não adianta ministro do TSE ou quem quer que seja dizer que o sistema é seguro ou transparente se o eleitor não confiar, e não adianta dizer que é obrigado a confiar", argunenta.
A parlamentar também planeja pedir a tramitação de CPIs, de propostas que tratam do fim do foro privilegiado, da reforma do Judiciário e da reforma tributária relatada por ela em comissão especial, a PEC 7/2020. De autoria do deputado Luiz Philippe, o texto prevê a concentração da tributação em apenas três categorias de impostos (consumo, renda e propriedade), mas cria uma regra de transição, preserva tributos, como a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e mantém a existência dos fundos de participação dos estados e dos municípios.
A PEC 7 foi aprovada em comissão especial no fim do ano passado e está pronta para ser votada em plenário. Porém, os sinais políticos são de que a reforma tributária a ser discutida é a PEC 45/2019, que tem como autor intelectual o secretário especial para reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. Luiz Philippe critica os movimentos e promete pressionar para que sua proposta tramite.
"Nenhuma das outras propostas conseguiu chegar nesse estágio [da possibilidade de ser votada em plenário] e, agora, corre o risco do governo pensar diferente. Eles têm uma visão completamente centralizadora e aí não sei se o Lira vai apensar a proposta do PT em cima da minha, que não tem nada a ver, já digo isso de antemão", diz.
O parlamentar também é autor de uma proposta de reforma do Judiciário e defende sua pauta, que propõe restringir o STF a uma Corte constitucional. "É a mais abrangente, porque envolve STF, STJ, Ministério Público, nomeações com mandatos, competências", afirma. "Tudo isso é importante porque está pontuado, não dá para fazer reforma do Judiciário pequena e pontual, não resolveria o problema do Judiciário, que evoluiu para ser uma autocracia", acrescenta.
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