Uma pesquisa de opinião divulgada nesta quarta-feira (6) provou que a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva equiparando a guerra de Israel contra o terrorismo do Hamas ao nazismo na Segunda Guerra Mundial derrubou sua popularidade em fevereiro mesmo entre os lulistas. A maior queda foi no segmento evangélico, que representa cerca de um terço da população. Nele, a avaliação negativa do governo Lula deu um salto de 36% para 48%.
A pesquisa quantitativa foi feita pela consultoria Genial/Quaest entre os dias 25 e 27 de fevereiro com duas mil pessoas. Com essa amostra e metodologia, as consultorias afirmam atingir um nível de confiabilidade de 95%.
Ela mostra com evidências técnicas indícios que já eram perceptíveis: a fala de Lula sobre o Holocausto trouxe vergonha para a diplomacia brasileira, fortaleceu o ato pró-Bolsonaro do dia 25 de fevereiro e minou as tentativas de Lula de se reaproximar de parlamentares da bancada evangélica. Os evangélicos têm grande afinidade com Israel por laços de costumes e crenças de cristãos e judeus e pelo fato de o país abrigar locais sagrados para ambas as religiões, entre outros fatores.
Além disso, a referência ao Holocausto gerou a gratidão dos terroristas do Hamas e aumentou em mais de 230% as denúncias de antissemitismo no Brasil, segundo a Federação Israelita de São Paulo.
Segundo a pesquisa Quaest, 60% dos entrevistados disseram que Lula exagerou na declaração sobre o Holocausto. Entre os apoiadores de Lula o índice foi de 43%. Os entrevistados só podiam optar por exagerou, não exagerou ou por não responder ou não ter opinião.
"A pesquisa mostra um quadro muito desfavorável para o governo Lula", avalia o cientista político Adriano Cerqueira, professor do Ibmec e da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). "O Lula está se radicalizando, se afastando do centro político e assumindo um tom de extrema esquerda. Isso ficou bastante evidente nos resultados da pesquisa. Então foi muito ruim para o Lula esse resultado e se ele quiser melhorar a sua performance, vai ter que melhorar a sua comunicação política", pontua o especialista.
De acordo com analistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o resultado da pesquisa foi influenciado pela estratégia de Lula em adotar discursos mais radicais. Os índices mostram que o presidente teve pior avaliação entre evangélicos e a população mais rica do país.
"O presidente Lula, na maior parte, diria que em 95% das vezes, ele continua falando para o eleitorado dele. Aquela questão abordada durante a campanha, de uma pacificação entre os diferentes públicos, não aconteceu. Ele segue falando para aquele eleitor que o elegeu, então a outra parcela da população ainda não se sente representada", analisa a cientista política Deysi Cioccari.
"Um dado muito importante é a perda consistente de Lula e seu governo do eleitorado evangélico. A população católica no Brasil está encolhendo e a evangélica está crescendo. E, entre os evangélicos, a maioria tem uma avaliação negativa de Lula e seu governo", diz Adriano Cerqueira. Entre os evangélicos, o trabalho do presidente Lula chegou a 62% de desaprovação e apenas 35% de aprovação. São 27 pontos percentuais de diferença.
O resultado foi puxado pelas diversas críticas que o petista fez a Israel nos últimos meses. No último dia da pesquisa, Lula falou que o premiê israelense Benjamin Netanyahu cometeu genocídio e quer exterminar o povo palestino.
"O maior desastre dessa fala do Lula, essa comparação indevida sobre Israel, não foi nem na política externa, já que o Brasil não tem tanta presença assim em discussões no exteriores como o Lula gostaria que tivesse, mas foi na política interna mesmo. Avalio que Lula deu literalmente um tiro no pé ao insistentemente fazer acusações contra Israel", diz o especialista que é professor no Ibmec e na UFOP.
Enquanto governo comemora PIB, consumidor sente no bolso os problemas da economia
A pesquisa também avaliou a percepção dos entrevistados sobre economia e voltou a mostrar a insatisfação da população, até mesmo entre o eleitorado de Lula. De acordo com o levantamento, 38% afirmam que a economia no Brasil pirou nos últimos doze meses; 34% dizem que ficou do mesmo jeito e apenas 26% achavam que melhorou.
"É a primeira vez que cai a avaliação positiva da economia entre eleitores do Lula. Saiu de 55% para 46% os lulistas que achavam que a economia melhorou, enquanto passou de 11% para 15% os lulistas que achavam que a economia piorou", avaliou o diretor do instituto Quaest e especialista em pesquisa de opinião, Felipe Nunes, em sua conta no X (antigo Twitter).
Nas últimas semanas, o governo comemorou o resultado obtido pelo Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, que alcançou o patamar de US$ 2,17 trilhões. Com o resultado, o Brasil voltou ao ranking das 10 maiores economias do mundo. Apesar do resultado, a impressão do consumidor é diferente.
Ainda que o resultado do PIB tenha sido positivo, a inflação pesou no bolso do consumidor puxado principalmente pelo aumento no valor dos produtos alimentícios. De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação do mês de janeiro ficou em 0,42%. Em 2023, a inflação ficou em torno de 4,7%.
Em janeiro, o aumento no grupo alimentação e bebidas, que tem maior peso na cesta de consumo das famílias (21,12%), subiu 1,38%. Isso significa um peso de 0,29 ponto percentual no IPCA do mês. Além disso, a alta indicada pelo índice nessa categoria foi a maior já registrada para o mês de janeiro desde 2016, quando o grupo alcançou elevação de 2,28%.
Esses foram os números apresentados pelo governo para tentar convencer a população de que a economia não está mal. Mas a pesquisa mostrou que essa não é a percepção do povo. Segundo o levantamento, 63% das pessoas acham que as contas subiram, 73% percebem que os preços dos alimentos aumentaram e 51% não têm duvidas de que os combustíveis estão mais caros. O percentual de pessoas que acham que os preços estão caindo e a inflação está sob controle está caindo desde junho de 2023.
Afastamento dos jovens e do eleitorado feminino
A pesquisa também mostrou reprovação do governo entre os jovens. De acordo com o levantamento, houve queda da aprovação na faixa etária dos 16 a 34 anos. Em fevereiro de 2023, 57% dos jovens dessa faixa etária aprovavam o trabalho de Lula. Em fevereiro deste ano, a porcentagem caiu para 46%.
Especialistas explicam que o fato de Lula não conseguir um bom engajamento nas redes sociais, como seu antecessor, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), atrapalha seu desempenho com os jovens. "Hoje, Lula se sustenta principalmente no público que acompanha as notícias pela televisão, que é o público mais idoso, como a gente viu. Só que a maioria do eleitorado tende a acompanhar mais as informações pelas redes sociais e, nesse ambiente, Lula perde feio, pois prevalece as percepções negativas sobe ele", analisa.
O perfil feminino também demonstrou maior descrença com o último ano do governo Lula. Entre elas, apenas 51% das entrevistadas afirmaram aprovar o trabalho desempenhado pelo petista. De acordo com os últimos índices da Quaest, a avaliação positiva das mulheres está em queda desde agosto, quando 60% aprovavam o governo.
Apesar de terem sido alvo da campanha eleitoral de Lula, as mulheres não têm sido favorecidas na composição do governo do petista. Após a formação de seus ministérios, a falta de representatividade foi uma das grandes reclamações do eleitorado formado por elas.
Com 37 pastas, apenas 11 eram chefiadas por mulheres no início deste terceiro mandato. O número já não representava a paridade entre gêneros que o petista pregou ao longo de sua campanha. Após oito meses de governo, duas perderam o cargo e foram substituídas pelo sexo oposto.
A recente indicação de Lula para Flávio Dino ocupar a vaga de Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal (STF) também pode ter gerado insatisfação. Com 11 ministros na Corte, apenas duas eram mulheres e, com a aposentadoria de Weber, a expectativa era de que Lula indicasse outra para substituí-la para manter o mínimo de representatividade na Suprema Corte, mas isso não aconteceu.
Enquanto elas perdem espaço no governo de Lula, ele também vai decaindo diante a aprovação feminina. "O Lula falou muito que o Bolsonaro não dava atenção para as minorias e no governo dele isso acabou não funcionando. O que acabou prevalecendo foi essa "anti-comunicação", em que os discursos não conversavam com as ações", avalia Cioccari.
Como Lula deve lidar com os índices?
A pesquisa mostrou que o presidente só possui uma prevalência de aprovação entre o perfil de cidadãos que votaram nele em 2022, majoritariamente representados por moradores da região Nordeste e que recebem até dois salários mínimos.
Para a doutora em Ciências Políticas Deysi Cioccari, ainda que possa existir mudanças em algumas estratégias, os discursos de Lula ainda não devem perder o foco em seu tradicional eleitorado. "O presidente me parece mais irredutível nesse mandato. Talvez haja uma readequação na comunicação geral, mas nos discursos eu não acredito", pontua a especialista.
Em um exemplo da análise feita pela especialista, horas após a divulgação da pesquisa, Lula recebeu o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, em Brasília para uma série de reuniões. Em coletiva de imprensa após agenda ao lado do espanhol, Lula voltou a fazer acenos à ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela.
Pesquisa aponta para queda contínua na popularidade do presidente desde agosto
O levantamento mostrou que 51% dos entrevistados aprovam o governo do petista e 46% desaprovam. O resultado, contudo, indica queda na popularidade do presidente em relação à pesquisa da mesma consultoria realizada em dezembro de 2023. No levantamento feito em agosto de 2023 meses, 60% dos entrevistados disseram que aprovavam o trabalho executado por Lula e 35% reprovavam.
"A pesquisa mostram, desde agosto, um crescimento contínuo na piora da avaliação e simultaneamente uma queda na avaliação positiva", diz Cerqueira.
"O que ainda está sustentando o percentual de avaliação positiva do trabalho de Lula e seu governo são dois grupos bem segmentados: aqueles idosos de 60 anos ou mais em que prevalece uma avaliação mais positiva; e aqueles que têm uma renda mais baixa e com um nível de instrução mais baixo, até o ensino fundamental. Nos demais segmentos, prevalece a avaliação negativa", pontua o professor do Ibmec.
Metodologia da pesquisa
O levantamento foi realizado pelos institutos Genial e Quaest e ouviu, em formato presencial, duas mil pessoas, entre os dias 25 a 27 de fevereiro de 2024. As entrevistas foram feitas em 120 cidades de todas as regiões do país. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais e o nível de confiabilidade é de 95%.
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