O senador Ney Suassuna (Republicanos-PB), que assumiu o mandato nesta terça-feira (29) e presidiu a sessão do Senado do mesmo dia, fez um anúncio bastante esperado em Brasília e no meio empresarial: o Congresso Nacional vai se reunir nesta quarta-feira (30) para analisar vetos do presidente Jair Bolsonaro. A confirmação teve relevância porque, ao longo da terça-feira, a realização da sessão foi colocada em dúvida. Senadores, deputados e integrantes do governo se revezaram em articulações para fazer com que a reunião fosse mantida ou cancelada. Tudo porque um dos itens da pauta é o veto à decisão do Congresso de prorrogar, até o fim de 2021, a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia.
A análise do veto é esperada há meses, o que motivou o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), a cancelar as sessões em mais de uma ocasião por falta de acordo sobre o assunto — como também é o presidente do Congresso, é dele a responsabilidade pela convocação da pauta. Mas, na terça, Alcolumbre disse, ainda no período da manhã, que tinha a intenção de evitar novos adiamentos e promover a votação.
"O meu desejo é que a gente faça a sessão do Congresso amanhã [quarta-feira, 30]. De fato há um sentimento da maioria do Parlamento, tanto da Câmara como do Senado, de derrubar o veto, mas isso a gente vai aferir na hora da votação, mas há esse sentimento da maioria dos parlamentares. Falo mais em nome do Senado porque converso com os senadores e todos estão com esse desejo por conta dos empregos e da possibilidade de ampliar a desoneração da folha", declarou Alcolumbre à Agência Senado.
A sessão da quarta deve começar com a votação por parte dos deputados, às 10 horas; os senadores passam a votar a partir das 16 horas e os deputados prosseguem a votação às 19 horas. Para que um veto seja derrubado, é preciso que a maioria tanto de senadores quanto de deputados vote pela rejeição. Se apenas uma das casas votar pela continuidade do veto, a decisão presidencial fica mantida.
Por que discussão sobre desoneração é importante?
O veto em questão foi emitido por Bolsonaro em 7 de julho, sobre a Lei 14.020, que autorizou empresas a renegociarem contratos para redução de jornadas de trabalho e salários, no contexto da pandemia de coronavírus. A lei foi o resultado da análise, pelo Congresso, de uma medida provisória (MP) apresentada por Bolsonaro. A prorrogação da desoneração da folha de pagamento não constava na proposta inicial do presidente da República.
A decisão de Bolsonaro de vetar a continuidade da desoneração contrariou não apenas o Congresso, mas também os 17 setores que estavam sendo contemplados pela medida. Isso porque a desoneração representa, segundo eles, um alívio na carga tributária que pode representar um aumento na geração de empregos. Empresas e sindicatos falam em até 6 milhões de vagas que estariam condicionadas à derrubada do veto.
Quem é a favor, quem é contra a derrubada do veto?
A derrubada do veto é defendida pelo setor produtivo, por sindicalistas e, a princípio, pela maior parte do Congresso Nacional. Os empresários destacam as consequências positivas da menor carga tributária, e também alegam que o estágio de incerteza sobre as regras, vigente até a votação do veto, é ainda pior do que a reoneração.
Já os parlamentares que se manifestaram em defesa da derrubada apontam que o momento delicado da economia nacional, que ainda não se recuperou dos baques de anos anteriores e enfrenta as consequências da pandemia de coronavírus, exige medidas mais arrojadas, para garantir a criação de empregos. Há ainda o cálculo político envolvido: em um ano eleitoral como 2020, votar pela derrubada de impostos é algo sempre desejado pelos parlamentares.
A continuidade do veto, por outro lado, teve sua defesa feita apenas pela equipe econômica do governo Bolsonaro e por parlamentares mais fiéis ao presidente da República. A alegação dos favoráveis ao veto era de que a tributação representa um ganho financeiro do qual os cofres públicos não podem abrir mão no momento atual. Cálculos do Ministério da Economia falam em um impacto de R$ 5 bilhões.
Líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR) chegou a dizer que o Palácio do Planalto poderia ir ao Supremo Tribunal Federal (STF) para reverter a derrubada do veto. “É uma posição da AGU [Advocacia-Geral da União], que tem uma inconstitucionalidade. É impositivo isso. É uma recomendação da área jurídica do governo”, afirmou, em 10 de setembro. A alegação era de que a desoneração da lei privilegia setores específicos da economia.
Por que as sessões anteriores do Congresso foram adiadas?
O adiamento mais recente da sessão que analisaria o veto foi confirmado por Alcolumbre no último dia 15. Na ocasião, o presidente do Congresso frustrou a expectativa de uma sessão no dia seguinte, sob a alegação de que o Senado precisava priorizar a votação de indicados para embaixadas e outras autoridades.
O fato é que os sucessivos adiamentos traduziram a falta de acordo em torno do tema. Ou, em outras palavras: os adiamentos representaram a tentativa do governo de vencer uma batalha praticamente perdida. Desde quando o Congresso votou a lei até os dias atuais, as manifestações majoritárias dos parlamentares foram em favor da defesa da desoneração.
Ao longo desse período, um elemento entrou no circuito para tentar ajudar o governo a se fortalecer: a busca de Alcolumbre por um novo mandato no comando do Senado. As regras atuais impedem que o atual presidente concorra à reeleição na disputa agendada para fevereiro. O parlamentar tenta modificar as normas e espera contar com o apoio do Palácio do Planalto na empreitada.
Senadores adversários de Alcolumbre colocaram que suas manifestações em agrado ao governo representariam a busca por essa "moeda de troca". A tentativa de adiamento perdurou até a tarde da terça-feira (29).
Desoneração tem relação com outros projetos do governo?
A análise do veto à desoneração se conecta com outros pontos do debate econômico, em especial a reforma tributária.
O governo buscou ampliar a desoneração a outros setores da economia e fazer com que o "prejuízo" decorrente da medida seja compensado pela aplicação do imposto sobre transações digitais, que é defendido pelo ministro Paulo Guedes e chamado — contra a vontade do governo — de "nova CPMF".
A ideia, porém, não encontrou muito apoio no Congresso, o que impediu a apresentação de uma nova etapa da reforma tributária na segunda-feira (28).
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