Além da resistência por parte dos governadores, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública apresentada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já enfrenta reações no Congresso Nacional. Apesar da articulação por parte do Palácio do Planalto, a expectativa é de que o texto seja esvaziado durante a tramitação na Câmara e no Senado.
Nesta semana, por exemplo, parlamentares da oposição, junto ao governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), anunciaram a discussão sobre um pacote de projetos de lei, como uma minirreforma da segurança pública, para ganhar celeridade no Congresso Nacional. A medida vai justamente na contramão da PEC discutida pelo Palácio do Planalto.
Costurado pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, o texto do Executivo prevê ampliar o poder do governo federal na segurança pública. Pela Constituição, é competência dos governos estaduais a gestão dessa área.
A PEC ainda não foi protocolada, mas, de acordo com uma minuta de apresentação feita aos governadores, estão previstas alterações em cinco artigos da Constituição. Entre esses pontos, o governo federal passaria a ter competência para estabelecer diretrizes gerais quanto à política de segurança pública, que incluiria o sistema penitenciário.
A minuta também destaca que hoje o país tem 27 certidões de antecedentes criminais distintas, 27 possibilidades de boletins de ocorrências e 27 formatos de mandados de prisão. Pela avaliação do Ministério da Justiça, a padronização de dados e informações é fundamental para que se dê efetividade ao Sistema Único de Segurança Pública.
Por se tratar de PEC, a proposta precisa ser aprovada por quórum qualificado em dois turnos de votações no Senado e na Câmara. Ou seja, no mínimo 49 votos dos senadores e 308 dos deputados.
Na contramão do Planalto, integrantes da bancada da segurança pública articulam um projeto de lei para esvaziar a PEC do Executivo. Costurado pelos deputados Alberto Fraga (PL-DF) e Alfredo Gaspar (União-AL), o texto retira a centralização da tomada de decisões das mãos do governo federal.
Bancada da Segurança rejeita ampliação dos poderes da PF e da PRF e quer associação interfederativa
A PEC do governo federal aumenta as competências de investigação da Polícia Federal contra milícias, organizações criminosas e áreas de preservação ambiental. Além disso, cria a Polícia Ostensiva Federal a partir da estrutura da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que hoje só atua em rodovias; e constitucionaliza o Sistema Único de Segurança (SUSP), conferindo a um conselho nacional a elaboração de um plano com "diretrizes com observância obrigatória" aos entes federados.
Segundo o deputado Alberto Fraga, a medida cria uma "verdadeira guarda nacional" e permite à PF "se impor sobre as polícias civis em algumas matérias".
"Em resumo, propõe-se aumento de poderes à União, tomando para si a elaboração de uma política nacional e a coordenação de todo o sistema, mas remetendo os custos para os estados e ao DF, pois o fundo a ser criado atenderá somente aquilo que o Poder Executivo estabelecer", disse o deputado.
Para esvaziar a PEC do governo federal, o texto da bancada da Segurança cria um modelo de colaboração entre os estados por meio da criação de uma associação interfederativa. Esse colegiado seria composto pela União, estados e Distrito Federal.
Essa associação teria como objetivo coordenar esforços, compartilhar inteligência e recursos e promover ações integradas que visem à "prevenção, à repressão, ao enfrentamento ostensivo e à realização de todas as fases da persecução penal em relação às redes criminosas transnacionais".
No projeto, o governo federal teria 49% de voto nas decisões, enquanto os estados e o DF, 51%. O cálculo do voto de cada unidade federativa seria proporcional aos gastos com segurança pública.
Segundo o deputado Alfredo Gaspar, esse projeto já vinha sendo costurado há pelo menos quatro meses e conta com sinalizações positivas por parte do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). “Queremos oferecer respaldo legal aos nossos agentes e fortalecer a capacidade de resposta do Brasil frente às organizações criminosas que atuam dentro e fora do país,” explicou Gaspar.
O projeto dos parlamentares propõe ainda incluir o Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin) no enfrentamento aos crimes de organizações criminosas transnacionais. Atualmente, esse órgão está sob o guarda-chuva da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O texto passa neste momento por análise da consultoria legislativa da Câmara e a expectativa dos autores é de que a tramitação seja iniciada antes da PEC proposta pelo governo federal.
Por outro lado, o presidente Lula admitiu que pretende manter as negociações junto aos governadores para tentar aprovar a PEC do Executivo. "Não queremos tomar a atribuição dos governadores ou da Polícia Militar", afirmou Lula em entrevista à Rede TV!, exibida no último domingo (10).
Oposição quer dar mais autonomia para os estados
Além da tentativa de esvaziar a PEC do governo federal, parlamentares da oposição discutem outros projetos para dar mais autonomia aos estados na segurança pública. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara discute, por exemplo, um projeto de lei que autoriza governos estaduais a alterar a legislação do Código Penal e do Código de Processo Penal.
A proposta chegou a entrar na pauta desta terça-feira (12), mas precisou ser adiada depois que a Ordem do Dia teve início no plenário da Câmara. Se aprovado, o projeto permitirá que os estados atuem na tipificação de crimes (exceto hediondos, eleitorais e militares), aumentando penas, criando novos crimes e endurecendo punições e prisões.
“Os representantes do povo, deparando-se com a realidade, podem decidir reprimir os tipos penais levando em consideração o nível de reprovação da sociedade local perante cada espécime de crime”, diz o autor do texto, o deputado Lucas Redecker (PSDB-RS).
Na mesma linha, o deputado Coronel Assis (União-MT) defende que é preciso dar autonomia para os estados decidirem suas penas de acordo com realidade de cada região.
"Nós precisamos entregar essa atribuição, dentro do limite, aos estados, para que eles também possam dar o seu quinhão de contribuição. É inadmissível pensar que um estado que paga a conta de um sistema penitenciário pesado, extremamente corrupto, não possa endurecer as ações dentro do seu estado, de acordo com sua regionalidade", argumenta.
Paralelamente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) anunciou que a minirreforma discutida por ele com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), nesta semana, visa “compilar todas as propostas em tramitação em um único projeto que será apresentado pela Comissão de Segurança Pública do Senado”. Ele reforçou que as propostas se diferem bastante da PEC do governo Lula e terão muito mais celeridade na votação, por não exigir quórum ou mais de uma sessão para aprovação.
“É óbvio que com essa proposta a gente não pretende resolver todos os problemas da segurança pública no Brasil, mas o Rio de Janeiro em especial é um estado que está sofrendo mais que os demais entes da federação”, explicou o parlamentar.
O governador Cláudio Castro enfatizou a importância da parceria com o Legislativo para avançar em projetos na segurança pública. “Nós temos que transformar essa situação trágica que aconteceu no Rio de Janeiro em mudanças efetivas. Há um claro desacordo da legislação atual com o momento que é vivido, ou seja, há um incentivo hoje à criminalidade”, disse.
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